São Paulo, sexta-feira, 10 de abril de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

XICO SÁ

O que eu vejo é o beco


O drama de Adriano, ao buscar refúgio em sua vila natal, lembra o caubói ferido de volta ao velho rancho


AMIGO TORCEDOR , amigo secador, noves fora qualquer julgamento -que moral tenho para fazê-lo?!-, é tocante essa história do Imperador que busca refúgio e alívio para o desassossego na sua saudosa maloca.
Quando o gigante desaba, e desaba na humaníssima frequência das criaturas que não aguentam o tranco das dores do mundo, é lá na Vila Cruzeiro que o cara reencontra o mínimo de eixo.
É na cadeira de lata do bar da favela, como descreve o leitor Marcos Barbosa, que ele acha o bálsamo. Não é na boate da moda na Europa ou no Rio. Que me desculpe, amigo, a comparação barata deste cronista que ama bom populismo à milanesa. É na primeira cerveja esclarecedora e de direito, aquela que limpa os caminhos do filho que à casa torna, que um homem redescobre a razão mínima para estar vivo. Pouco importa se a causa do infortúnio é a dificuldade de lidar com o sucesso, como apontam psicanalistas, ou uma dor de cotovelo digna de letra de Lupicínio Rodrigues. Nesse momento não adianta afogar no álcool a sua lembrança, como na vingança ridícula da música de Cartola. Não é um trago em qualquer canto, não é um fogo no primeiro bar que encontra aberto, não há fuga possível a não ser na quebrada existencial de sua origem. É lá que abraçamos com força os nossos rancores, é lá que o moreno, por mais bobagens que tenha feito na vida, ganha colo quente e cafunés sinceros que fazem bem ao juízo.
Sim, o amigo aí, equilibradíssimo, quase sem defeito de fábrica, homem imaculado, pode achar que se trata de um maluco, de um irresponsável, de um cara que rasga dinheiro. Você, leitor mais sensível, pode recomendar uma terapia intensa etc., algo para fazer uns ajustes na cabeça do rapaz. Mas nada substitui esse retorno, como um caubói ferido, ao velho rancho. De que vale Milão e todo o seu luxo, de que vale Ferrari, modelos ou o futuro, se o cara está com os olhos embaçados pela fuligem ácida de existência troncha?
Como no poema de Manuel Bandeira, "que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte? - O que eu vejo é o beco".

Ilha da fantasia
Os cartolas do Sport conseguiram o que parecia impossível: esvaziar a Ilha do Retiro e quebrar a magia de Lost, principal trunfo da equipe. Ê ganância sem fim. O preço dos bilhetes na Libertadores afugentou a turma do "cazá, cazá, cazá" do estádio. Com o Palmeiras, o Leão contou com menos de 20 mil fãs na galera. Um fiasco que amarrou as pernas dos rubro-negros em campo. Ou joga com o bafo dos 35 mil no cangote dos adversários, como na final da Copa do Brasil com o Corinthians, ou não vai longe nas Américas.
Óbvio que o time do Luxemburgo foi melhor, mas enfrentou uma Ilha meia-boca, não o velho caldeirão do diabo em vermelho e preto. E que festa fizeram os secadores do Náutico e do Santa. Parecia a saída do bloco "Eu acho é pouco" ou do "Homem da Meia Noite" no Carnaval em Olinda. A gozação de alvirrubros e tricolores ontem em firmas e botequins do Recife era sinistra: "Que leão que nada, o Sport não passa de cadela de peruca".

xico.folha@uol.com.br


Texto Anterior: Ação: Extremos e contemporâneos
Próximo Texto: Corinthians adota lei do silêncio e faz mistério
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.