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FUTEBOL
Complexo de Ringo Starr
JOSÉ ROBERTO TORERO
COLUNISTA DA FOLHA
Entre as várias definições
para os Beatles, a de que mais
gosto é a que diz ""foi um quarteto
formado por três gênios e o homem mais sortudo do mundo".
Neste caso, o afortunado seria Richard Starkey, ou Ringo Starr.
Sem ser bonito, genial ou charmoso, acabou por se transformar,
às vésperas do estouro de ""Love
Me Do", em 1962, no quarto integrante do grupo. Entrou no lugar
de Pete Best, hoje funcionário público e conhecido como ""o homem
mais azarado do mundo".
Ringo era prodigiosamente narigudo e não tinha boa voz embora seu timbre anasalado casasse
bem com canções do tipo ""Yellow
Submarine". Também era baixo,
vestia-se de modo pouco elegante
e nunca o consideraram grande
baterista. Mas foi ficando..., ficando..., e, de LP em LP, chegou até o
último do grupo, em 1970, deixando seu nome no panteão da
música popular do século 20.
Estamos cansados de ouvir histórias de gente talentosa que não
chega aonde merecia. Toda cidade, todo bairro, toda família tem
um caso. Já o contrário é raro como uma pérola negra ou um político honesto. É o caso do sujeito
abençoado pelos deuses, do cara
que, a despeito das próprias limitações e do mau jeito, aparece na
hora certa, no lugar certo e vai
longe. São os ringos da vida.
O futebol também tem seus ringos, jogadores apenas esforçados,
mas que, com uma pequena ajuda da sorte e cercados de craques,
acabaram participando das grandes conquistas, aparecendo nas
grandes fotos da história.
Quem nunca ouviu falar do poderoso Cruzeiro de Piazza, Zé
Carlos, Tostão, Dirceu Lopes,
Raul e Natal. Pois nesse mesmo
Cruzeiro jogava Pedro Paulo, um
zagueirão que, não fosse pela ilustre companhia, poderia perfeitamente ter seguido carreira num
Valeriodoce da vida. Mas ele tinha sorte e estava lá.
Qualquer palmeirense que tenha visto jogar o time da segunda
academia, lembra, com saudades,
de Leão, Luís Pereira, Dudu, Ademir da Guia, Leivinha e César. Já
do bom marcador Zeca, ele não
irá guardar lembranças tão fascinantes. Era aplicado, não comprometia, mas se não tivesse
aqueles companheiros, certamente sua carreira teria sido mais
obscura. E o Internacional, de
Rubens Minelli, bicampeão brasileiro? Ali fizeram história Manga,
Marinho Peres, Figueroa, Batista,
Falcão, Jair, Valdomiro e até o
lendário Dadá Maravilha. Mas
ali também jogaram o apenas regular Caçapava e o discreto Vacaria.
Pensem no time do Flamengo,
campeão mundial contra o Liverpool, que jogava com um meio-campo refinadíssimo: Andrade,
Adílio e Zico. Isso sem falar em
Raul, de novo, Júnior e Leandro.
Pois na foto também aparece o viril Rondinelli, que realmente resolvia os problemas da zaga, mas
ficava a dever alguma coisa para
seus companheiros.
E o que dizer da equipe do São
Paulo, bicampeã mundial contra
Milan e Barcelona sob o comando
do inesquecível Telê Santana?
Aquela seleção tricolor tinha Zetti, Cafu, Leonardo, Toninho Cerezo, Raí e Muller. Mas, por outro
lado, havia também lugar para
Ronaldo Luís, Dinho e Pintado.
E lembro-me ainda de Célio Silva, Márcio Santos, Tonhão, Elivélton, Nasa e tantos outros cuja
sorte, em alguns momentos da
carreira, foi inversamente proporcional à técnica.
A própria seleção brasileira tem
lá os seus ringos. No maravilhoso
time de 1970, por exemplo, referência enciclopédica do melhor
futebol, em meio a clodoaldos, pelés, tostões, gérsons e rivelinos, havia o imprevisível Félix, o bom rebatedor Brito e o apenas esforçado Everaldo.
Para os ringos, é como diz a música ""With a Little Help from My
Friends", aquela que foi tema da
série ""Anos Incríveis":
I get by with a little help from
my friends,
I get high with a little help from
my friends,
I'm going to try with a little help
from my friends.
O que, traduzindo assim, assim,
dá em:
Eu vou levando com uma ajudinha dos meus amigos,
Eu vou bem alto com uma ajudinha dos meus amigos,
Eu vou tentar com uma ajudinha dos meus amigos.
E-mail torero@uol.com.br
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