São Paulo, sábado, 10 de julho de 2010

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Unidos pela fúria

Campanha "sem precedentes" da Espanha conquista catalães , antes céticos em relação à seleção

ROBERTO DIAS
EM BARCELONA

O cruzamento do catalão Xavi para a cabeçada certeira do também catalão Puyol levou a Espanha para a final da Copa e a Catalunha a uma crise de identidade.
A região passou séculos lutando por sua independência e décadas tentando reafirmar seu nacionalismo, de diferentes maneiras: pela língua, pelo governo e, também, pelo futebol.
Pois agora vê a Fúria triunfar tendo como base um dos maiores símbolos desse nacionalismo, o Barcelona, clube de 7 dos 11 titulares escalados contra a Alemanha. Daí o apelido "Barçanhola".
Talvez por isso, desde o final de semana apareceram várias bandeiras e camisas espanholas por Barcelona, assim como os rojões começaram a pipocar pela cidade.
"É a primeira vez que vou com a Espanha. Antes o time fazia papel ridículo", diz o barcelonês Jaime Adelantado, 44, que recorre ao argumento mais usado nos últimos dias pelos catalães que decidiram apoiar a seleção: "Gosto do estilo de jogo, há muitos jogadores do Barça".
O sucesso espanhol vem num momento em que a Catalunha acaba de ser duramente ferida em seu nacionalismo. Na semana passada, o Tribunal Constitucional, órgão máximo do Judiciário espanhol, derrubou boa parte do Estatuto da Catalunha, a Constituição que o governo local tentava validar havia quatro anos.
Por causa disso, foi convocada para hoje, véspera da final, uma grande manifestação contrária à sentença. Mas já se discute que efeito essa onda vermelha poderá ter sobre o movimento.
"Tem gente que, quando joga a Espanha, salta a veia espanhola", diz o catalão Juan Carlos Sánchez, 60, ele próprio indiferente à seleção.
Os que tiverem "saltada" a veia espanhola poderão amanhã, enfim, ver um jogo do time de Del Bosque em telão público, decisão anunciada anteontem pelo prefeito de Barcelona, Jordi Hereu (é uma campanha "sem precedentes", ele justificou).
O telão havia sido pedido, aos gritos, pelos torcedores que festejaram a vitória sobre a Alemanha. Mais de 4.000 pessoas comemoravam nas ruas, um público ainda muito menor, porém, do que o dos títulos do Barcelona.
Na mídia catalã, são marginais, nesta Copa, os rodeios a que se recorria em outros anos para evitar dizer "a seleção" quando se referia à Espanha -fórmulas como "a seleção estatal" ou "o combinado do Estado espanhol".
Do lado dos catalães que continuam contrários à seleção (não há pesquisas que tenham medido quantos são), encontram-se argumentos no próprio Barça para sua atitude: dizem que quanto mais os jogadores descansarem, melhor para o clube.
Mas há explicações que vão bem além disso. "Meu país não está no Mundial", diz Marc Segura, 33. "Ainda que os 11 jogadores fossem catalães, estão representando outra bandeira. Dizer que o futebol está à margem da política é tolice", protesta.


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