São Paulo, quinta-feira, 05 de fevereiro de 2004

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FUTEBOL

Inatingível

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

Menos de 20 mil pessoas estiveram no Morumbi para ver o jogão Palmeiras x Santos. Tivesse acontecido no Campeonato Brasileiro, diriam que a culpa é dos pontos corridos...
As pessoas se afastam dos estádios por vários motivos: medo da violência (que é ainda maior que a violência real), desilusão com o futebol em geral ou com seu time em particular, falta de tempo, de conforto ou de dinheiro.
O último item está em evidência com os R$ 20,00 cobrados pelo ingresso mais barato no Paulista. O cidadão pode não ter medo da multidão, acompanhar os programas esportivos, botar a maior fé em seu time e encarar a chuva na "bancada" sem problemas, mas simplesmente não ter 20 mangos (mais a condução) para ver o jogo de perto. Pouco importa para ele que famílias, estudantes e maiores de 60 anos paguem menos -ele continua sem condições de bancar o seu ingresso.
Os clubes parecem não se importar. O pay-per-view vendeu bem no ano passado... Eles esquecem que o vínculo que se estabelece no estádio é muito mais forte; o torcedor de sofá assiste à televisão na sala enquanto o filho mais novo vê outro canal no quarto, ou joga videogame. Juntos na arquibancada, eles compartilham emoções boas e ruins, se identificam com a massa, gritam até perder a voz, abraçam quem nem conhecem. Na saída, se o resultado for bom, vão querer comprar uma faixa, um boné, uma bandeirinha. Ou uma camisa pirata, já que a oficial custa meio salário mínimo. Pela TV, comemoram com o controle remoto...
No Rio de Janeiro, quase 60 mil estiveram no Maracanã para o espetacular Fla x Flu. De acordo com o borderô divulgado pelo Flamengo, só as arquibancadas verdes e amarelas, vendidas a R$ 10,00, receberam juntas 31.976 pagantes. O estádio oferecia ainda gerais a R$ 3,00 (3.058 ingressos vendidos), cadeiras comuns a R$ 5,00 (12.627 vendidas) e, no outro extremo, cadeiras especiais a R$ 50,00. Tem para todo mundo. E o mítico Maraca, um pouco como a praia, ainda pode receber o torcedor de riso escancaradamente desdentado (ai, Brasil) e o bacana endinheirado. Eles podem não pisar na mesma areia, mas naquele horário tiveram o mesmo destino e viveram as mesmas emoções. Melhor que nada...
O espetáculo é outro com a presença de tanta gente -são 2.700 torcedores para cada jogador em campo, já pensou? É impossível saber, mas lícito especular, se o jogo teria sido o mesmo com as arquibancadas vazias.
A diferença gritante de público nos dois clássicos suscitou a discussão sobre o charme do futebol carioca versus a falta de graça do futebol paulista. Como comparar? Para o torcedor, o clássico do seu time é mais emocionante que qualquer outro. Mas o Flamengo tem mais torcedores no Brasil todo, e nesse ponto, a TV e o rádio fizeram a diferença. Mas o inatingível pela distância provoca uma paixão diferente daquela que é tornada inatingível por decisão dos cartolas. Por favor, barateiem os ingressos.

A parte que cabe
Os clubes pagam seguro do público, despesas com o quadro móvel, arbitragem, INSS, taxa da Suderj, confecção dos ingressos, manutenção das roletas e deixam 5% da renda bruta com a federação. Quando eu crescer, quero ser federação.

A parte que cabe?
Aliás, o Estatuto do Torcedor diz que "a remuneração do árbitro e de seus auxiliares será de responsabilidade da entidade de administração do desporto ou da liga organizadora do evento esportivo". A federação vai reembolsar os clubes?

Enigmas
Mancini deve estar se perguntando -o que falta fazer para ser convocado como reserva na seleção brasileira?

E-mail
soninha.folha@uol.com.br


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