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Honra e mérito
LÚCIO RIBEIRO
Editor-adjunto da Ilustrada
As atenções do futebol estão hoje voltadas para a rodada paulistana do Mundial de Clubes, que
define um de seus finalistas, o time que na pior da hipótese futurística já vai acordar amanhã como uma das duas melhores agremiações da Terra, segundo a Fifa.
A voz corrente da crítica esportiva brasileira de ponta é a de que
logo o Mundial de Clubes suplantará em importância a Copa do
Mundo de seleções. Argumento
plenamente defensável por duas
razões.
A primeira é que a paixão clubística é bem maior do que o
amor pela seleção (se o Corinthians enfrentasse a seleção brasileira, para quem você acha que o
corintiano torceria?).
A segunda é a prática cada vez
mais corrente de os times grandes
do planeta formarem superequipes. Alguém duvida que o Arsenal, de Londres ou mesmo o poderoso Manchester United sejam
bem melhores do que a seleção inglesa? Ou que o Real Madrid que
aqui está não tenha mais força do
que a seleção espanhola?
Tudo muito bom, tudo muito
bem, mas o fato é que o primeiro
encontro mundial de clubes promovido pela FIFA ainda está
mais com cara de "torneio de verão" do que de campeonato com
potencial de ser mais badalado do
que a Copa do Mundo. E essa ausência de legitimação do Mundial
é culpa dela mesmo, sim, da velha
conhecida cartolagem.
São Paulo, Brasil, América do
Sul, Planeta Terra. Federação
Paulista, CBF, Confederação Sul-Americana, Fifa. No micro ou no
macrocosmo do futebol, o que impera é o jogo de interesses. Nunca
o jogo jogado. Eu sei, o discurso é
batido e tal, mas agora atingiu níveis de amargar. É perdoável considerar experimental um primeiro torneio. Mas este precisava começar tão errado?
Se a fria lógica prevalecer, essa
mesma lógica que o futebol capricha em derrubar, Vasco e Corinthians, justamente os dois times
biônicos do torneio (mais o Vasco
que o Corinthians, na verdade),
decidem na próxima sexta-feira
qual é o melhor time do mundo.
Veja bem, não do Campeonato
Brasileiro, da Copa do Brasil,
nem mesmo, vá la, da Libertadores. É da Terra. Do mundo. Do sistema solar, da galáxia, pelo que
sabemos.
Absurdo? Talvez não, uma vez
que os dois representantes nacionais são disparados os melhores
times do chamado, permita-me,
"país do futebol", o primeiro do
ranking, o tetra.
Mas e o mérito?
Na ponta do lápis, e se o normal
da bola se confirmar, o Corinthians será campeão do Planeta
Terra sem ganhar de ao menos
um time de expressão internacional. Pois sua campanha até a glória mundial seria vencer um clássico caseiro (Vasco), dois times
que não se classificariam para
um octogonal do Paulistão (Raja
Casablanca e Al Nassr) e empatar
em casa com o Real Madrid.
Essa trajetória corintiana renderia uma estrela amarela em
sua camisa da mesma importância das que ostenta, por exemplo,
o São Paulo, que só as conquistou
depois de passar pelas batalhas
da Libertadores e pelos gigantes
Barcelona e Milan em campo
neutro. A culpa está longe de ser
do Corinthians, que montou um
time ainda mais poderoso do que
o que conquistou o bicampeonato
brasileiro.
Quem caminha na contramão
da credibilidade é a toda-poderosa Fifa, a própria organizadora
do Mundial, que merece ter mostrado na estréia, para a Europa
via TV, um jogo do "campeão do
século", o Real Madrid, talvez
com o menor público de um jogo
desse vulto da história do time espanhol. Merece o desdém de uma
equipe que se disse "forçada" a
participar, a tal da "missão diplomática" inglesa. Merece o gol da
bola que não entrou. Merece um
jogo do Corinthians com menos
público do que aquele que o time
arrastou ao Morumbi em qualquer jogo da fase final do último
Brasileirão.
Que o segundo Mundial de Clubes seja realizado na mão inversa
do que foi este, o "experimental".
Com mais times de expressão e de
méritos. Para termos mais jogos
de encher os olhos como o Corinthians x Real da última sexta.
José Geraldo Couto, que escreve neste espaço às segundas-feiras e aos sábados, está
de férias
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