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ENTREVISTA DA 2ª - ORLANDO SILVA JR.
Erros do Pan deixaram lições para os Jogos de 2016
Planejamento deficiente e rombo no orçamento, tônicas do evento de 2007, não irão se repetir, afirma ministro
JOSÉ EDUARDO MARTINS
DA REPORTAGEM LOCAL
O estouro de orçamento e os erros de planejamento dos Jogos Pan-Americanos de 2007 (veja quadro) não deverão se repetir na Olimpíada do Rio
de Janeiro, em 2016. É o que afirmou o ministro
do Esporte, Orlando Silva Jr., 38, em entrevista concedida ontem à Folha, após o desembarque em São Paulo. O ministro
acena com o investimento do governo federal para a construção de novas instalações olímpicas na capital fluminense,
mas continua a negar que vá auxiliar na construção de estádios para a Copa do Mundo, que acontecerá dois anos antes.
FOLHA - A forma como a candidatura da Rio-2016 foi apresentada foi
o segredo do sucesso?
ORLANDO SILVA JR. - Foi uma
apresentação perfeita. Tudo
que nós tínhamos projetado
aconteceu. Mas na minha opinião ganhamos no processo inteiro. A nossa presença em Pequim, durante a Olimpíada,
com o presidente Lula fazendo
uma agenda forte, também teve
um impacto muito forte. As garantias governamentais foram
muito sólidas. Além disso, você
percebia na conversa com os
eleitores como era bem recebido o argumento dos Jogos inéditos na América do Sul.
FOLHA - Qual foi a importância do
presidente Lula neste processo eleitoral da Rio-2016?
SILVA JR. - Definitivamente, o
presidente Lula foi a peça-chave. Durante o dia e meio que ficou em Copenhague, ele teve
contato direto com pelo menos
uns 30 eleitores. Isso eu não tenho a menor dúvida de que teve
um impacto decisivo na definição da vitória do Rio de Janeiro.
FOLHA - Quais são as principais diferenças entre as campanhas para
receber a Olimpíada de 2012 e a de
2016? Foi o apoio do governo?
SILVA JR. - Primeiro mudou o
Brasil. Se você olhar o Brasil de
quatro anos atrás e o país de hoje, vai notar uma mudança
substantiva. Uma mudança que
é perceptível não só por nós,
mas também pela comunidade
internacional. O projeto [da
Rio-2016] é muitas vezes superior do ponto de vista técnico
[em comparação ao de 2012].
FOLHA - O governo federal vai ajudar no financiamento das instalações olímpicas?
SILVA JR. - O projeto dos Jogos
Olímpicos prevê a participação
nossa na construção dos equipamentos esportivos, nas arenas, nos estádios.
FOLHA - Quanto deve ser gasto para a Olimpíada?
SILVA JR. - O orçamento total é
de R$ 28,8 bilhões.
FOLHA - O senhor teme que aconteça um estouro do orçamento, como no Pan-Americano?
SILVA JR. - O Pan-Americano
deixou algumas lições. E uma
lição central é a de que é necessário planejar detalhadamente
cada ação para a realização de
um grande evento. Esse orçamento nosso, inclusive, incorporou tudo que é necessário
para entregar a cidade pronta
para os Jogos Olímpicos. Há investimentos de infraestrutura
que já estão em curso. São
obras de melhorias de aeroportos, melhoria de portos, obras
de saneamento, obras ligadas
às questões ambientais. Ou seja, não temo que aconteça o
mesmo problema do Pan.
FOLHA - Por que existiram esses
problemas no Pan-Americano?
SILVA JR. - No Pan as dificuldades de orçamento se deram
porque uma série de itens não
era prevista. É o exemplo que
dou da segurança. A segurança
para o Pan, na proposta original, era patrimonial das instalações esportivas e não se imaginava como fazer um evento
sem ter um esquema especial
de segurança. Então, esse planejamento mais forte, mais
consistente, é que vai dar segurança à sociedade brasileira.
Imprensa e órgãos de controle
podem acompanhar muito
mais claramente as iniciativas
em relação aos Jogos.
FOLHA - O ministério pretende estreitar relações com as confederações das modalidades olímpicas?
SILVA JR. - Acredito que nós vamos ter que zerar o jogo na relação do governo com as entidades de esportes olímpicos.
Rever todos os conceitos. É evidente que o esporte brasileiro
não vai começar ou terminar
em 2016. Mas é uma plataforma única que nós temos para
fazer grande promoção do esporte nacional.
FOLHA - O que fazer de efetivo para difundir modalidades menos conhecidas no país?
SILVA JR. - Ontem [anteontem]
tive uma conversa com o presidente Lula e com o presidente
do Comitê Olímpico Brasileiro
(COB), Carlos Arthur Nuzman.
E lá nós definimos, e o Nuzman
ficou de acordo, que é preciso
fazer um esforço extraordinário pensando em 2016 e daí para frente. Só que eu não posso
detalhar agora, antes de fazer
uma construção coletiva. Mas é
um tema que foi pautado pelo
presidente da República, que
eu tenho insistido há algum
tempo. É preciso estabelecer
um sistema de metas.
FOLHA - Quais metas já foram estabelecidas?
