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Seleção natural
Dirigentes ligam sinal de alerta em Copa na qual 23 dos 32 países têm naturalizados no elenco
"Estrangeiro" em seleções aumenta e já preocupa Fifa
GUILHERME ROSEGUINI
ENVIADO ESPECIAL A MUNIQUE
Exatos quatro anos atrás,
"mamãe" nem sonhava ser a figura destoante da foto acima.
Com seus amigos adolescentes, ele acompanhou os jogos da
última Copa em um bar de Port
Vale, cidade inglesa onde nasceu. Hoje, todavia, tudo o que
quer é fazer um gol no jogo que
disputará contra a Inglaterra
no dia 15, em Nuremberg.
"Mamãe" é o apelido de Chris
Birchall, 22, o primeiro branco
a integrar o elenco nacional de
Trinidad e Tobago em 60 anos.
Tal façanha começou a ser
escrita apenas em 2005, após
um jogo pela terceira divisão do
Campeonato Inglês. Birchall
foi procurado por um jogador
tobaguiano do adversário. Ele
buscava confirmar se a mãe do
inglês havia realmente nascido
em Trinidad e Tobago.
A reposta afirmativa desencadeou rápida reação. Menos
de um mês depois, dirigentes
do país caribenho procuraram
Birchall oferecendo vaga na seleção em caso de naturalização.
Ele aceitou. Dali em diante,
ganhou a alcunha de "mamãe",
a vaga na Copa e a possibilidade
de enfrentar seu país natal.
"Fiquei um pouco inseguro
no início, não apenas porque
sou branco mas também porque sou inglês. Por sorte, tudo
saiu bem", festeja Birchall.
Longe de ser uma exceção,
sua biografia apenas mostra
que a miscigenação do futebol
ganhou novos contornos antes
da Copa do Mundo alemã.
A extensa lista de 64 jogadores que vão defender países diferentes dos quais nasceram
-em 2002, eram 43- revela
que o "boom" de naturalizados
entre os 736 atletas da Copa
não está mais relacionado ao
garimpo que as potências realizam em suas ex-colônias ou às
inerentes mudanças de nacionalidade oriundas de transformações da Europa Oriental.
Agora, o fenômeno é global.
Só 9 dos 32 elencos que vão ao
torneio não possuem forasteiros no grupo -entre eles está o
Brasil. Seleções de pouca tradição, como Togo, Gana, EUA,
Costa Rica e Irã, que costumavam só fornecer mão-de-obra
para outros países, agora contam com "importações".
O caso já chama a atenção da
Fifa. Ontem, em Munique, Joseph Blatter, presidente da entidade, disse que vai debater o
tema em um congresso que começa amanhã. "Estamos perdendo controle sobre as transferências internacionais e sobre a ação dos empresários, que
dominam os mercados. Aí eles
fazem o que bem entendem."
A legislação atual para o setor
não é restritiva e estabelece
três situações para tais transferências. O jogador consegue vaga na nova seleção se:
1) nasceu no território em
questão; 2) tem pai, mãe ou
avós biológicos nascidos no local e 3) residiu por pelo menos
dois anos seguidos no lugar.
Com tantas brechas, casos
pitorescos pululam, como o
que ocorre no Irã. A forte identidade nacional não impediu os
cartolas de lutarem para colocar no escrete um alemão.
Fereydoon Zandi nasceu em
Emden, chegou a ser convocado para as categorias de base da
seleção local e defende um clube alemão -o Kairserslautern.
Em sua ficha, o Irã só aparece
como país natal de seu pai. Foi,
porém, motivo suficiente para
o assédio começar. Após quase
um ano de negociações com a
federação, Zandi aceitou defender a pátria dos aiatolás no início de 2005. Estreou pouco depois, em fevereiro, num embate
com o Bahrein, em Teerã. "Fui
bem recebido. A torcida gritava
tanto que não conseguia ouvir a
minha voz", contou, na época.
Eterno manancial de atletas
para outras seleções, o Brasil
vai ceder cinco neste ano, dos
quais Marcos Senna é o que
mais tem motivos para festejar.
Na última convocação para a
seleção espanhola, ele era tido
como azarão. No entanto ganhou a vaga. "Percebi que minhas chances seriam mínimas
no Brasil. Como já havia obtido
nacionalidade, optei pela transferência", explica à Folha.
Apesar de manifestações racistas ou de repúdio serem comuns com estrangeiros na nova seleção, o brasileiro diz não
correr riscos. "Fui bem recebido. Tenho um grupo unido e
acho que podemos chegar ao
menos até às quartas-de-final."
Colaboraram FÁBIO TURA , do Datafolha, e
MARIANA BASTOS , da Reportagem Local
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