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SONINHA
De previsível, basta a vida?
A rotina da vida, a incerteza
do jogo... Reclamamos
de um e de outro, mas
gostamos dos dois
POR MAIS que a gente diga que é
possível, não acredita realmente que seja. Por mais que
se prepare, fica espantado. Por mais
exemplos que tenha para confirmar
a tese, duvida de que vá acontecer de
novo. Mas clássico é clás... Ah, queria
evitar o chavão, mas não tem jeito.
O superlíder São Paulo, que não
deixou o Santos respirar, que passou
por cima do Boca Juniors, que só tinha perdido três vezes no campeonato todo, terminou a semana com
duas derrotas seguidas: para o Flamengo, décimo colocado, e o Corinthians, 18º. No espaço de cinco dias,
tomou dois gols -quase 20% do total sofrido em sete meses.
O Corinthians já tinha, aparentemente, esgotado sua cota de surpresas com a vitória sobre o Santos.
Time abalado, técnico ameaçado,
adversário muito mais qualificado...
Mas, para quem apostou no favorito,
deu tudo errado.
E a gente gosta de futebol por causa disso. Como é bom não saber o
que vai acontecer... Por quê? Porque
é um jogo, oras. Não é a vida, é só um
simulacro. (Melhor repetir várias
vezes para não esquecer: é só um simulacro, é só...)
Na vida, gostamos de justiça
(...gostamos?), da lógica das probabilidades, da vitória de quem parece
merecê-la. Detestamos a surpresinha de última hora, o lance fortuito
que altera o fim da história. Entre
todas as pessoas que se queixam da
rotina, são poucas as que realmente
apreciam o imprevisível... A maioria
prefere saber tudo antes: se vai chover, quem vem para o jantar, quem
matou Thaís. E procura no jogo a
emoção da falta de lógica.
Nem todo esporte é ""jogo" no sentido de ser tão sujeito à força do acaso; o futebol é. Um lance apenas -no
começo, no meio ou no fim da história- pode fazer toda a diferença.
Você soma 40 horas de trabalho
bem-feito, mas põe tudo a perder
em 40 segundos. Ou 4. É fascinante.
Ele é muito desequilibrado na relação tempo de disputa x momento
de decisão; esforço x resultado.
Não é que o São Paulo tenha jogado superbem e o Corinthians não tenha se esforçado, de modo que o resultado de domingo tenha sido injusto. Mas o esforço alvinegro foi, na
maior parte do tempo, pouco promissor, improdutivo ou estéril.
Mesmo jogando feio, sem muita inspiração, o São Paulo era sempre
mais incisivo, mais perigoso. Tanto
que criou mais chances, e Felipe, como sempre, apareceu muito bem.
Mas deixou Betão so-zi-nho dentro da área... Que comovente a emoção dele, na hora do gol e depois da
partida, e por tão pouco! É pouco para salvar o campeonato. Mas é como
um feriado com sol no meio de um
mês de tempo ruim: como (e por
que) não se alegrar com ele? Estava
errada a torcida do Flamengo em
curtir a vitória de quinta-feira?
A torcida do São Paulo, mal-acostumada, talvez fique tensa após duas
derrotas seguidas. Sempre é bom se
preocupar; o tempo pode virar a
qualquer momento e trazer uma
tempestade que surpreenda os meteorologistas. Por enquanto, as nuvenzinhas não ameaçam o céu azul.
A rotina laboriosamente construída
não é abalada com tanta facilidade; a
roleta do acaso é mais determinante
no formato apropriadamente conhecido como ""mata-mata". Na vida
dos pontos corridos, a surpresa fascina, diverte, mas não decide.
soninha.folha@uol.com.br
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