SILVA JR. - Uma meta imediata e
que nós temos de acelerar ao
máximo é pôr para funcionar o
Centro Olímpico de Treinamento, que é um compromisso
da candidatura, que vai se basear a partir das instalações
existentes na Barra [da Tijuca,
na Zona Sul, do Rio de Janeiro].
FOLHA - Há verbas disponíveis para o esporte brasileiro?
SILVA JR. - No esporte brasileiro, houve um tempo em que o
problema gravíssimo era a
completa falta de recursos. Hoje, no alto rendimento, num nível de seleções nacionais, há recursos de um lado. De outro lado aprovamos a lei de incentivo
ao esporte, que abre também
uma oportunidade para a captação de recursos. Hoje, acredito que temos de valorizar muito
o tema gestão. É preciso trabalhar mais a gestão, ampliar o
profissionalismo. Até discutir
certos dogmas. Por que no Brasil é assim, um dirigente esportivo não é profissional? Não pode receber salário? Será que isso corresponde à realidade?
Melhor estabelecer um sistema
profissional de gestão. Até para
você cobrar cada vez mais pelos
resultados.
FOLHA - Existem reclamações de
algumas confederações do valor repassado pela Lei Piva. O senhor estuda um aumento desta verba?
SILVA JR. - Desde que o presidente Lula assumiu nós temos
ampliado sistematicamente os
recursos para o esporte. Hoje,
todas as empresas estatais patrocinam alguma modalidade.
FOLHA - Mas o senhor é favorável
ao aumento do repasse da verba
oriunda da Lei Piva?
SILVA JR. - Não seria favorável a
aumentar o percentual [de 2%
da verba oriunda das loterias],
além do que já está na mesa de
debate, que é um percentual
[0,5%] que seria repassado ao
Conselho de Clubes Formadores de Atletas Olímpicos (Confao). Mais prejudica a loteria e
pode ser um tiro no pé.
FOLHA - O senhor teme que sejam
criados "elefantes brancos" com os
Jogos Olímpicos?
SILVA JR. - É preciso ter inteligência na preparação dos Jogos
Olímpicos. Inclusive é necessário trabalhar o legado, paralelamente à ação da Olimpíada,
porque não dá para esperar
2016 para pensar o que será feito com as instalações. Em alguma medida, foi um outro erro
do Pan. Diria que é preciso ter
inteligência no trabalho destas
instalações levando-se em conta a utilização social.
FOLHA - O quanto é prejudicial ou
favorável a realização da Copa dois
anos antes da Olimpíada do Rio?
SILVA JR. - O COI entendeu a
nossa mensagem que a Copa do
Mundo é um certificado de garantia que o Brasil dá de que
muitos desafios do Rio de Janeiro serão superados. Porque
nós temos que ter o aeroporto
internacional Tom Jobim novinho em folha funcionando com
capacidade de operação adequada já em 2014.
FOLHA - O governo não vai financiar nenhum estádio para a Copa?
SILVA JR. - O orçamento do governo federal, do Tesouro, não
tem previsão de recursos para a
construção ou reforma de estádios para a Copa do Mundo.
Muitas cidades nos procuraram para falar das dificuldades,
da crise internacional e que
parceiros privados recuaram. E
o que ficou pautado por nós foi
estruturar algum modelo de financiamento. Estimulamos o
BNDES a estruturar esse modelo de financiamento.
FOLHA - Uma dívida do governo
estadual com o BNDES não pode se
transformar em uma dívida do governo federal?
SILVA JR. - Não, porque o governo do Estado tem as suas fontes
de receita, faz as suas opções de
investimento. É um gasto autônomo, um gasto definido por
um ente que tem autonomia.
FOLHA - Quais são as dificuldades
para receber a Olimpíada?
SILVA JR. - Tem o desafio imediato de um compromisso firmado com o COI que é constituir uma autoridade pública
olímpica. Criar uma instituição
que vai reunir os três níveis de
governo. Nunca existiu isso no
Brasil. Nós temos defendido a
criação na forma de um consórcio público, com a participação
do Estado e da cidade do Rio de
Janeiro e da União Federal, que
vai ter a atribuição de entregar
todas as obras, as instalações e
os serviços para o COI. Seguindo um pouco o modelo estabelecido em Londres.
FOLHA - O senhor não acha que foi
gerado um ufanismo exacerbado
com a escolha do Brasil para sede da
Olimpíada e da Copa?
SILVA JR. - Não, não acho. Penso
que o governo tem que agir
consciente dos desafios que
tem em suas mãos.
FOLHA - O senhor acha que o Brasil
pode ser visto no cenário internacional de outra maneira com a realização destes eventos?
SILVA JR. - A Copa e a Olimpíada
são duas grandes plataformas
de promoção. Então o novo
Brasil vai aparecer para o mundo, com a Copa e a Olimpíada.
O Lula já ocupa um espaço importantíssimo pela sua liderança e carisma. Mas essa agenda,
tenho certeza, vai elevar o patamar de projeção do país. Talvez
seja a plataforma de lançamento do Brasil para o século 21.
FOLHA - O senhor vai deixar o ministério para se candidatar nas próximas eleições?
SILVA JR. - O meu partido [PC
do B] pediu que eu me preparasse para ser candidato, só que
esse é um assunto que não está
definido ainda. Até avisei o presidente Lula, que pediu para a
gente conversar depois que ele
voltasse da Europa.
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