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Dentista e piadista, Dr. Trigo ainda ri com 1958
Pioneiro da odontologia no esporte, Mário conserva lembranças, anedotas e as fichas dentárias dos campeões da Suécia
"Amigão" dos jogadores na conquista do primeiro título mundial reside em Brasília e preserva o bom humor que o tornou folclórico na Copa
RODRIGO BUENO
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
O maior sorriso da seleção
brasileira campeã mundial de
1958 era o de um dentista. E ele
ainda sorri, e muito, em Brasília, aos 96 anos. Mário Trigo,
reconhecido doutor e piadista,
não esquece as principais histórias do primeiro título mundial do Brasil. Até porque grande parte delas teve ele mesmo
como personagem envolvido.
""Fui eu [quem teve a idéia de
dar volta no campo após o título na Suécia exibindo a bandeira brasileira]. Ia na frente, você
vê em filme, agradecendo aos
suecos, que torciam mais para a
gente do que para eles [a seleção sueca, vice no Mundial].
Bateram palmas, ficaram de pé
a arquibancada inteira para nos
cumprimentar", falou Trigo,
que atendeu à Folha em casa.
Com a ajuda da mulher, Vâni
Trigo, contou algumas de suas
aventuras pessoais, de suas
paixões e até brincou como nos
velhos tempos de seleção -foi
dentista da equipe nacional nas
Copas de 1958, 62 e 66, e atendeu a atletas de diversas seleções até a Copa de 78.
"O Brasil era favorito antes
[de começar a Copa]. Tinha um
time muito bom, o time era
uma beleza. O Didi, antes de
começar a Copa, me disse no
café, no refeitório: "Doutor, pode dormir tranqüilo que vamos
ganhar a Copa. Muito antes de
ela começar", falou, mesmo
com certa dificuldade por causa de uma isquemia, o dentista.
Pioneiro na sua especialidade médica por levá-la ao esporte, ele acabou desempenhando
diversas funções na Suécia.
"Evidentemente, já havia estudos sobre o reflexo do foco
dentário no corpo O Mário
atuou muito nisso, viu que o
atleta precisa da boa saúde bucal. Ele é considerado até pelo
Conselho Federal de Odontologia o pai da odontologia esportiva", conta Vâni, mulher de
Trigo, que é sua companheira
dedicada desde a década de 60
e que lhe deu seus dois filhos.
"Tirei quase todos os dentes
do Pepe", conta Mário -foram
14, diz com precisão cirúrgica
dona Vâni. ""E do Garrincha",
fala Mário -ele teve um problema num canino, fala Vâni.
As fichas odontológicas dos
jogadores ainda estão com a família, mas por ética médica não
são divulgadas. ""O Zagallo tem
dentes maravilhosos, o Pelé
também", conta dona Vâni, que
exalta também os dentes do
sorridente marido. ""São dele."
"O perigo do foco dentário é
a repercussão a distância", explica o dentista, que há pouco
mais de um ano ainda deu uma
palestra e falou do tema.
"O Mário cuidou dos jogadores inclusive quando estavam
fora da seleção. Era muito alegre, o contato dos jogadores
com os cartolas, não era uma
pessoa que se colocava em posição de importante. Abraçava
tanto o rei quanto o sapateiro",
diz, orgulhosa, dona Vâni.
O médico da seleção, Hilton
Gosling, indicou o nome de
Mário Trigo para integrar a seleção na Copa de 1958. Era uma
novidade na época um dentista
no grupo, mas era um grande
sinal de como a preparação do
time foi levada muito a sério.
"A seleção de 58, a do primeiro título mundial, foi a melhor
para mim. Todo mundo unido,
todo mundo entendia de futebol. Eu joguei e joguei bem por
sinal, mas era amador. A comissão técnica em 58 era ótima", contou o doutor Trigo,
que virou ""chapa" de rei sueco.
"Come here, king", foi a célebre frase do dentista da seleção
após a conquista do título para
o rei Gustavo. E ele repetiu a
frase, em bom inglês, na última
sexta-feira, com a história toda.
"Puxei o rei pelo braço e fui
apresentá-lo." O nobre havia já
cumprimentado os jogadores
brasileiros, mas não tinha falado com Paulo Machado de Carvalho, o chefe da delegação.
"That is the boss", soltou Trigo,
que roubou a cena então diante
da imprensa internacional.
"O senhor pode me dizer que
horas eu posso ir embora?", teria perguntado o rei a Trigo,
que o virava para os fotógrafos.
Um jornalista francês disse a
Trigo na ocasião que ele ficaria
famoso pelo contato real. ""E o
rei também", rebateu com o
seu jeito brincalhão o dentista.
"Contava mentiras [aos jornalistas] e acreditavam", falou
o amigão dos atletas-pacientes.
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