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Hoje, 15h, Berlim
ITÁLIA X FRANÇA
Uma final duas europas
Decisão da Copa coloca em campo maior dilema atual no continente: o multiculturalismo da equipe francesa, em que negros, mulatos e filhos de imigrantes são maioria, contra o nacionalismo da seleção italiana, formada por 23 brancos que jogam no país
Christophe Ena/Associated Press
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Zinedine Zidane, filho de argelinos, que tentará o segundo título para a França, no seu último dia como jogador de futebol |
FÁBIO VICTOR
PAULO COBOS
ENVIADOS ESPECIAIS A BERLIM
GUILHERME ROSEGUINI
RICARDO PERRONE
ENVIADOS ESPECIAIS A DUISBURGO
As duas seleções que estão na
final da Copa do Mundo, hoje,
às 15h, são chamadas pela cor
de sua camisa, os Bleus franceses e a Azzurra italiana. Os dois
times que estarão em campo no
Estádio Olímpico de Berlim são
uma história à parte.
Ainda numa definição por
cores -ou melhor, por raças-,
a decisão é o duelo da Itália
branca contra a França negra e
mulata, num contraste que, na
verdade, se estende para além
do que se vê à flor da pele. É o
embate entre o complexo multiculturalismo francês e o persistente nacionalismo italiano.
Se a França repetir 1998 e levar o seu segundo título mundial, mais uma vez consagrará
os heróis de uma nação multirracial. E fará mais: colocará no
livro das Copas do Mundo a seleção campeã mais negra e mulata da história da competição.
Entre os 23 jogadores franceses, há 15 negros ou mulatos.
Em nenhum dos seus cinco
títulos, o Brasil teve tantos atletas com raízes africanas no
elenco. Em 2002, por exemplo,
reunia 13 negros/mulatos e dez
brancos (ou 12 e 11, já que Ronaldo, em entrevista à Folha,
disse se considerar branco).
Primeiro sinal da tendência
que agora se reforça, a França
campeã de 98 contava com oito
negros ou mulatos.
Agora, dos outros oito não-negros, um, o meia Dhorasoo,
tem pele escura, mas origem
indo-mauriciana. E o astro da
equipe, Zinedine Zidane, que
hoje se despede do futebol, tem
ascendência argelina.
Além dos vários franceses filhos de imigrantes, o time treinado pelo branco Raymond
Domenech reúne seis jogadores nascidos em outros países
da África e do Caribe.
Uma vez mais, o chamado time "arco-íris" foi criticado pelo
líder ultradireitista Jean-Marie Le Pen, que disse que a seleção não representava a composição racial do país. Como já
ouvira de Thuram ("Ele nasceu
no século errado"), ouviu de
novo de Thuram: "A França
que ele vê não é a França real".
A Itália tem 23 brancos em
seu elenco. Só dois atletas nasceram em outros países, mas
ambos são de família italiana.
Sob qualquer ângulo, a esquadra liderada por Marcello
Lippi é fechada em suas fronteiras. Todos os convocados
atuam no futebol italiano, uma
das duas únicas seleções 100%
nacionais do Mundial alemão
(a outra é a Arábia Saudita). "O
fato de jogarmos na Itália ajudou a criar esse grupo uniforme, que se entende em campo.
Todos já se conhecem, sabem o
que precisam fazer para se
adaptar ao estilo do nosso jogo", interpreta o volante Pirlo.
Se é verdade que as seleções
de futebol espelham as sociedades que representam, os dois
times da final têm muito a contar sobre França e Itália. As
histórias dos filhos de imigrantes que formam os Bleus não
diferem muito das dos adolescentes que incendiaram as periferias do país em novembro
passado, revoltados contra o
preconceito e a discriminação.
Ao lembrar recentemente da
conquista de 98, Zidane destacou o prazer que teve com a
sensação de harmonia racial
gerada pelo título. "O que eu
me lembro é principalmente
dessa festa, em que não havia
brancos ou negros, todos estavam juntos. Eu voltei para reviver esse momento", disse o
meia, sobre o retorno ao time
nacional em 2005 após ter
anunciado a aposentadoria.
Os distúrbios sociais dos
"banlieues" (subúrbios) mostraram que a idéia de integração é ilusória e simplificadora,
e o novo sucesso da seleção recoloca a discussão em pauta.
Na Itália, como já ocorrera
em 1982, ano da última conquista mundial, a seleção ressurge como vitoriosa em meio
a um megaescândalo de corrupção no futebol do país. Se
triunfar hoje, a Azzurra, que
também venceu em 1934 e
1938, chega ao quarto título e
se isola como o segundo país
mais vitorioso em Copas do
Mundo, superando a Alemanha e encostando no Brasil.
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