São Paulo, domingo, 04 de maio de 2008

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Plano inovador leva Brasil ao topo em 58

Quase um ano antes da Copa, Paulo Machado de Carvalho e amigos como Paulo Planet Buarque planejaram o título

Convocação dos melhores profissionais, sem bairrismo e com novas metodologias, alavancam épica conquista da seleção em campo sueco


RODRIGO BUENO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Contando com a cooperação de um grupo de amigos dedicados, que comigo se prontificaram a colaborar na confecção daquele que seria o plano de trabalho para a seleção brasileira, apresento à vossa senhoria o regulamento e o plano para o Mundial de 1958."
O texto acima, editado, integra carta de Paulo Machado de Carvalho a João Havelange em novembro de 1957. Cópia do texto foi fornecida à Folha por um desses amigos dedicados, Paulo Planet Buarque, 80, jornalista que cobriu a primeira conquista mundial da seleção, que está perto dos 50 anos e que ganha a partir de hoje uma série de especiais na Folha.
""O Havelange acabara de se eleger presidente da CBD, hoje CBF. Veio a São Paulo convidar o Paulo Machado de Carvalho para assumir as responsabilidades com a seleção que iria à Suécia. O Paulo me chamou, perguntou o que eu achava. Disse a ele que era uma honra, pois, pela primeira vez, alguém de São Paulo era lembrado para tal atividade", conta Planet.
Historicamente ligado ao São Paulo, como Paulo Machado e o técnico Feola, Planet lembra que a CBF, até a Copa de 58, era composta por dirigentes do Rio na ""sua imensa maioria, senão totalidade".
""As seleções brasileiras até então sempre haviam sido comandadas por grandes próceres. No caso de 1954 [Copa da Suíça], era o João Lyra Filho, presidente do Conselho Nacional de Desportos. Ele nunca esteve na concentração, sempre esteve em solenidades, recepções. Não havia parte diretiva antes na seleção", diz Planet.
Os erros nas Copas de 1950 e 54 foram o ponto de partida para o plano elaborado quase um ano antes do primeiro título.
""Nós vínhamos de dois fracassos rotundos. Estava presente no Maracanã em 1950, uma decepção de 200 mil pessoas, pelo menos metade chorando. Na véspera do jogo, já tiraram fotos dos jogadores com faixas de campeão do mundo. Em 1954, pior, nossos jogadores nem sequer sabiam que, contra os iugoslavos, um empate classificava os dois países."
Planet lembra que, além dessas observações sobre os Mundiais perdidos, inovações foram implementadas de forma pioneira na seleção para 1958.
""Pela primeira vez na seleção, fez-se uma verificação dentária. Nunca antes houvera tal preocupação. Foi quando surge a figura do Mário Trigo, que era dentista e foi solicitado. Ele conseguia arrancar dentes apodrecidos dos jogadores dando risada, contando piada. Foi convidado a acompanhar a seleção na Suécia e se tornou uma figura folclórica", diz.
A parte física ganhou uma atenção especial no projeto, mas o fator psicológico pesou.
""Foi considerado que jogador para a seleção tinha que ser especial, dedicar-se por inteiro à atividade. Na relação de jogadores, cuidou-se muito da personalidade de cada um. E precisávamos de uma preparação física fora do comum. Era necessário preparador que não se deixasse enganar pelos jogadores que preferem bate-bola, brincadeira de botar na roda."
Planet destaca aí a figura de Paulo Amaral, preparador físico que morreu na quinta-feira.
""Paulo Amaral era preparador do Botafogo, mas também sargento da Polícia Militar. Era capaz de enquadrar os jogadores. E enquadrou mesmo. Porque não tinha ninguém que dissesse: "Olha, estou com uma dorzinha aqui". Ele dizia: "Essa dorzinha vai sumir na preparação, entra em forma". E foi assim mesmo", conta Planet.
O jornalista, que passava por telefone os relatos da campanha da seleção na Suécia, destaca muito o caráter nacional da seleção, que sofrera tanto com bairrismo anteriormente.
""Quando se cogitou o Paulo Amaral, logo cogitou-se o Hilton Gosling, que era médico muito considerado, também do Botafogo, do futebol carioca. Ninguém pensou só em gente de São Paulo, ao contrário. A idéia era buscar os melhores, estivessem onde estivessem, como o Mário Américo [massagista], que fora da Portuguesa, mas estava no Rio."
As reuniões que definiram o plano e os detalhes para a Copa-58 aconteciam na antiga sede da federação paulista às terças. ""Esses detalhes colaboraram muito para nossa primeira conquista mundial", diz Planet.


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