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FUTEBOL
Por uma final decidida "na bola"
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Hoje deve sair, finalmente,
a definição do campeão
brasileiro do ano 2000 ou, pelo
menos, uma decisão sobre como
ele será escolhido.
Nos últimos dias, choveram na
imprensa especulações, informações contraditórias e as mais variadas opiniões sobre como deve
ser o desfecho desse imbróglio.
Do ponto de vista jurídico, parece que o time do São Caetano tem
o direito de pleitear o título, amparado nas leis que regem o futebol e no regulamento da Copa
João Havelange.
Apesar disso, eu considero que
proclamar campeão o clube do
ABC paulista seria um grande
equívoco.
O eventual título, conquistado
nos tribunais, nunca seria plenamente reconhecido pela comunidade futebolística brasileira -e
muito menos pelos torcedores de
todo o país.
Temos antecedentes instrutivos:
os dois campeões brasileiros de
1987 (Sport e Flamengo) e os dois
campeões paulistas de 1973 (Santos e Lusa).
Em ambos os casos, muito diferentes entre si, estão envolvidos títulos contestados e pouco respeitados, que figuram no folclore do
futebol brasileiro.
Para o torcedor, o que vale é o
título conquistado "na bola",
dentro de campo. Por isso, se não
houver um confronto definitivo
entre Vasco e São Caetano, o torcedor brasileiro (não apenas o
vascaíno e o são-caetanense) vai
se sentir frustrado.
Alguns afoitos poderão perguntar: "Se é para agradar o público,
por que não deixaram a partida
de sábado retrasado ser reiniciada, já que a torcida gritava "Queremos jogo'?".
Ora, só a má-fé (ou a burrice)
impedirá alguém de perceber que
se trata de duas coisas totalmente
diferentes.
Uma nova partida, realizada
em condições seguras, sem superlotação, sem alambrado destruído e sem o trauma da tragédia,
não se compara à demagogia perigosa que seria a continuação do
jogo do dia 30 de dezembro.
Sei que são muitos os obstáculos
para a realização de uma nova
partida entre Vasco e São Caetano: transferências de jogadores,
férias, estádios em reformas etc.
Mas penso que os clubes envolvidos deveriam assumir uma atitude madura e generosa e se esforçar para superar todas essas
dificuldades.
Para os dirigentes, seria uma
chance de não sair dessa história
com a imagem de homens mesquinhos e oportunistas.
Para os jogadores, seria uma
maneira de mostrar que seu senso
profissional e seu amor ao futebol
vão além do interesse financeiro
imediato.
Acredito que, em cada jogador,
por mais famoso e bem pago que
seja, exista um lado lúdico e peladeiro, além do lado frio do profissional em busca de salário e estabilidade.
Esse lado lúdico e peladeiro, de
quem tem prazer em correr atrás
da bola, deveria prevalecer num
momento como este.
É preciso que todos -incluindo
aí a gananciosa e autocentrada
Rede Globo- percebam a importância e a gravidade do momento
vivido pelo futebol nacional.
Um escritor (não me lembro
quem) disse certa vez que um homem poderia redimir uma vida
indigna se soubesse morrer com
dignidade.
A Copa João Havelange tem
agora a mesma chance. Foi um
festival de erros do começo ao fim,
mas pode agora se redimir com
uma final histórica, que faria o
torcedor brasileiro voltar a acreditar no futebol de seu país.
(Falo isso por mim: gosto tanto
de futebol que sempre me desaponto um pouco quando o jogo
acaba, mesmo que meu time esteja vencendo).
Tudo pode ser arranjado: o Palmeiras, por exemplo, pode ter
um seguro para uma eventual
contusão de Claudecir (jogador
do São Caetano contratado pelo
clube); os jogadores podem ganhar um adicional por estar trabalhando nas férias; a televisão
poderia vender quotas extras de
patrocínio.
Valerá a pena tanto esforço? A
resposta está nos batidos versos de
Fernando Pessoa: "Tudo vale a
pena se a alma não é pequena".
Chegou a hora de ver quem sabe ser grande e quem tem a alma
irremediavelmente pequena.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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