São Paulo, quinta-feira, 09 de março de 2006

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COPA 2006

Projeto para coibir tráfico de mulheres pode ser usado no Mundial

Europa propõe visto contra prostituição e irrita Brasil

DA REPORTAGEM LOCAL

Uma polêmica proposta da União Européia pode obrigar cidadãos de países em desenvolvimento a obter um visto especial para acompanhar jogos da Copa na Alemanha. O intuito do projeto é evitar o aumento da prostituição durante o evento.
O plano foi tornado público ontem por Franco Frattini, comissário da UE para Justiça e Segurança, e já gerou protestos.
Durante festejos do Dia Internacional da Mulher, na Bélgica, Frattini avisou que vai esquadrinhar a proposta em reunião de ministros europeus programada para abril.
O visto seria obrigatório para todos os que ingressassem na Europa e utilizado durante a disputas do Mundial, que ocorre entre 9 de junho e 9 de julho.
A lista de países para os quais o documento seria compulsório não está fechada. Um político próximo a Frattini disse à agência de notícias Reuters que o Brasil estará presente, bem como outras nações da América Latina, do Leste Europeu e da África.
"Eu me refiro a todos os países de Terceiro Mundo onde, de acordo com nossas estatísticas, mulheres são facilmente expostas ao tráfico internacional", explicou Frattini. Ele também deseja que países integrantes do bloco da UE sejam particularmente rigorosos nos controles fronteiriços.
Segundo previsões de ONGs e do Conselho de Mulheres da Alemanha, cerca de 40 mil prostitutas trabalharão durante o certame. Metade devem proceder da América Latina e do Caribe.
A prostituição é legalizada no palco da Copa -profissionais têm assegurados direitos trabalhistas, como férias e seguro-saúde- e virou aposta de empresários para obter lucros no principal torneio de futebol do planeta.
Novos bordéis e prostíbulos de luxo estão sendo erguidos nas 12 cidades-sede, que devem reunir 3 milhões de turistas, na esmagadora maioria homens.
Autoridades brasileiras que buscam coibir o incremento de tráfico de mulheres por causa do Mundial não gostaram da proposta da União Européia.
"Ainda não tive acesso ao texto com o teor do projeto, mas me parece algo preconceituoso e agressivo. É o caso de acionarmos o pessoal das relações exteriores para que uma atitude seja tomada", disse Ivens Gama, gerente substituto de projetos da Secretaria Nacional de Justiça, que investiga o tráfico internacional.
Gama explica que a idéia se enquadra no perfil de soluções que os europeus buscam para o tema. "Eles sempre transferem a responsabilidade para o lado do explorado e nunca para quem atua na outra ponta, que são os que procuram serviços de prostituição. Uma política eficiente para combater este tipo de tráfico deve levar em conta os dois lados", diz.
Procurado pela Folha, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil relatou que não vai se pronunciar enquanto não tiver acesso ao projeto da UE. A pasta informou, contudo, que a criação do visto vai ter efeito recíproco. Ou seja: cidadãos europeus também precisarão de autorização para entrar no país durante a Copa.
Quem lida no dia-a-dia com mulheres brasileiras negociadas como mercadoria também vê problemas na proposta de Frattini. "Uma coisa dessas vai criar mais incidentes diplomáticos do que soluções para o problema do tráfico. Pessoas serão barradas em aeroportos, haverá preconceito. Tudo bem que é preciso tomar uma atitude para coibir a prostituição, mas isso é demais", disse Sonia Leão-Sitals, coordenadora da ONG Imbradiva (Iniciativa de Mulheres Brasileiras contra Discriminação e Violência).
Sua entidade atende brasileiras em Frankfurt e organizou, no ano passado, um congresso no Ceará para evitar o aliciamento de mulheres visando a Copa.


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