São Paulo, domingo, 10 de novembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FUTEBOL

Código do torcedor de pijama

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

A rejeição pelo Congresso da medida provisória de "moralização do futebol" foi ótima, porque evitou que a bancada da bola aprovasse o desfigurado texto de seu relator, o deputado Ronaldo Cezar Coelho. Nesta nova versão, a CBF e as federações não teriam a mesma responsabilidade dos clubes, o que é incompreensível. O governo atual vai propor um novo projeto que será votado no próximo ano.
No lugar da medida provisória, o novo governo vai editar o Estatuto do Desporto. Em vez do futebol, a ênfase será na política esportiva social e na educação das crianças, o que é correto. Mas o projeto não pode deixar de lado as ações moralizadoras do futebol contidas na medida provisória.
Além desses projetos que vão mudar o esporte, será votado brevemente o Código de Defesa do Torcedor. Se aprovado e cumprido, será um grande avanço.
Mas não somente os torcedores de campo merecem ser bem tratados. Há também os de pijama, que, por preguiça, opção racional (é hoje um grande risco ir aos estádios) e/ou falta de dinheiro, preferem o conforto e a intimidade de sua casa. Eles necessitam também de um código para defender os seus direitos.
Algumas sugestões:
a) todo torcedor de pijama tem o direito de escolher a televisão (fechada ou aberta) para assistir aos jogos da seleção brasileira. O fim do monopólio televisivo não consta na medida provisória;
b) todo torcedor de pijama que comprou o pay-per-view tem o direito de assistir a todas as partidas, conforme prometido na venda do pacote. Nas últimas semanas, não foram transmitidos para Belo Horizonte os jogos entre Atlético-PR e Paysandu e entre Figueirense e São Caetano;
c) todo torcedor de pijama que não comprou o pay-per-view tem o direito de assistir também aos jogos de outras equipes que não sejam as grandes do Rio e São Paulo. As televisões são essenciais e ajudam a promover e financiar o futebol, mas deveriam ser chamadas para participar depois que os regulamentos, os calendários e as tabelas estivessem prontos;
d) todo torcedor de pijama e os da arquibancada tem o direito de assistir aos jogos noturnos às 20h30. Assim, eles vão dormir melhor, trabalhar com mais alegria e produzir mais. Estou até parecendo comentarista de economia;
e) todo torcedor de pijama tem o direito de questionar os narradores e comentaristas e formar a sua opinião. Para isso, deveriam procurar entender melhor o futebol, e não apenas torcer;
f) todo torcedor de pijama tem o direito de ser bem informado e de escutar comentários independentes, imparciais e sem conotação comercial. O esporte, além de ser atualmente um entretenimento e um negócio, é um importante acontecimento jornalístico; e
g) todo torcedor de pijama tem o direito de ter uma renda mínima reservada para pipoca, refrigerante e cerveja no domingo, com moderação.

Comemoração do gol
A moda no futebol brasileiro é não festejar gols contra ex-equipes do coração. Sempre foi o contrário. Por orgulho, para mostrar que é melhor do que achavam e/ ou porque se sentia injustiçado, o jogador vibrava ainda mais.
Um atleta, por causa do sincero carinho e respeito que tinha pelo ex-clube, não quis comemorar um gol, e a moda pegou. Os atletas adoram repetir comportamentos, frases e palavras. A palavra da moda era pegada. Agora é atitude.
Outro motivo dos jogadores não desejarem comemorar um gol contra o ex-time do coração é que eles querem demonstrar que são humanos, solidários e que não jogam só por dinheiro.
A vibração no momento de um gol não diminui a admiração que um jogador sente pelo ex-time. Além disso, a alegria e o orgulho no momento de um gol é uma emoção muito mais forte do que qualquer outro sentimento que se tem pelo time anterior. Somos muito mais egoístas e orgulhosos do que imagina e racionaliza a nossa consciência.
Antes de uma partida, o jogador não deveria declarar que não vai comemorar ou que não gostaria de fazer um gol contra o ex-time. Isso desperta no imaginário do torcedor a certeza de que ele quis chutar a bola para fora. Os psicólogos de plantão dirão ainda que o jogador foi traído pelo inconsciente. No mínimo, o aumento da responsabilidade após as declarações perturbará o jogador.
Por mais amor, respeito e gratidão que um atleta tem pelo ex-time, ele deveria festejar o gol, como se fosse o último de sua vida.
E-mail tostao.folha@uol.com.br

Texto Anterior: Pingue-pongue: Após resvalar em recorde, nadador pensa em 2003
Próximo Texto: 20 anos de patrocício
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.