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PAULO VINICIUS COELHO
O ex-craque
O Ronaldinho que vestirá depois de amanhã a camisa da seleção pela 88ª vez tem sua chance de ressurreição
SE ESTA fosse uma daquelas matérias do tipo "Por onde anda",
que fazem parte do imaginário
do torcedor, poderia começar assim:
"A imagem daquele dia no Santiago
Bernabéu nunca lhe saiu da cabeça.
Nem da torcida do Real Madrid, que
o aplaudiu de pé, depois de vê-lo
marcar dois gols em arrancadas fulminantes desde o meio-de-campo.
Ronaldinho Gaúcho lembra-se até
da data, 19 de novembro, em que
conseguiu o que só Diego Maradona
havia alcançado: receber palmas da
torcida rival, vestindo em Madri a
camisa do Barcelona".
A cena aconteceu há menos de
cinco anos e segue na memória. O
futebol que Ronaldinho apresentou
ali é que se tornou uma lembrança.
Ronaldinho ainda não completou
29 anos. Na terça-feira, vestirá a camisa da seleção pela 88ª vez. A cada
convocação, discute-se nomes como
Elano, reserva em seu clube. Então,
já é tempo de discutir Ronaldinho.
"O sentido geral aqui é que não
aconteceu nada do que se imaginava, quando o Milan o contratou. Que
Ronaldinho ainda não jogou bem e
que há um problema tático quando
joga junto com Kaká", testemunha o
jornalista italiano Enzo Palladini. "É
o caso oposto ao de Beckham, que
encontrou um lugar na equipe com a
lesão do Gattuso."
O problema tático a que se refere
Palladini ficou escancarado numa
entrevista de Kaká, em dezembro.
Kaká dizia estar jogando longe demais da grande área quando atuava
com Ronaldinho. A entrevista foi a
senha para Carlo Ancelotti voltar à
formação campeã europeia de 2007,
com Kaká e Seedorf lado a lado.
"Depois da entrevista em que eu
disse querer jogar mais à frente, chegamos a jogar o Ronaldinho e eu, na
mesma linha. No início deste ano é
que o treinador optou por outra maneira de jogar. Não tem mais a ver
com o que eu disse em dezembro",
diz Kaká. Ou seja, Ancelotti achou o
time melhor sem Ronaldinho.
Há um ano, um amigo da família,
que conhece Ronaldinho desde a infância, relatava que o prazer do craque continuava a ser o futebol. Jogava sem parar, até nos momentos de
repouso em Guaíba, perto de Porto
Alegre, ou na praia, em Santa Catarina. A ausência de prazer resumia-se
a Barcelona. A opinião era a de que
estava saturado da cidade, da badalação, da pressão. Admitia-se que
Ronaldinho tivesse uma espécie de
síndrome de Marcelo Saliola, símbolo da crise por que passavam os
tenistas adolescentes brasileiros
nos anos 80. Por começarem a trabalhar muito cedo, perdiam o prazer
na hora de competir a valer.
Ronaldinho trabalhou para ser
craque desde os 10 anos. Aos 28,
campeão do mundo pela seleção e
da Europa pelo Barcelona, teria simplesmente perdido o tesão. Recuperaria em Milão. Era uma tese.
Esse mesmo amigo da família fala
desapontado sobre o que não aconteceu com Ronaldinho na Itália.
"Está todo mundo vendo", diz.
A história do clássico Brasil x Itália registra ao menos uma ressurreição: Paolo Rossi. Quando fez três
gols no Brasil, em 1982, fazia apenas
três meses de seu retorno aos campos, depois da suspensão pelo escândalo da loteria esportiva. Não fazia gol por sua seleção desde 1979.
Com o devido pedido de licença, era
um ex-craque. É assim que Ronaldinho entrará em campo na terça.
pvc@uol.com.br
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