São Paulo, sábado, 7 de março de 1998

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Quem foi esse tal de Ranielli?

JOSÉ ROBERTO TORERO
da Equipe de Articulistas

O Campeonato Paulista, entre tantas glórias e tradições, tem um orgulho muito especial em relação a seus artilheiros. Por essa competição, passaram os maiores, mais divertidos, mais clássicos e mais briguentos goleadores do futebol brasileiro.
Para começar, o primeiro artilheiro do Paulistão foi ninguém menos que o fundador do futebol no Brasil, Charles Miller, que marcou dez gols no campeonato de 1902 para o São Paulo Athletic.
Depois dele, veio a era de Friedenreich, o maior artilheiro do mundo, com 1.329 gols. Era filho de um alemão e uma mulata e, com essa bela combinação genética, foi nove vezes o marcador máximo do campeonato, a primeira vez com 20 anos e a última, com 37.
E houve ainda astros da grandeza de um Romeu Pellicciari, de um Araken Patuska, de um Teleco e de um Feitiço, três vezes artilheiro pelo São Bento e três, pelo Santos. Aliás, Feitiço foi o primeiro jogador brasileiro a ser chamado de artilheiro, um termo importado do Uruguai.
Mas ninguém brilhou tanto como Pelé, que foi artilheiro do campeonato estadual por 11 vezes -9 seguidas-, chegando à impressionante marca de 58 gols no torneio de 1958.
Passada a era Pelé, vimos brilhar a figura de Toninho, o Guerreiro, e César, o Maluco. Depois, vieram Serginho (quatro vezes artilheiro), Sócrates, Edmar e Juari. E nos tempos recentes, tivemos Casagrande, Viola, Evair, Raí e Giovanni.
Porém, quando lia essa galeria de nomes ilustres no livro "A História do Campeonato Paulista", de André Fontenelle e Valmir Storti, deparei-me com um nome desconhecido, um tal de Téia, artilheiro da Ferroviária no torneio de 1968, com 20 gols.
Nunca ouvi falar desse Téia. É verdade que eu tinha apenas cinco anos em 68, mas alguém que jogando na pequena Ferroviária faz mais gols que Pelé e Toninho Guerreiro não poderia ser totalmente esquecido. Terá sido um gênio que não desabrochou? Largou o futebol por uma bela mulher? Foi quebrado por um zagueiro? Quem foi esse tal de Téia? Como ele entrou na nobre lista dos artilheiros paulistas?
Trinta anos depois, poderíamos ter um novo Téia, porque os jogadores dos grandes times como Oséas, Paulo Nunes, Muller, Dodô, Denílson, Marcelinho e Mirandinha entram no campeonato depois que os times do interior já jogaram muitas vezes, e seus atacantes fizeram muitos gols.
Porém, para evitar que o artilheiro do Paulista seja um jogador de time pequeno, a FPF decidiu zerar os gols feitos até agora. É como se, lento e habilidoso, Ranielli não tivesse feito seus oito gols. Para consertar uma injustiça que foi excluir os grandes da primeira fase, Farah comete outra.
É uma pena. Se os gols fossem mantidos, nossos filhos poderiam ler nos livros de história futebolística que, em 98, Ranielli, da destemida Matonense, foi o artilheiro máximo. Eles imaginariam um atacante rápido, incisivo, dono de um gingado fascinante e de uma rara habilidade na pequena área, um novo Coutinho, um Servílio ressuscitado, um Del Vecchio dos novos tempos e perguntariam: "Quem foi esse tal de Ranielli?"


José Roberto Torero escreve às terças-feiras e sábados


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