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Lisboa, desconfiada, evita euforia antes da semifinal
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LISBOA
Lisboa nem de longe está
vestida de Copa do Mundo.
Nem o torcedor português parece eufórico, mesmo tendo a
seleção nacional entre as quatro melhores do mundo, pela
primeira vez em 40 anos.
Faça a qualquer lisboeta a
pergunta "Portugal vai ser
campeão?", e a resposta padrão, em nove de cada dez vezes, é: "Vamos ver, vamos ver".
É evidente que não se trata
de pesquisa científica, mas de
conversas aleatórias na rua.
Mas há um dado que parece indicar que o português não tinha
lá muita confiança na passagem
para a semifinal (ou meia-final,
como se diz em Portugal): o público que viu pela TV Portugal x
Holanda, nas oitavas, foi maior
do que o que assistiu à passagem à semifinal, nos pênaltis,
contra a Inglaterra (audiência
média de 34,9% x 28,7%).
Dá para deduzir que Luiz Felipe Scolari, o técnico brasileiro
de Portugal, era levado a sério
quando dizia que a meta de sua
seleção era ficar entre as oito
melhores. Logo, o torcedor
português tratou de ver essa
classificação, contra a Holanda,
talvez desconfiado de que a eliminação viria na fase seguinte,
que menos gente quis ver.
"Se vocês, brasileiros, com a
equipa [outra expressão lusa]
que têm, caíram, era mais natural que Portugal também caísse", analisa Joaquim Valente
dos Anjos, comerciante da Baixa, o centrão de uma Lisboa banhada de um sol intenso.
Talvez a desconfiança seja
uma característica da alma portuguesa, que não parece ser de
cantar euforia. "Eles são mais
do fado do que do samba", brinca o brasileiro Tarcísio, que
prefere não dar o sobrenome
porque seus documentos de
permanência definitiva em
Portugal ainda não saíram.
Tarcísio é balconista de uma
loja na avenida da Liberdade, a
que conduz do Marquês de
Pombal quase ao Rossio, a praça principal, na qual Dom Pedro 4º (1º para os brasileiros)
vigia do alto o movimento.
É esse o percurso inevitável
das festas esportivas ou políticas em Lisboa. Tem sido, aliás,
nas cinco partidas já disputadas pelo time da terra.
"Mas a festa é só no dia do jogo", diz o taxista João Almeida
Soares, para explicar por que
não há, na avenida, sinais exteriores de Copa do Mundo em
andamento, ao contrário do
que ocorre na Alemanha e
aconteceu no Brasil.
Bandeiras de Portugal em
profusão, na avenida da Liberdade, só mesmo na sede do BES
(Banco Espírito Santo), não por
acaso patrocinador oficial da
seleção e que, orgulhosamente,
apresenta a bandeira vermelha-e-verde como "a mais bonita do mundo". No mais, como
em outras partes da cidade, há
bandeiras, sim, mas comparativamente poucas.
Nos carros, idem. A discrição
é tamanha que os ônibus da
Carris, a companhia de transporte público, levam duas bandeirolas na frente da capota,
tão pequenas que, vistas de
meia distância, mais parecem
uma antena. Uma das bandeirinhas é da Carris, amarela, como
os ônibus. Gente com a camisola (como eles dizem) da seleção,
um ou outro.
É sintomático que o público
que viu futebol pela TV foi bem
maior na Euro-2004 do que está sendo no Mundial-2006. Fácil de explicar: a Euro foi em
Portugal, e todo evento esportivo desse porte acaba sendo tão
massificado internamente pela
publicidade que se torna quase
compulsório assisti-lo.
De todo modo, o parque Meyer, um beco da avenida da Liberdade que já foi centro de pequenos restaurantes típicos de
boa comida e bons preços e de
vários teatros de revista, já está
preparado com o telão para o
jogo com a França. É lá que começa a festa (se houver).
Uma coisa, pelo menos, Brasil e Portugal compartilham em
matéria de Copa: o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva disse à
Folha que, se o Brasil chegasse
à final, iria à Alemanha. Seu colega português, Cavaco Silva,
irá, mesmo que seja para ver a
disputa do terceiro lugar.
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