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JOSÉ ROBERTO TORERO
O que mais mudou no nosso futebol?
Os juízes? Eles continuam iguais, só que hoje em dia com suas camisas
muito mais coloridas
UM TORCEDOR-ECONOMISTA
poderia dizer que o que mais
mudou em nosso futebol é
que agora somos ultra-exportadores. Qualquer um que jogue uma bolinha mais ou menos consegue ir para o exterior, mesmo que seja para a
Coréia, o Oriente Médio ou as terceiras divisões européias.
Já um otimista poderia dizer que o
que mais mudou são os estádios, que
lentamente vêm sendo reformados
e melhorados. Mas esta evolução
ainda é pequena, tímida. Os estádios
brasileiros realmente mudaram,
mas pouco, muito pouco.
Alguém poderia dizer que o que
mais mudou foram os dirigentes.
Mas este alguém teria que ser surdo
para não escutar as notícias e cego
para não ler os balancetes de seu clube. Os juízes? Continuam iguais, só
que com camisas mais coloridas.
Acho que o que mais mudou no futebol brasileiro não são as arquibancadas nem o jogo que se vê das arquibancadas. O que mais mudou no futebol brasileiro foi quem se senta
nas arquibancadas. Aquele torcedor
sem dentes, mas sorridente, que
aparecia no Canal 100 quase não
existe mais. Nem nas arquibancadas, nem nas ruas. O brasileiro perdeu sua ingenuidade, o que é bom,
mas perdeu sua alegria, o que é mau.
Assim como os trabalhadores, as
torcidas se organizaram fortemente
na década de 80. Mas, do mesmo jeito que o sindicalismo virou assunto
para historiadores (sim, há exceções
aqui e ali), as torcidas organizadas
tornaram-se caso de polícia (claro,
aqui também há exceções).
A esperada organização das classes populares não ocorreu no sindicalismo, nas comunidades eclesiais
de base ou na política, mas nos presídios. Por outro lado, as torcidas organizadas, que, sonhava-se, poderiam expulsar dirigentes corruptos e
reformular o futebol, foram compradas ou domesticadas. Não tomaram o poder nos clubes, assim como
o sindicalismo não expulsou os corruptos de Brasília. Pelo contrário.
O que era popular e espontâneo,
como o torcedor comum, está sumindo. Muitos elogiaram os públicos das finais fluminense e paulista,
com cerca de 60 mil pessoas cada
uma. Mas, em outros tempos, Maracanã e Morumbi teriam quase o dobro deste número. E isso não significa apenas que o brasileiro sumiu dos
estádios, mas que ele está menos
alegre, menos participativo, menos
feliz. Trocamos os carnavais de rua
por micaretas; os estádios, pela TV.
Em Santos, no domingo, quem
quisesse comemorar na praça Independência teria que passar por bloqueios policiais. O pior é que ninguém, inclusive eu, pensou que
aquilo fosse uma repressão exagerada. Quem estava lá achava isso necessário e normal, ainda mais depois
das comemorações do Brasileiro de
2004, quando houve até um assassinato a pontapés na praça.
Certa vez, um professor de jornalismo me disse que ninguém dava
bola para o jornalismo policial, mas
que ele era importante porque tornava mais claro o estado da sociedade brasileira, coisa que as editorias
de política e economia demoravam a
ver. Na época, achei um exagero.
Hoje, penso que ele estava certo. E
penso que pela editoria de Esporte
também se pode fazer um diagnóstico do país. Um diagnóstico que mostra que o que mais mudou no futebol
brasileiro foi o brasileiro.
torero@uol.com.br
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