São Paulo, terça-feira, 04 de julho de 2006

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Lisboa, desconfiada, evita euforia antes da semifinal

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LISBOA

Lisboa nem de longe está vestida de Copa do Mundo. Nem o torcedor português parece eufórico, mesmo tendo a seleção nacional entre as quatro melhores do mundo, pela primeira vez em 40 anos.
Faça a qualquer lisboeta a pergunta "Portugal vai ser campeão?", e a resposta padrão, em nove de cada dez vezes, é: "Vamos ver, vamos ver".
É evidente que não se trata de pesquisa científica, mas de conversas aleatórias na rua. Mas há um dado que parece indicar que o português não tinha lá muita confiança na passagem para a semifinal (ou meia-final, como se diz em Portugal): o público que viu pela TV Portugal x Holanda, nas oitavas, foi maior do que o que assistiu à passagem à semifinal, nos pênaltis, contra a Inglaterra (audiência média de 34,9% x 28,7%).
Dá para deduzir que Luiz Felipe Scolari, o técnico brasileiro de Portugal, era levado a sério quando dizia que a meta de sua seleção era ficar entre as oito melhores. Logo, o torcedor português tratou de ver essa classificação, contra a Holanda, talvez desconfiado de que a eliminação viria na fase seguinte, que menos gente quis ver.
"Se vocês, brasileiros, com a equipa [outra expressão lusa] que têm, caíram, era mais natural que Portugal também caísse", analisa Joaquim Valente dos Anjos, comerciante da Baixa, o centrão de uma Lisboa banhada de um sol intenso.
Talvez a desconfiança seja uma característica da alma portuguesa, que não parece ser de cantar euforia. "Eles são mais do fado do que do samba", brinca o brasileiro Tarcísio, que prefere não dar o sobrenome porque seus documentos de permanência definitiva em Portugal ainda não saíram.
Tarcísio é balconista de uma loja na avenida da Liberdade, a que conduz do Marquês de Pombal quase ao Rossio, a praça principal, na qual Dom Pedro 4º (1º para os brasileiros) vigia do alto o movimento.
É esse o percurso inevitável das festas esportivas ou políticas em Lisboa. Tem sido, aliás, nas cinco partidas já disputadas pelo time da terra.
"Mas a festa é só no dia do jogo", diz o taxista João Almeida Soares, para explicar por que não há, na avenida, sinais exteriores de Copa do Mundo em andamento, ao contrário do que ocorre na Alemanha e aconteceu no Brasil.
Bandeiras de Portugal em profusão, na avenida da Liberdade, só mesmo na sede do BES (Banco Espírito Santo), não por acaso patrocinador oficial da seleção e que, orgulhosamente, apresenta a bandeira vermelha-e-verde como "a mais bonita do mundo". No mais, como em outras partes da cidade, há bandeiras, sim, mas comparativamente poucas.
Nos carros, idem. A discrição é tamanha que os ônibus da Carris, a companhia de transporte público, levam duas bandeirolas na frente da capota, tão pequenas que, vistas de meia distância, mais parecem uma antena. Uma das bandeirinhas é da Carris, amarela, como os ônibus. Gente com a camisola (como eles dizem) da seleção, um ou outro.
É sintomático que o público que viu futebol pela TV foi bem maior na Euro-2004 do que está sendo no Mundial-2006. Fácil de explicar: a Euro foi em Portugal, e todo evento esportivo desse porte acaba sendo tão massificado internamente pela publicidade que se torna quase compulsório assisti-lo.
De todo modo, o parque Meyer, um beco da avenida da Liberdade que já foi centro de pequenos restaurantes típicos de boa comida e bons preços e de vários teatros de revista, já está preparado com o telão para o jogo com a França. É lá que começa a festa (se houver).
Uma coisa, pelo menos, Brasil e Portugal compartilham em matéria de Copa: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse à Folha que, se o Brasil chegasse à final, iria à Alemanha. Seu colega português, Cavaco Silva, irá, mesmo que seja para ver a disputa do terceiro lugar.


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