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"Quero ser bom exemplo", diz novato
Sensação na F-1, inglês Lewis Hamilton diz que ainda não se acostumou, mas adora o novo mundo em que agora vive
De jeito tímido e cara de menino, piloto da McLaren, cujo passatempo predileto é jogar PlayStation3, não se acha parecido com Robinho
Kerim Okten/Efe
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Lewis Hamilton acompanha sessão de treino em Montréal
DA ENVIADA A MONTRÉAL
Negro, de família pobre, Lewis Hamilton seguiu uma trajetória comum à de tantos esportistas de um país que ainda não
visitou, mas com o qual tem
uma relação especial, o Brasil.
"Ainda não fui ao seu país,
mas sei da situação dos brasileiros e há muitas crianças lá
com as quais posso facilmente
me identificar", falou à Folha.
"As coisas ainda estão só no
começo para mim, não sei bem
o efeito que posso causar na cabeça das pessoas, é tudo tão
fantástico... Mas espero que eu
possa servir como um bom
exemplo para essas crianças e
que tome as atitudes certas."
Apesar de se identificar com
os brasileiros, Hamilton disse
que ainda não sabe porque ganhou o apelido de Robinho no
país. "O Felipe [Massa] me disse, mas não sei de onde saiu isso. Nem sabia que era conhecido no Brasil, isso me deixa bastante surpreso. É bom saber
que sou admirado em outros
lugares, como aqui no Canadá.
Jamais imaginei que soubessem quem eu sou", disse.
A alcunha surgiu em 2006,
quando Hamilton disputava a
GP2, campeonato de acesso da
F-1, e foi campeão. A idéia, claro, veio dos pilotos brasileiros.
"O Robinho é um cara descolado, mas eu ainda perguntei
para o Felipe se eu me pareço
com ele. Eu não pareço, pareço?", questionou, para gargalhada dos ingleses na sala.
Educado, de fala mansa e jeito de menino, com boné laranja, Hamilton aos poucos vai se
soltando na entrevista, que ganha um tom quase de conversa.
Sentado em um canto da sala,
longe dos olhares dos assessores de imprensa da McLaren,
ele diz que ainda está se acostumando com o assédio.
"Por enquanto estou lidando
bem com tudo isso. Acho que o
grande segredo da carreira é
conseguir gerenciar tudo isso e
ainda conseguir um bom desempenho na pista", disse, com
uma maturidade pouco comum entre pilotos estreantes.
"O bom seria se eu pudesse
só correr e não ter que lidar
com tudo isso", completou o
piloto de 22 anos. "Tenho mais
ou menos conseguido fazer isso ultimamente, mas as coisas
estão ficando piores. Só disputei cinco corridas e sei que a
tendência é piorar", falou.
Líder do Mundial ao lado de
Alonso graças aos cinco pódios
conquistados nas cinco corridas que disputou, Hamilton
não só é a grande revelação do
ano na F-1 como também no
esporte. Primeiro negro a chegar à categoria, tem demonstrado arrojo nas pistas.
Mas seu desempenho acabou
gerando um frenesi na imprensa inglesa, desesperada atrás de
um piloto que faça jus à tradição automobilística do país. A
agitação é tamanha que ao voltar para a Inglaterra após as
três primeiras provas do ano,
Hamilton ficou chocado com a
quantidade de fotógrafos
acampados à sua espera.
"Ultimamente tem ficado
mais difícil sair de casa. É bom
quando ando de bicicleta, que
coloco uns óculos enormes e
um capacete e ninguém me reconhece", brincou ele, que resolveu se arriscar nos trens
londrinos na semana passada.
"Fui até o escritório do meu
pai e foi bem tranqüilo, mas a
verdade é que odeio andar de
trem, independentemente de
qualquer coisa", falou ele, que
vive na pequena cidade de Tewin, em Hertfordshire, a cerca
de 40 km da capital inglesa.
"Além de ir devagar, no trem
eu não estou no comando!
Sempre que tenho que ir a Londres, prefiro ir dirigindo, mesmo que fique preso no trânsito.
Meu pai é o oposto. Então às
vezes vamos separados."
A família, aliás, é algo que o
jovem piloto dá muito valor.
Seu avô, Davidson, deixou Granada quando era jovem para
tentar a sorte na Inglaterra.
Seu filho, Anthony, pai de
Lewis, seguiu seus passos desde cedo e começou a trabalhar
nas ferrovias inglesas. Como
não tinha dinheiro para bancar
o sonho de Lewis, ele se revezava entre três empregos. Hoje,
de volta à terra natal, o avô de
Hamilton dirige um ônibus escolar. Anthony, que agora tem
uma empresa de tecnologia,
acompanha o filho nos paddocks ao redor do mundo.
E, quando não está viajando,
recebe com prazer o filho na
casa em que mora com a madrasta de Lewis, Linda, e seu
meio-irmão, Nicholas, 15, que
sofre de paralisia cerebral.
"Eu tenho um Mercedes GL,
que é quase uma van. Eu até
poderia escolher um modelo
mais esportivo, mas meu GL é
útil porque sempre que vou para a casa dos meus pais parece
que eu estou de mudança", disse Hamilton, às gargalhadas.
"Encho o porta-malas com
um monte de roupas sujas para
lavar lá, coloco uma mala com
as que eu vou usar no final de
semana e meu PlayStation3."
Este último, inclusive, tem
sido a principal diversão do inglês nas noites de sábado. Ao
lado do irmão, gasta horas na
frente do videogame. Só tem
uma reclamação. Como a versão é a de 2006, ele ainda não
aparece como personagem. A
solução encontrada foi fingir
que é Kimi Raikkonen, piloto
da McLaren até o ano passado.
"Quando corria de GP2 e ia
almoçar no motorhome da
McLaren, eu via o Kimi ter seu
próprio escritório e pensava
que um dia podia ter o meu
também. Agora eu tenho."
Mas não foi só isso que Hamilton conseguiu após 13 anos
como piloto da McLaren -ele
foi levado ao programa de desenvolvimento do time após
vencer seletiva de kart. O sucesso, diz, o priva de algumas
coisas, mas tem seu lado bom.
"A parte legal de tudo isso é
que eu posso conhecer gente
interessante. Pessoas que eu
jamais teria a oportunidade se
não fosse um piloto de F-1 e
não estivesse aqui, agora", falou, antes de citar os exemplos.
"Conheci o Stirling Moss, o
Jackie Stewart..." Com um sorriso um pouco tímido, revelou,
porém, quem foi a pessoa que
mais gostou de encontrar.
"Eu conheci a Beyoncé outro
dia. Nossa, ela é maravilhosa.
Claro que é legal conhecer o Jakie Stewart, mas encontrar
com ela foi demais", afirmou.
Empolgado, deu detalhes.
"Ela me convidou para assistir
a um show no sábado passado,
em Wembley. Fui, sentei-me
no meio das pessoas, mas não
tive problema. Talvez tenha sido porque estava com o namorado da minha prima, um nigeriano gigante. Devem ter achado que era meu segurança!"
(TATIANA CUNHA)
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