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São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2003

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FUTEBOL

Futebol se joga com a bola

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

O repórter Sérgio Rangel, da Folha, publicou uma reportagem sobre um trabalho feito pela dupla Parreira-Zagallo, que será distribuído aos jogadores da seleção. Os dois elaboraram conceitos sobre futebol atual e fizeram recomendações aos atletas.
O "estudo" diz que os adversários (citou Camarões) aperfeiçoaram uma nova forma de jogar e de marcar, defendendo a partir da intermediaria com dez jogadores e usando os contra-ataques.
Nada disso é novo. Tucanaram a retranca, como diria o José Simão. O Boca Juniors contra o Santos, os EUA, Camarões e muitas outras equipes atuam dessa forma, desde os anos 60.
O relatório conceitua: "o futebol brasileiro e a seleção tornam-se praticamente imbatíveis quando conseguem igualar as seguintes variantes: disciplina tática, ocupar espaços, jogar com entusiasmo, impor-se tecnicamente e, sobretudo, sentir prazer e alegria naquilo que se faz".
Tudo fundamental e básico, mas só funcionará se a equipe tiver alguns craques, como os quatro "erres" da Copa de 2002. Não confundir craque com bom e excelente jogador. Esses estão presentes em todas as outras principais seleções. A diferença é o número de craques. As outras seleções têm no máximo dois.
As principais recomendações do Parreira, quando a equipe estiver com a bola, são: aprender a jogar em espaços congestionados e a fugir da marcação individual, mudar o jogo de um lado para outro, alternar o ritmo, estimular o toque de primeira, tabelas e jogadas individuais e ter um atleta vindo de trás como elemento surpresa.
Os novos técnicos precisam anotar tudo e estudar cada um desses itens. Tudo fundamental e básico. O bom profissional, em qualquer área, não é o que sabe algumas coisas incomuns e sim o que sabe bem as coisas comuns.
As recomendações do manual são importantes, mas também óbvias. Profissionais com formação acadêmica adoram teorizar sobre o óbvio. Imagino que tudo isso já faz parte do discurso da maioria dos tradicionais "professores" (treinadores).
Vivemos também a época da ciência e da cultura do óbvio e das banalidades. Há especialistas e curso para tudo. Ensinam a ganhar dinheiro, a programar as atividades diárias, o lazer e os gastos, a ser simpático, famoso (pelo menos por 15 minutos), sorrir diante do caos, a ser "feliz" e muitas outras besteiras.
As principais recomendações do manual, quando a equipe estiver sem a bola, são: apertar na saída de bola, diminuir os espaços, evitar os contra-ataques tendo sempre um na sobra, recuperação rápida do setor defensivo, cuidado com as bolas paradas.
A marcação na saída de bola e a presença de um defensor na cobertura não são habituais nas equipes dirigidas pelo Parreira. Os seus times preferem recuar e fechar os espaços defensivos a pressionar. Como são dois zagueiros e os dois volantes e laterais se adiantam para iniciar as jogadas ofensivas, não dá tempo num contra-ataque rápido para eles recuarem, marcarem um atacante e sobrar um zagueiro.
Na Copa-94 não houve esse problema porque Mauro Silva foi quase um terceiro zagueiro, os rivais ficavam muito atrás (a moda era o defensivismo) e no calor de meio-dia não conseguiam defender e contra-atacar. Nada disso desmerece a conquista, as virtudes e a eficiência tática do time brasileiro dirigido pelo Parreira.
Marcar a saída de bola é também a melhor maneira de ultrapassar uma retranca. O Brasil não fez isso na Copa das Confederações contra Camarões e EUA.
O relatório concluí: "o maior desafio do futebol brasileiro é aprender a jogar sem a bola". Certamente Parreira quis dizer que os jogadores têm de saber desarmar e não dar espaços para o adversário.
A questão é como fazer isso: pressionando na saída de bola, recuando para fechar os espaços na defesa ou iniciando a marcação no meio-campo? As três formas são eficientes e podem ser usadas na mesma partida, dependendo do momento.
Na Copa de 70, me rotularam de jogar sem bola. Detesto isso. Participei individualmente de menos lances em relação ao que fazia no Cruzeiro porque atuei fora da posição, de centroavante, de pivô entre os zagueiros. No Cruzeiro era um meia que vinha de trás. Não estava também em forma, já que antes do Mundial fiquei oito meses sem atuar.
Futebol se joga com a bola. Isso também é óbvio.

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