São Paulo, domingo, 11 de abril de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

DOPING

Dick Pound, presidente da Agência Mundial Antidoping, afirma que entidade identificou mais uma droga "secreta"

Wada já antevê novo escândalo mundial

ADALBERTO LEISTER FILHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Na presidência da Wada (Agência Mundial Antidoping), o canadense Dick Pound viu sua entidade crescer em prestígio no ano passado após a divulgação de diversos escândalos de doping. O maior deles aconteceu com a descoberta do THG, um novo esteróide anabólico.
Neste ano, a agência pode flagrar novas estrelas. Entre as apostas da Wada está a descoberta de outro esteróide, droga que aumenta a força muscular. "Um de nossos laboratórios identificou a droga e estuda um método de detecção. Em breve, alguns atletas terão uma surpresa", disse Pound, que pela primeira vez discutiu isso com a imprensa.
Em entrevista à Folha, o dirigente também falou do desafio de criar um teste confiável para o hGH (hormônio de crescimento humano), que é usado na medicina para tratar crianças com problemas de crescimento e tem efeito anabólico. Caso o exame não fique pronto para os Jogos de Atenas, Pound diz que as amostras olímpicas passarão por "recall".

Folha - Atualmente o doping é o maior problema do esporte?
Dick Pound -
Não é o maior, mas é um problema importante.

Folha - Quais as estratégias da Wada para combatê-lo?
Pound -
O Código Mundial Antidoping é um passo importante. Nossa prioridade, neste ano, é que sua implementação seja feita com consistência.

Folha - Há outros desafios?
Pound -
As outras prioridades são a pesquisa e a conscientização sobre os perigos do doping. Naturalmente, os escândalos chamam mais atenção. Mas trabalhamos para que a próxima geração tenha mais consciência do problema. A educação é essencial nessa luta.

Folha - Os testes para o hGH são um dos principais objetivos dos controles. Haverá teste para essa substância em Atenas?
Pound -
Drogas que não eram detectadas serão flagradas neste ano. O hGH é uma delas. Não sei quando o teste ficará pronto, mas você só vai saber quando anunciarmos o primeiro caso positivo. Se não conseguirmos flagrar o hGH a tempo dos Jogos, as amostras da Olimpíada serão guardadas e haverá "recall" logo que houver um método viável.

Folha - Seis meses depois do THG, qual é a sua avaliação sobre esse escândalo de doping?
Pound -
Isso aumentou a consciência sobre o problema nos EUA. Foi também um sinal claro de que aqueles que procuram meios ilícitos serão reprimidos.

Folha - Alguma coisa mudou nos controles depois disso?
Pound -
Sim. Até então, as drogas que auxiliavam o desempenho haviam sido desenvolvidas para fins terapêuticos. Quando um cientista redesenha a molécula de um esteróide, sua única finalidade é melhorar a performance ilegalmente. É diferente do que ocorria no passado, quando se estudavam novas drogas para melhorar a saúde das pessoas.

Folha - Não é difícil controlar esse tipo de fraude no mundo?
Pound -
Os casos serão descobertos. Um de nossos laboratórios credenciados identificou a presença de um novo esteróide, e nós estamos financiando a investigação sobre isso. Os atletas que usarem essa substância poderão ter alguma surpresa quando desenvolvermos um método capaz de detectar a nova droga.

Folha - Qual esporte estaria na mira desse novo teste?
Pound -
Por enquanto não podemos dar mais detalhes.

Folha - Uma polêmica recente aconteceu com a descoberta do doping de Jerome Young, em 1999. Mesmo assim, ele competiu nos Jogos de Sydney-00 e levou o ouro no revezamento 4 x 400 m. O que o senhor acha do caso?
Pound -
É uma pena que a Federação de Atletismo dos EUA tenha escondido por tanto tempo a documentação sobre isso. Foi preciso o Comitê Olímpico dos EUA e o COI terem feito ameaças para que liberassem a papelada.

Folha - O que pode acontecer?
Pound -
A Iaaf [entidade que comanda o atletismo] enviou o caso à Corte de Arbitragem do Esporte. Tenho certeza de que ele será punido. Isso mostrará que ninguém está livre de castigo.

Folha - Qual é a sua opinião sobre os EUA na luta contra as drogas? No passado, por causa de polêmicas como a de Young, o senhor criticou os americanos...
Pound -
Os EUA assumiram uma posição de liderança. O presidente George W. Bush já mostrou preocupação com o uso de esteróides. Essa atitude é um sinal do reconhecimento de que o doping é um problema social, com conseqüências na saúde pública.

Folha - Porém as ligas americanas ainda são permissivas...
Pound -
Mas o Congresso está pressionando a MLB [liga de beisebol] para que adote regras mais consistentes contra o doping. As ligas devem entender que elas não são exceção nessa luta. Suas regras são uma piada.

Folha - Por outro lado, há quem ache pesadas as punições. Qual é a sua opinião?
Pound -
É preciso que haja suspensão rigorosa. A punição não é só repressiva. Ela dá garantia de tratamento igual a todos. Modalidades como natação e remo tinham punições mais severas, mas alteraram as regras para se adaptarem ao novo código.

Folha - Mas alguns esportes, como o ciclismo, ainda mostram resistência à política da Wada. O senhor parece ter problemas com a União Ciclística Internacional...
Pound -
Também critico outros esportes, mas não levarei o ciclismo a sério enquanto ele esconder seus pecados. A UCI é a única federação olímpica que não disse quando adotará o código.

Folha - Muitos dizem que os controles sempre estarão um passo atrás da indústria farmacêutica. O senhor concorda?
Pound -
Os escândalos recentes mostraram que a repressão aumentou. Acho que a criação a Wada, em 1999, foi importante. Isso aumentou os controles e promoveu a coordenação efetiva na luta contra o doping. Quero ter certeza de que quem tentar alguma fraude será descoberto.


Texto Anterior: O que ver na TV
Próximo Texto: O que é, o que é?: Agência que luta contra o doping foi criada em 99
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.