São Paulo, sexta-feira, 11 de fevereiro de 2005

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Seleção esvazia o guaraná e enche a bola da cerveja

Originalmente assinado para promover refrigerante, contrato CBF-AmBev usa imagem do time para vender bebidas alcoólicas em amistosos como o de Hong Kong

PAULO COBOS
ENVIADO ESPECIAL A HONG KONG

No início, era estratégia para ajudar a vender guaraná. Hoje, a seleção brasileira está a serviço da AmBev para faturar com amistosos e promover cerveja.
No amistoso que tem direito por contrato a explorar a cada ano, a gigante de bebidas esqueceu o produto não-alcóolico que é, afinal, o que a empresa escolheu para estampar as camisas de treino e painéis publicitários do time.
Em seu lugar, muita cerveja, agrado a parceiros e cotas milionárias. O ápice dessa estratégia aconteceu anteontem, na goleada de 7 a 1 sobre Hong Kong na Ásia.
A AmBev recebeu US$ 1 milhão (R$ 2,6 milhões) da Carlsberg, cervejaria dinamarquesa que representa na América Latina.
O jogo foi uma "festa etílica" usando a imagem da seleção, ou bem diferente do início da associação da empresa com a CBF -o contrato foi assinado em 2001.
Em 2002, primeira temporada em que pôde fazer o amistoso, a AmBev levou a seleção a Portugal em um ambicioso projeto de aumentar a participação do guaraná Antarctica no mercado europeu.
De lá para cá, a estratégia mudou. A cerveja passou a aparecer ao lado do refrigerante como apoiadora do time -em placas na Granja Comary, por exemplo.
No segundo ano da parceria, a AmBev fez um jogo no México e levou parceiros no ramo de cerveja na América Central. Em 2004, escolheu a seleção da Catalunha, que nem é reconhecida pela Fifa.
Em janeiro do ano passado, um anúncio publicitário com os dizeres "A seleção brasileira é Brahma" causou mal-estar entre a CBF e a empresa. O fato fez a confederação dizer que só se sentia identificada com o guaraná Antarctica".
Em Hong Kong, a AmBev colocou mais uma vez a serviço da cerveja o canal publicitário que escolheu para promover guaraná. Tudo girou em torno de marcas da bebida alcoólica em Hong Kong.
A AmBev tinha o direito de explorar as placas publicitárias em um lado do gramado. Poderia tê-las colocado à venda ou utilizá-las para promover seu guaraná, mas preferiu ostentar uma das suas marcas de cerveja, a Brahma. Fez o mesmo no espaço a que teve direito no banner que estava atrás da mesa onde Carlos Alberto Parreira deu uma entrevista coletiva.
Promotora do jogo, a parceira Carlsberg estava por todos os cantos do estádio, a começar das placas à beira do campo.
Na sela de entrevista, mais exemplos da associação de cerveja com a seleção. Parreira falou com nove garrafas de Carlsberg à sua frente. Nessas ocasiões, costuma-se colocar garrafas de água ou do hoje esquecido guaraná.
Ronaldinho, principal astro do time na excursão, também teve sua imagem ligada ao álcool. Ao final do jogo, depois que o Brasil ganhou a "Carlsberg Cup", ele recebeu uma garrafa gigante com o logotipo da empresa e foi filmado pelas câmaras. "Era para comemorar o Ano Novo chinês", disse.
Em alguns jogos das eliminatórias, membros da seleção não deram entrevistas nos estádios por serem obrigados a fazê-lo diante de painéis publicitários de concorrentes de produtos da AmBev.
Criticada por muitos, a associação entre esporte e cerveja pode ser deseducativa, mas não é ilegal, ao menos no Brasil. A lei que restringe a propaganda de bebidas alcóolicas só considera sujeitas às suas regras aquelas cujo teor alcoólico supere 13 graus. Nenhuma das maiores marcas de cerveja do país alcança a metade disso.
Já o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária proíbe propaganda de cerveja em uniformes de modalidades olímpicas e diz que campanhas devem ser voltadas para adultos.
Na América Latina, a restrição à exposição de logomarcas de cerveja em uniformes é quase exclusividade brasileira. Seleções e clubes do continente são patrocinados por fabricantes da bebida. Na Europa, sem que apareçam em uniformes, a Carlsberg apóia a Inglaterra, e a Sagres, Portugal.


Com a Reportagem Local

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