São Paulo, sexta-feira, 06 de fevereiro de 2009

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XICO SÁ

Humilhados e ofendidos


O jovem torcedor tricolor, de tanto triunfar, não suporta mais a decepção de uma bola nas costas do destino


AMIGO TORCEDOR , amigo secador, tem ser humano hoje em dia, como um são-paulino mais jovem, por exemplo, que é incapaz de mascar o jiló de uma derrota. Simplesmente não faz ideia do que seja conviver com o revés, com o desgosto, com o travo rotineiro da desgraça ludopédica, com o desábito da vitória, como disse João Cabral sobre o seu América, time a quem emprestou seu futebol como um clássico beque, arrojado com o jogo como seria depois com as palavras.
O tricolor, de tanto ver triunfar seu clube, não suporta mais a decepção de uma bola nas costas do destino. Mesmo no certame bandeirante, tão chutado para o mato por torcida e cartolagem, a ideia de perder é inaceitável. Ora, o gozo da vitória permanente vicia mesmo, contamina qualquer criatura, por mais humilde que seja, do pecado da soberba.
Meu amigo, você aí, fã de Santos, Palmeiras, Corinthians, sabe o que é passar quase seis meses sem voltar para casa mascando o jiló da derrota? Você do Rio, flamenguista, tricolor, botafoguense e vascaíno, tem a mínima ideia do que falamos? Claro, estou tratando do agora, não vale recorrer ao urubu do Henfil e lembrar o rubro-negro de Zico e elenco. Mas não puxei essa toada para falar das zangações do Muricy, que, humaníssimo que é, desacostumou- -se com a vida e perdeu, como a torcida, a capacidade de saber perder. O motivo é outro, grandioso, épico, bíblico até, diria este cronista alimentado nas tetas profanas do exagero. Amigo são-paulino na flor da idade, você que não sabe o que é voltar do Morumbi, na melancolia do lusco-fusco domingueiro, arrastando a cachorrinha magra dos ofendidos e humilhados, preste atenção no que digo, pois o que recomendo será útil daqui para a frente.
Falo da ótima ideia do blog Impedimento, brava publicação gaúcha, que começou a listar, com direito a belíssimas crônicas, as dez principais humilhações dos times brasileiros. Você aí, jovem tricolor, entra lá e vai saber que no passado não foi essa moleza toda torcer pelo São Paulo.
O Matias Pinto lembra lá, por exemplo, além de uma derrota antiga para a gloriosa Linense, um desgostoso Cobreloa 3 x 1 SPFC, idos de 1987, Estádio Municipal de Calama, resultado que empurrou o clube do Morumbi para a lanterna. No "top 10 das grandes humilhações", como é chamada a série, tem o Fernando Cesarotti, em texto grego para lá de tragicômico, contando que estava num motel quando o Palmeiras foi rebaixado em 2003. Sim, aquele embate com o Vitória. Pior é que o cara, mesmo com o Porco na Segundona, ainda conseguiu, prega ele, cumprir com as obrigações testosterônicas com a mulher.
Já o Roberto Azoubel, chamado de Doutor Estranho, solta a pena, escrita finíssima, e narra as dores do nosso Sport. Destaque para a peleja que ficou conhecida no Recife como "o jogo do cabaço": a derrota de 1 a 0 para o Santa Cruz, perdendo a chance de ser campeão invicto em 2007. Outro rubro-negro contemplado é o baiano, com Franciel Cruz, qual um Gregório de Mattos, fazendo a troça dos infortúnios do Vitória.
E assim segue a lista. Imagine as desgraças do Botafogo. Nem é bom pensar, meu caro alvinegro. E você, amigo, quais suas grandes decepções com o ludopédio?

xico.folha@uol.com.br


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