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São Paulo, terça-feira, 09 de dezembro de 2003

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"Big Brother" da Ponte tem pendura, processos e CPI

Único paulista ameaçado de rebaixamento no Nacional põe por terra ascensão recente e amarga deserção de 21 atletas em 2003, o que lhe valeu apelido de programa

MARCUS VINICIUS MARINHO
ENVIADO ESPECIAL A CAMPINAS

Cada semana sai um. Em dois anos, a Ponte Preta deixou de ser um modelo de administração e de clube emergente para assumir a posição de único paulista da Série A ameaçado pelo rebaixamento. A séria crise no clube campineiro, marcada pela constante saída de atletas, vai muito além do pífio desempenho no gramado.
O time vem sendo jocosamente apelidado em Campinas de "Big Brother", programa da Rede Globo em que um participante diferente é eliminado a cada sete dias.
Semana após semana, acontecia na Ponte o sumiço repentino de atletas que, descobria-se depois, tinham abandonado o clube, que não vence há nove rodadas. O último triunfo foi sobre o arqui-rival Guarani, há dois meses.
Num campeonato em que são premiados planejamento e organização, a Ponte está em penúltimo lugar não por acaso.
É o time que mais mudou: 21 jogadores já deixaram o clube em 2003, a maior parte dos por causa de atrasos nos pagamentos.
Há no clube atletas que alegam ter salários de até 15 meses por receber. Dos que saíram, muitos entraram na Justiça em busca de seus direitos federativos -casos do zagueiro Rodrigo, do meia Alex Oliveira e do atacante Fabrício Carvalho.
"De fato, existem pendências de salários. Temos cerca de R$ 3,5 milhões de dívidas", diz o ex-zagueiro Ronaldão, gerente de futebol do clube. "Mas os atletas que saíram não foram corretos, fugiram de mansinho à noite."
O presidente da Ponte, Sérgio Carnielli, também ataca os jogadores: "Como a Ponte não esconde nada, os empresários se aproveitaram da situação para tirar os jogadores. Esses atletas têm a profissão, o clube e os valores em segundo lugar. Só pensam em dinheiro". Carnielli diz ainda que "a maioria [dos atletas] está por um ou dois salários, alguns por mais, mas não chega a dez".
Há dois anos, a administração da equipe de Campinas era considerada exemplar. Em 1997, um ano depois de começar a gestão Carnielli, a Ponte subiu para a Série A, que não disputava havia 11 anos. Saneou suas finanças e reformou seu estádio. Um grupo de empresários, liderado por Carnielli -que é diretor-presidente da Tecnol, maior empresa do setor ótico da América Latina- injetou dinheiro no clube.
Mais resultados: em 1999, o acesso no Paulista. Dois anos depois, o clube chegou às semifinais do Paulista e da Copa do Brasil e ficou perto de quebrar o tabu de nunca ter ganho um título. A venda de atletas como Washington e Luís Fabiano para o exterior teria rendido mais de US$ 8 milhões.
Como um clube em franca ascensão voltou a entrar em crise? Segundo a diretoria, além da situação difícil do futebol brasileiro, a culpa é do Clube dos 13. "Eles prometeram que teríamos um valor de cota de TV e veio menos da metade. Nunca comprometeríamos os salários se esse dinheiro tivesse vindo", diz Carnielli.
O C13 nega ter traído o acerto. "A Ponte Preta está recebendo o que foi combinado e o que lhe é de direito. Eles que encontrem as razões para o insucesso do clube em outro lugar", disse, irritado, o presidente da entidade, Fábio Koff.
Com as deserções, predomina o famoso "bom e barato": 14 atletas, do elenco de 24, foram revelados no clube. "Isso atrapalha demais. Tive de amadurecer garotos que, normalmente, entrariam mais devagar e não já numa pedreira dessas, tendo de evitar o rebaixamento", diz o técnico Abel Braga, no cargo desde o final de 2002.
As mudanças refletiram no aproveitamento: 23% no segundo turno, de longe, o pior do Nacional -fora 46,4% no primeiro.
Como fosse pouco, em meio à crise do clube, Carnielli é investigado pela CPI do Banestado, que pediu a quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico dele e de sua empresa, a Tecnol Ótica.
Rastreamentos feitos pela Polícia Federal apontam que Carnielli tem repasses irregulares de US$ 3,6 milhões em seu nome e de US$ 2,5 milhões em nome da Tecnol, entre 1996 e 2002.
Ele nega ter contas no exterior e que tenha feito remessas. Em seu depoimento à CPI, no último dia 27, o dirigente -que cumpre seu terceiro mandato na Ponte até dezembro de 2005- afirmou que abre mão de qualquer dinheiro encontrado em seu nome em contas bancárias do exterior.


Colaboraram Diogo Pinheiro, da Folha Campinas, e Toni Assis, da Reportagem Local

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