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JOSÉ ROBERTO TORERO
Professor dos professores
Zé Cabala encarna Brandão, o único técnico que se sagrou campeão paulista por todos os clubes do Trio de Ferro
Q
UANDO ENTREI na sacrossanta de sala de Zé Cabala, encontrei-o sentado em posição de lótus, usando um turbante
verde-e-rosa e cantarolando: "Eu
vou dos versos de Camões/ Às folhas
secas caídas de Mangueira...".
Pigarrei e perguntei: "Cantando,
mestre?".
"Claro que não, meu rapaz, eu estava meditando. Só que não gosto de
usar aqueles mantras sem graça. Vamos lá, qual jogador você quer entrevistar hoje?"
"Pensei em falar com um técnico,
só para variar."
Então o grande carteiro das almas
levantou-se, deu uns giros que pareciam passos de mestre-sala e afirmou: "Boa tarde, meu nome é Oswaldo Brandão".
"Brandão?! Aquele que foi campeão paulista pelos três times
do Trio de Ferro? Aquele que nasceu
em Taquara, no Rio Grande do Sul,
em 18 de setembro de 1916? Aquele
que..."
"Pelo jeito você já sabe tudo e não
precisa perguntar mais nada."
"Desculpe, eu me emocionei.
Bem, é... o sr. foi jogador de futebol?"
"Fui. Só que me machuquei e pendurei as chuteiras. Então virei técnico. Logo de cara fui campeão paulista como técnico do Palmeiras. E eu
tinha só 31 anos."
"Rápido, hein?"
"E também me aposentei rápido.
Fui ser gerente de cinema. Mas o
Corinthians me chamou, e voltei."
"Vamos falar do Trio de Ferro.
Pouca gente lembra que o senhor foi
técnico do São Paulo."
"Mas eu fui. E por 143 jogos, com
85 vitórias. Ganhamos o Paulista de
71, mas eu gosto mesmo é de lembrar daquele jogo contra o Santos de
Pelé em 63. Eles eram os campeões
mundiais, os tais, os bambambãs,
mas, no começo do segundo tempo,
nós já ganhávamos de 4 a 1. Os santistas começaram a cair em campo
para acabar com o jogo. Um vexame
para eles e uma glória para mim!"
"Mas o senhor tem uma história
triste com o Santos, não é?"
"Nem me lembre... Eu era o técnico do Botafogo de Ribeirão Preto
naqueles 11 a 0, quando o Pelé marcou oito vezes. E duas semanas
depois estava no Corinthians quando perdemos de 7 a 4. Foram 18 gols
em 15 dias. Bah!"
"Qual o melhor time que o senhor
já montou?"
"Ah, sem dúvida foi a Segunda
Academia do Palestra. Só para você
ter uma idéia, em 1972, nós fizemos
78 jogos e perdemos apenas cinco.
Fomos campeões paulistas invictos
e ganhamos o Brasileiro. Era um timaço!"
"O Palmeiras foi o time que o senhor mais dirigiu?"
"Foi. 580 jogos e 335 vitórias."
"O senhor fazia o estilo paizão,
não é?"
"É. Naquele tempo não tinha esse
negócio de psicólogo nem de procurador. Os rapazes precisavam de
ajuda para andar na linha. Teve um
que eu não escalei enquanto ele não
devolveu um carro caríssimo que ele
tinha comprado."
"O senhor também foi o técnico
mais importante da história do Corinthians, não é?"
"Pode ser. Foram 438 jogos e 249
vitórias. Eu ganhei o último título
antes dos 22 anos de jejum, o do 4º
Centenário, e estava no banco quando o Basílio fez aquele gol na Ponte
Preta. Nesse meio tempo o time trocou 27 vezes de técnico, mas só foi
ser campeão comigo, naquele 13 de
outubro de 1977."
"Falando nisso, conta a lenda que,
no dia da final contra a Ponte Preta,
o senhor foi até o quarto do Basílio e
disse para ele: "Negão, descanse aí
que amanhã você vai me fazer o gol
da vitória". É verdade?"
"Verdade verdadeira."
"E como o senhor sabia disso?"
"Eu era espírita e tinha recebido a
informação de uma fonte segura.
Aliás, dê uma generosa gorjeta ao
grande Zé Cabala. Ele merece."
torero@uol.com.br
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