São Paulo, sábado, 08 de novembro de 2008

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MOTOR

Hamilton, a F-1 e um desafio


Inglês não chegou e não arrebatou a categoria por ser negro, mas sim por ser bom, muito bom, dentro do carro

FÁBIO SEIXAS
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

"TERRITÓRIO frequentado por esportistas brancos há anos, as categorias de ponta do automobilismo, Indy e F-1, vêm preparando negros para disputarem seus próximos campeonatos (...) Nos EUA, David Francis Jr., 26, foi escolhido pela Cart (que organiza a Indy) na última semana para testar um carro da F-Atlantic, campeonato de base da Indy, no fim do ano.
Na Europa, um negro integra o programa de desenvolvimento de pilotos da Mercedes-Benz e da McLaren. Lewis Hamilton, 14, inglês, disputa o Campeonato Italiano de kart. E, no mês passado, foi vice-campeão do Europeu, disputado em Angerville, França. A F-3.000, último degrau antes da F-1, também conta com um negro, Jason Watt." Assim começava reportagem deste colunista publicada pela Folha em 13 de agosto de 1999. O tema, a escassez histórica de negros no esporte a motor e algumas iniciativas que poderiam mudar esse cenário.
Iniciativas de espíritos distintos.
A americana era um projeto de inclusão, um certo "Programa de Desenvolvimento de Pilotos Afro-Americanos da Cart", que tinha por trás o reverendo Jesse Jackson. Na McLaren, a cor da pele era um detalhe: o programa da equipe era cheio de branquelos. Já Watt seguia sozinho a rota normal de um piloto bom, em busca da F-1.
Deles, dois ficaram no caminho.
Francis Jr. nunca chegou à Indy e, admito, não consegui descobrir o paradeiro. Mas não virou piloto.
O dinamarquês Watt foi vice da F-3000 naquele ano e negociava com a F-1 quando sofreu um acidente de moto em Oslo em perdeu os movimentos das pernas. Seu sonho acabou ali. Hoje, disputa o Nacional de Turismo em seu país, com um modelo Seat adaptado.
Duas "fatalidades". A de Francis Jr., ser ruim de braço. No último registro que encontrei, ele havia sido 21º numa prova da Barber Dodge em Detroit. Assim, não tem programa de incentivo que dê jeito. A de Watt, o acidente que interrompeu sua carreira bem no momento do último e decisivo embalo.
Hamilton não chegou à F-1 por ser negro. Hamilton chegou e arrebatou a F-1 por ser muito bom de braço. E, como ele mesmo declarou no pós-título, não pensa que é negro quando está a caminho do grid.
Se Hamilton não chegou à F-1 por ser negro e não ganhou o título por ser negro, por que associar à cor negra de sua pele as críticas que lhe são feitas? Nos últimos dias, foi assim. Hamilton foi vaiado em Interlagos? Racismo. Um site espanhol torce contra ele? Racismo.
Besteira. Ele foi vaiado e é alvo de torcida contra por ser bom.
Aos 23, Hamilton tem pelo menos mais dez anos de F-1. Para ele e para a categoria, o desafio será não ver racismo onde há apenas crítica.
Do contrário, será muito chato.

fseixas@folhasp.com.br



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