São Paulo, terça-feira, 04 de setembro de 2007

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SONINHA

Falsa modéstia funciona?


Se um jogador não acredita de verdade que o adversário pode de fato surpreender, não seria o caso de admitir?


"A GENTE sabe que o Corinthians está em um momento difícil e, com certeza, eles vão se unir mais para se reabilitar em cima dos Santos." Qualquer um poderia ter dito isso -é comum considerar um time a perigo como um adversário perigoso. Na hora do aperto, espera-se, o grupo se une, os jogadores se entregam completamente e um milagre acontece. Sem contar que clássico "não tem favorito". "A equipe que errar menos sai com a vitória".
A rivalidade aguda tem o poder de nivelar os times ou desequilibrar a balança para o lado oposto ao que a lógica indica. Não foi assim na Copa América? O Brasil meio opaco não acabou com a reluzente Argentina? As declarações entre aspas foram dadas por jogadores do Santos, que não seriam loucos de contrariar a prudência e a diplomacia. Só os mais saidinhos se atreveriam a dizer que "pela lógica, o Santos é favorito, mesmo fora da Vila. O time está ajeitado, pegando embalo. O Corinthians, ao contrário, tenta se recuperar de mais um abalo. Se perder de pouco, é porque "clássico é clássico", e futebol não tem lógica mesmo...". O prognóstico, tão sensato quando os chavões do outro parágrafo (que têm sua razão!), não seria admitido. No dia seguinte à derrota do Santos, alguns atribuiriam a ele o resultado adverso ("Foi provocar o Timão, deu nisso. O Corinthians é muito grande!").
Mas será que os jogadores que pregaram cautela e respeito acreditaram nas próprias palavras? A avaliação geral depois do surpreendente 2 a 0 foi de que o Santos tropeçou na própria soberba: que esperava, sim, dar um passeio, e ficou completamente atarantado quando se viu em desvantagem. Não era pra ficar?
No sábado, amigos corintianos mantinham uma esperança meio fajuta, sem convicção "sabe como é, clássico é clássico"... Os santistas, um temor também meia-boca. Na verdade, todos imaginavam assim as manchetes na segunda: "Santos termina de afundar Corinthians". Os jogadores do favorito podem não querer contar com isso, mas é muito difícil. Assim como dor e sofrimento são mais inspiradores para determinadas iniciativas do que alegria e prazer, é mais fácil o "time ruim" se motivar do que o "time bom" realmente acreditar que precisa dar "tudo de si". A dificuldade é um propulsor melhor do que o conforto. Ou não...
Porque também é verdade que a comodidade da liderança traz confiança e coragem que resultam em eficiência, enquanto a tensão do rebaixamento produz erros e reveses que parecem atrair um ao outro. Parece tudo contraditório? E é. Somos todos complexos e confusos.
Não é à toa que pode ser valioso o auxílio dos psicólogos... Que não são "pronto-socorro", capazes de mudar uma equipe com uma palestra na concentração. Mas podem traçar um perfil dos atletas que auxilie treinador e o próprio grupo a se preparar para todas as situações -por exemplo, lidar com favoritismo. O senso comum dirá que é preciso "baixar a bola", mas deve haver casos em que funciona melhor entrar em campo pensando "é claro que somos melhores, e vamos provar".
Vai ver o que faltou ao Santos não foi modéstia, mas uma certa arrogância -na difícil medida exata.

soninha.folha@uol.com.br

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