São Paulo, quinta-feira, 06 de julho de 2006

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José Geraldo Couto

Futebol de resultados

Os que vaiaram a seleção eram os mesmos que, antes, incensavam o time

COM PORTUGAL de Felipão, caiu a última esperança dos brasileiros nesta Copa. De frustração em frustração, quem sabe deixemos de lado a fantasia e comecemos a encarar nossa triste realidade. Somos um país em que quase tudo está fora dos eixos. Com o futebol não é diferente.
Há sempre a possibilidade de aprender com os reveses. Em vez de procurar culpados (desta vez são tantos que a acusação até se dilui), acho que o mais importante é observar o fenômeno coletivo.
Um leitor por quem tenho grande apreço, Caio Bonilha, usou uma expressão feliz -"patriotismo de resultados"- para designar esse sentimento ciclotímico da nossa torcida, que um dia manifesta um ufanismo quase insuportável e no outro, após a derrota, queima a bandeira, renega o país, quer linchar os ídolos da véspera.
A mão que afaga é a mesma que apedreja, já dizia o poeta. Os torcedores que vaiaram e jogaram moedas aos jogadores diante do hotel da seleção eram os mesmos que, nos dias anteriores, haviam incensado esses mesmos jogadores, acotovelando-se por um autógrafo ou por um mísero aceno. O exagero de antes não justifica o exagero de depois, mas ajuda a entendê-lo.
Não é saudável canalizar toda a nossa carência de um país decente para um time de futebol. Ainda que ele seja composto por alguns dos melhores jogadores do mundo, será sempre uma equipe, jogando contra outras equipes e sujeita a inúmeros fatores que vão além da perícia técnica: motivação, condições físicas, preparação tática, equilíbrio emocional, espírito de equipe. Ao que parece, faltou-nos tudo isso.
Confesso que estou aliviado com o silêncio angustiado que se seguiu à eliminação do Brasil. Da perplexidade, quem sabe, pode nascer a reflexão. A euforia obscurece o raciocínio. Outro consolo é ver que o futebol, de um jeito ou de outro, continua a driblar o marketing (segundo o qual o campeão seria o Brasil) e as conveniências políticas (que davam o título à Alemanha). Viva o inesperado.


jgcouto@uol.com.br

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