São Paulo, Domingo, 10 de Outubro de 1999
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TOSTÃO

Evolução

Nota-se, neste Campeonato Brasileiro, que os técnicos evoluíram muito na parte tática em relação aos últimos anos e criaram variações na maneira de jogar de suas equipes.
O principal motivo dessa evolução foi a vitória passar a valer três pontos.
Entre outras razões, há a aceitação, pelos técnicos, das críticas de vários comentaristas esportivos de que há alguns anos todos os times jogam em um só padrão.
O técnico do Cruzeiro, Levir Culpi, tem alternado a escalação de sua equipe dependendo do momento e usado dois ou três zagueiros, três ou quatro meio-campistas, dois ou três atacantes.
Nas últimas partidas, o treinador colocou três zagueiros e jogadores de meio-campo no lugar dos laterais, para a função de alas, o que é mais correto.
O Vasco já atuou com três atacantes e, com a volta do Felipe, jogou muito bem duas partidas com apenas um volante. Depois, atuou mal contra o São Paulo e, no último jogo, contra o Flamengo, voltou a seu padrão antigo, com dois marcadores no meio-campo. Antônio Lopes não é mais um técnico de um só esquema, como dizíamos.
O treinador do São Paulo, Paulo César Carpegiani, foi muito criticado por mudar excessivamente seu padrão tático, mas está mostrando, até o momento, pela boa posição de sua equipe na tabela, que continua no caminho certo.
O Atlético-PR, dirigido por Vadão, tradicional adepto do sistema tático com três zagueiros e dois alas, tem variado, jogando dessa maneira e com o 4-4-2, com sucesso.
O Corinthians, desde o ano passado com Wanderley Luxemburgo, joga com dois volantes (Rincón e Vampeta), que defendem e apóiam com eficiência -o que era ""proibido" no futebol brasileiro. A equipe foi campeã no ano passado e é líder neste ano. O atual técnico do time, Oswaldo de Oliveira, no lugar de colocar um marcador (Gilmar), para substituir Rincón ou Vampeta, como se esperava, preferiu o jovem e promissor Edu.
Luiz Felipe Scolari tem usado com frequência três atacantes no Palmeiras, escalando um, vindo de trás, e mais dois (como a seleção brasileira), ou dois atacantes pelos flancos e o terceiro pelo meio.
O Flamengo, dirigido por Carlinhos, que raramente muda seu esquema tático, entrou na onda e jogou com três atacantes na quarta-feira, quando goleou o Universidad do Chile, por 7 a 0. Será que o técnico vai ter a mesma ousadia, hoje, contra o Botafogo-RJ?
O Atlético-MG, comandado por Dario Pereyra, embora timidamente, tem tentado mudar a escalação do time, jogando com dois ou três volantes.
As mesmas mudanças estão acontecendo em todo o futebol mundial. A Argentina saiu do tradicional esquema 4-4-2 e desde a Copa de 98 está jogando à moda européia, com três zagueiros e dois alas. A Holanda, há muito tempo, joga com os dois pontas tradicionais e um centroavante.
Penso que ainda falta aos times brasileiros e estrangeiros a adoção, com mais frequência, da marcação por pressão no campo adversário, como fez a seleção brasileira no segundo jogo contra a Argentina, em Porto Alegre. Escrevi esta coluna antes da partida de ontem, contra a Holanda.
Esses são apenas alguns exemplos. Houve uma evolução muito grande -que cobrávamos há muito tempo- na maneira de jogar.
O padrão vitorioso da Copa do Mundo de 94, muito utilizado em todo o mundo, principalmente no Brasil, com dois zagueiros pelo meio, dois laterais apoiando, dois armadores defensivos e dois ofensivos (um de cada lado) mais dois atacantes, continua sendo eficiente e uma boa referência, mas não é mais "o pensamento único" dos treinadores.
O mais importante é que acabou a mesmice dos últimos anos. Aumentou o número de gols e melhorou a qualidade das equipes. Viva a diferença e a criatividade.

Aparências

No futebol e em toda a sociedade, muitos parecem, mas não são. Na verdade, a maioria dos homens coloca uma máscara para viver, já que a total liberdade de expressão e a realização de todos os desejos são incompatíveis com a cultura.
Existem jogadores habilidosos que parecem craques, mas não são; atletas que falam muito em Deus e em respeito ao próximo, mas no campo são os mais desleais; técnicos que adoram, no discurso, o futebol ofensivo e sem violência, mas colocam seus times na defesa e mandam parar uma jogada de qualquer maneira; comentaristas que estão sempre justificando e corrigindo suas opiniões quando os fatos os desmentem; dirigentes que se dizem apaixonados por seus clubes, mas estão sempre os prejudicando com suas atitudes; pessoas que criticam a falta de ética de políticos, mas frequentemente se comportam da mesma maneira; governantes que dizem ser social-democratas, mas sempre protegem os ricos, fascinados pela economia de mercado.
Enfim, uns mais, outros menos, somos todos dissimulados, tentando parecer o que não somos. "Dentro de nós, há uma coisa que não tem nome, essa coisa é que somos." (Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago.)


Tostão escreve aos domingos e às quartas-feiras

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