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O ano em que o time derrubou a Fiel
Orgulhosa de seu papel, torcida se esforça até o fim, mas não supera as limitações e os "reforços" do clube do coração
No Tatuapé, bar recebe Zé Maria, Marlene Matheus e mais 400 fãs; na quadra da Gaviões, cem torcedores sofrem diante de velha TV
MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Décimo segundo e mais importante jogador da história corintiana, a torcida ontem parecia reavaliar seu papel. O ano de
2007 será lembrado como
aquele em que um time do Parque São Jorge derrotou a Fiel.
Quando o árbitro Alício Pena
Júnior encerrou a agonia, veio
à tona um sentimento de impotência de uma massa de anônimos que sempre se orgulhou de
jogar junto com a equipe e superar os piores desafios.
Um sentimento vivido no Tatuapé, no Bom Retiro, na Vila
Madalena, nos Jardins, onde
quer que houvesse uma concentração. Na quadra da Gaviões, epicentro da paixão corintiana no bairro do Bom Retiro, a dor era palpável. Um torcedor se deitou no chão. Outros
choravam, escorados em paredes, agachados na porta. Casais
se abraçavam, consolando-se.
No QG da principal organizada, que migrou em massa para
Porto Alegre, não havia ninguém meia hora antes da partida. Aos poucos, porém, cem
torcedores chegaram para assistir ao jogo -ou melhor, a
uma noção dele- numa TV de
20 polegadas, vinda do barracão. Cheia de fantasmas. Sem
som. De fato, corintiana.
Segundo o metalúrgico e gavião Carlos Henrique, da Ponte
Rasa, a TV só foi conseguida aos
20min do primeiro tempo, e as
caixas de som não davam vazão.
A solução foi abrir o porta-malas de um carro com rádio AM.
Cenário bastante diferente
do bar Museu Preto e Branco,
tradicional reduto corintiano
no bairro do Tatuapé. Telão e
TVs transmitiam o jogo diante
de mais de 400 mosqueteiros
de todas as castas.
Lá, ex-jogadores, como Zé
Maria e Adãozinho, e ex-cartolas, como Marlene Matheus,
mesclavam-se à agonia de anônimos kalungas, suvinis, pepsis
e samsungues no calor infernal.
Tirar a camiseta no recinto era
proibido, tanto por respeito ao
bar quanto pelo time.
O telão sincronizava os que
foram e os que ficaram. Cada
vez que câmeras focalizavam
torcedores cantando, o bar se
juntava à arquibancada corintiana do estádio Olímpico num
uníssono que cobria 1.109 km
entre as capitais de São Paulo e
do Rio Grande do Sul.
A Fiel havia agüentado bem o
baque no gol precoce de Jonas.
Mesmo com muitos de seus
membros em lágrimas, o Tatuapé cantava, o Corinthians
melhorava, e assim Clodoaldo
empatou a partida.
Intervalo.
Marlene Matheus sorria,
confiante. Jamanta, o primeiro
a envergar a camiseta do movimento "Fora Dualib", mostrava
outra roupa, com os dizeres:
"Brasileiro sem Corinthians é
como Copa sem Brasil".
A reportagem vai atrás de outros sinais da via-crúcis. Nas
calçadas, poucas pessoas. Trânsito bom na Radial Leste. São
Paulo parecia estar em casa, estacionada diante das TVs.
Até mesmo no seqüestro do
casal no Jardim São Carlos, zona leste de São Paulo, que durou quase 18 horas, alguns policiais militares perguntavam sobre a partida de Porto Alegre.
Pelo rádio, ouve-se que há
um pênalti cobrado três vezes
no Serra Dourada. O Corinthians voltava à zona de rebaixamento e, num Siena ao lado
do carro da Folha, um pai de
família comemorava, ao lado
da mulher e de duas crianças.
O trânsito torcia contra o
Corinthians. Poucos metros
antes do Preto e Branco, no começo do primeiro tempo, uma
moça no semáforo entregava
um panfleto imobiliário perguntando quase ao mesmo
tempo se o Grêmio tinha feito 1
a 0. Diante do sim, satisfez-se.
A reportagem volta à quadra
do Bom Retiro. O 2 a 1 do Goiás
estava estabelecido, e o Corinthians já não ia mais à frente
com a freqüência de antes. Escanteios, cada vez mais escassos, eram aplaudidos.
A rádio AM avisava: fim de
jogo em Goiânia. Alguns abandonavam as cadeiras. O Timão
não encontrava o caminho do
gol, por mais que se gritasse.
Não bastou ser fiel a cada jogo, o ano inteiro. Hiper-reforçado por investidores russos,
cartolas investigados, três técnicos e muitos jogadores limitados, o Corinthians conseguiu
o incrível: derrotou a Fiel.
Colaborou KLEBER TOMAZ, da Reportagem Local
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