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FUTEBOL
Santa ajuda
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE OPINIÃO
Há diversas formas de tentar solucionar dívidas -esse drama que aflige tantos clubes
de futebol brasileiros. Uma das
dicas, que colhi entre entendidos
em simpatias e coisas do além, recomenda que o endividado vá a
uma igreja e acenda velas verdes
e brancas para almas que poderão auxiliá-lo. Pode-se recorrer
também, como esforço suplementar, a um bilhetinho endereçado a
essas entidades. Ele ajudaria a
obter "mais energia e vibração".
De volta à casa, é fundamental
acender outra vela, esta para
Santa Edwiges, que como se sabe
protege os endividados.
Se as almas e a santa não captarem a mensagem, há um outro
santo que costuma agir nesses casos: o governo. No Brasil ele já fez
alguns bons milagres -sempre à
custa, obviamente, do dinheiro
do contribuinte.
Infelizmente, mesmo o governo
tem se tornado um pouco mais rígido no atendimento dessas preces. Afinal, ele próprio encontra-se endividado até o pescoço. Com
isso, ficou menos fácil obter graças governamentais. Mesmo que
possa -e mesmo que deva em casos especiais- oferecer condições
diferentes das de mercado para
sanar problemas de empresas ou
setores em dificuldade, o governo
cada vez mais costuma exigir
contrapartidas, garantias, propostas viáveis e realistas para o
saneamento financeiro.
Em recente seminário organizado pelo Clube dos 13 na Fundação Getúlio Vargas voltou à baila
o auxílio governamental aos clubes de futebol -que, apenas com
o INSS, devem ao setor público
em torno de R$ 700 milhões. O
ministro Agnelo Queiroz lançou a
obviedade: para que possa haver
ajuda os clubes precisarão se enquadrar no regime comercial, publicando balanços e prestando
conta de suas atividades.
Bem, isso não é requisito para
receber auxílio, mas para que os
clubes existam. Para que algum
auxílio público seja cogitado seria
preciso muito mais do que publicar balanço. Não se trata de ajudar esse ou aquele, mas de apresentar um plano de restruturação, com propostas que fiquem
em pé, metas e garantias. E um
plano assim deveria ser oferecido
ao mercado, antes de mais nada.
O governo já subsidia fortemente os clubes. O INSS cobrado dessas entidades é mais baixo do que
o normal. E ainda assim não são
poucos os desvios cometidos. O
Ministério da Previdência tem
um estudo em que lista 13 expedientes irregulares utilizados pelos clubes para escapar do fisco.
Apesar disso, o próprio governo
é complacente com a situação.
Considera que os clubes não têm
patrimônio... Afinal o que é uma
marca como Flamengo ou Palmeiras se não patrimônio? Por
que elas não deveriam ser colocadas na mesa em negociações com
o mercado ou o governo?
Falta ao futebol brasileiro uma
liderança com visão setorial e capacidade empresarial. Com os
atuais representantes do Clube
dos 13 e da CBF, a sangria vai
continuar. E o governo, que
atualmente só pensa em superávit fiscal, dificilmente fará mais
do que faz -vista grossa.
Até a última
Seria bom se os clubes encarassem o Campeonato Brasileiro
de 2004 com mais planejamento. Como se viu na primeira experiência do sistema de pontos
corridos, não é boa idéia ir tocando o barco para se preocupar no fim. Pontinhos perdidos
aqui e ali, que aparentemente
não valem nada, acabam valendo muito no final. A competição ganharia se mais clubes pudessem estar disputando o título até o fim. Neste ano, o Cruzeiro acabou voando e sobrando na turma. Ainda assim, a
competição vai chegar à sua última rodada com muitas "decisões" -tanto para vagas na Libertadores quanto para definir
o rebaixamento. O torcedor,
que já entendeu como a coisa
funciona, provavelmente será
mais exigente com seus clubes
no ano que vem.
E-mail - mag@folhasp.com.br
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