São Paulo, sexta-feira, 08 de fevereiro de 2008

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XICO SÁ

Onde os "grandes" não têm vez


Os cowboys errantes, os pistoleiros-losers do interior paulista, não perdoam os ditos gigantes no Estadual


A MIGO TORCEDOR , amigo secador, com os cowboys caipiras, assim como no filmaço dos irmãos Coen, os fracos não têm vez. O certame anda tão bom que parece até a Série B do Brasileiro, com seu faroeste à moda Sam Peckinpah, o poeta-mor da violência empoeirada e da morte em câmera lenta como obra de arte. Só tem restado aos treinadores milionários e suas diligências inteiramente desgovernadas pedir um tempo, pedir paciência, senhor, piedade, clemência.
Enquanto isso, os cowboys errantes, os pistoleiros-losers do interior paulista, não perdoam, agem como o psicopata Chigurh (Javier Bardem) na película citada na cumeeira desta crônica. Até o penteado do matador tem algo entre Roberto Carlos setentão e o belo mundo caipira. Quando os ditos grandes arregalaram seus olhos condoreiros, lá estavam as garças do Vale do Paraíba, famintas como abutres que ameaçam Clint Eastwood e Shirley MacLaine no deserto, a devorarem as tripas da soberba palestrina. É Guaratinguetá implacável em todos os duelos.
Até o nono colocado só tem o São Paulo dos clubes tidos e havidos como gigantes. Tem dado sorte, como contra a Ponte, que merecia o triunfo. Se bem que Muricy nunca deu moleza, sempre encarnou, com seus forasteiros, um certo estilo Jeca-roots. Aí o segredo dos seus homens. Mesmo da capital, a Mooca do Mr. Abelha, o Juventus segue na pegada faroeste spaguetti, mandando bala, marcação "uomo a uomo", como na fita genial "A Morte Anda a Cavalo".
A fórmula é a mesma da maioria: elencos repletos de Djangos rodados e refugos vingadores. Repare no Barueri dos Ávalos da vida e suas adagas voadoras. Fungaram no cangote dos corintianos como bando de coriscos com sede de sangue. Mesmo contra time de Mano Menezes, que gosta da rinha de galos da Série B, não deram trégua. Amigo, nada pior do que enfrentar os refugos vingadores, em uma tenebrosa noite de chuvas, a grama voa no branco do olho dos câmeras, sai fogo das canelas como na casa de um ferreiro.
Não é bem o caso de Otacílio Neto, o cearense de Orós artilheiro do certame, cavaleiro do Norusca, que persegue o eldorado das semifinais como quem busca os US$ 2 milhões da pasta dos traficantes de "Onde os Fracos não Têm Vez". Otacílio, que deve ter ouvido em casa histórias dos imperdoáveis e temidos pistoleiros do Vale do Jaguaribe, não trilhou o deserto dos refugos. Veio para São Paulo trabalhar no que aparecesse pela frente, como um migrante qualquer dos sertões. Foi descoberto, por acaso, em um jogo da várzea, quando trocou o emprego em uma pizzaria pelo Ituano, seu primeiro trampo ludopédico.
Para enfrentar os vingadores caipiras, só os destemidos cavaleiros do portunhol selvagem, refugos precoces da latino-américa -alguns são mui "rovens"- que chegam a Santos e a outros portos altaneiros. Esse Michael "Jackson" Quiñonez, equatoriano que veio para o Peixe, joga como quem anda sobre a Lua, imita o passo mais genial da humanidade, o "moonwalk" musical do seu gênio e sósia homônimo. Mas enquanto los hermanitos não entram em campo, los implacáveis jecas não perdoam, matam. As garças do Vale do Paraíba, como os abutres de todas as montanhas, têm fome. Cuidem-se!

xico.folha@uol.com.br


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