São Paulo, domingo, 11 de março de 2007

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Caribe abriga a Copa de um mundo

Criadora do críquete, Inglaterra encara ex-colônias e tenta levantar primeira taça no esporte quase incógnito no Brasil

Cerca de 2,2 bilhões verão pela TV as ações do jogo cujo auge em solo brasileiro foi o lúdico taco disputado por crianças nas ruas do país


Andy Clark/Reuters
O paquistanês Mohammad Yousuf rebate antes que o sul-africano Mark Boucher alcance a bola durante amistoso disputado anteontem em Trinidad e Tobago


ALEC DUARTE
DA REPORTAGEM LOCAL

A partida começa de manhã, pára no almoço e no chá das cinco e pode durar até quatro dias. Nações como Índia, Paquistão e Sri Lanka, excluídas da elite em quase tudo, dão as cartas e são rivais respeitados. O Caribe é uma seleção multinacional formada por ex-colônias britânicas. E a Inglaterra, a inventora, nunca foi campeã.
Para onde se olha, o críquete é repleto de novidades.
O jogo mobiliza fãs e dinheiro, fabrica heróis e vilões. Profissional, o esporte cujo auge no Brasil foi o taco, recreação lúdica de rua, é coisa séria.
A partir de hoje, mais de 100 mil torcedores vão viajar entre sete países do Caribe (mais a sul-americana Guiana) para acompanhar a nona Copa do Mundo de uma modalidade essencialmente britânica hoje globalizada e praticada em 98 países. Inclusive, acredite, aqui.
Pela TV, cerca de 2,2 bilhões assistirão à maratona de 54 dias e 67 jogos em 12 estádios. O investimento total do Caribe (campeão dos dois primeiros Mundiais, em 1975 e 1979) ultrapassou os US$ 400 milhões.
A região é, no críquete, um consórcio bem-sucedido de 12 países. Fora dele, são nações díspares economicamente. Em comum, a Inglaterra, que administrou boa parte delas.
Barbados, terra da final da Copa em 28 de abril, ocupa a 31ª posição no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), ranking criado pela ONU para quantificar a evolução econômica do planeta. A Jamaica, que hoje vê a cerimônia de abertura, é a 104ª da relação, que tem o Brasil no 69º posto.
A existência de castas é inerente ao críquete. O conselho internacional (ICC, entidade que controla o jogo) confere status diferentes a seus filiados.
Só dez deles, por exemplo, podem disputar test-matches, versão nobre cujos confrontos duram até quatro dias. Os outros jogam no formato ODI ("one-day international"), disputado numa única jornada, formato adotado na Copa.
Os confrontos começarão às 9h e vão parar por 45 minutos para o almoço. Nesse período, os atletas comem frutas e barras de cereais. As ações voltam às 13h45 e têm como limite o pôr-do-sol -e nisso o Caribe é pródigo, com dias mais longos nesta época do ano.
Formado por Inglaterra, Austrália, África do Sul, Caribe, Nova Zelândia, Índia, Paquistão, Sri Lanka, Zimbábue e Bangladesh, o clube da elite só cresce se o ICC decretar. Todos têm cadeira cativa nos Mundiais. Afinal, as eliminatórias são coisa para a plebe.
Esportivamente, a elite tem nível técnico inquestionável, e o equilíbrio técnico é uma marca clara da modalidade. Dos 16 participantes no Mundial, pelo menos metade luta pela taça.
Tricampeã, a Austrália começou o ano como favorita absoluta. Bateu a Inglaterra no "The Ashes", clássico entre os países, por 5 jogos a 0.
Semanas depois, perdeu o tradicional Tri Series para os ingleses com derrotas severas. O fiasco se repetiu num confronto regional com a Nova Zelândia. Enquanto isso, a África do Sul -que fazia outros jogos internacionais- tirou os australianos da ponta do ranking, que lideravam desde 2002.
A Copa caribenha também tem os seus coadjuvantes. Como o Quênia, surpreendente semifinalista em 2003.
Fora os africanos, o torneio tem um intruso de verdade. Único time sem conexões inglesas, a Holanda tenta fortalecer sua tradição quase autóctone. Os introdutores do esporte eram holandeses que tinham estudado no Reino Unido.
Bermudas, Canadá, Escócia e Irlanda completam o grupo de "coitadinhos" da competição.
A fórmula de disputa do torneio contempla todas as torcidas. Como os dois primeiros de cada grupo avançam à segunda fase, todos os clássicos mundiais estão praticamente garantidos. Na etapa, os oito times restantes jogarão num sistema de pontos corridos para definir quem vai às semifinais.
Apesar de fervilharem com o acontecimento, os caribenhos estão estarrecidos com as restrições impostas pelo ICC. Nos estádios, instrumentos musicais e rádios são proibidos. Os preços das bebidas estão pela hora da morte: uma garrafinha de água custa quase US$ 3.
Em todos os países-sedes, ruas foram fechadas e camelôs expulsos de locais que viraram estacionamentos exigidos pelo caderno de encargos da Copa.
Além disso, obras pululam, há estádios que ainda não ficaram prontos e protestos de jogadores incomodados com o péssimo nível dos gramados.
Só nessa hora o mundo do críquete parece um pouco com o Brasil e sua aspiração de organizar o Mundial de uma invenção inglesa bem mais popular.


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