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Filhos da guerra
Angola, Irã e Sérvia e Montenegro, que estréiam hoje, tiveram sua preparação para o Mundial afetada por tensão geopolítica e recentes confrontos armados
PAULO COBOS
ENVIADO ESPECIAL A KÖNIGSTEIN
A lógica da bola diz que eles
não devem ir longe na guerra
pelo título da Copa da Alemanha. Mas hoje, quando entrarem em campo pela primeira
vez, três seleções vão proporcionar um alívio para três países em que a palavra guerra não
tem nada de esportiva.
Mandou o calendário do
Mundial que Angola, Irã e Sérvia e Montenegro abrissem
suas participações no mesmo
dia -a Costa do Marfim, outro
país em guerra civil, estrearia
ontem contra a Argentina. Os
africanos e europeus são sobreviventes de sangrentas e recentes batalhas.
Os iranianos se dizem prontos para enfrentar quem ouse
impedir seu ambicioso programa nuclear. E, para os três, o
ambiente de enfrentamento influi na Copa do Mundo.
A começar por histórias pessoais de refugiados de guerra
que acabaram no futebol justamente por esse motivo.
A guerra civil que atravessou
três décadas em Angola, que
enfrenta hoje sua ex-metrópole
Portugal, causou a migração de
milhões de pessoas. Por causa
disso, gente que morava no interior foi para a capital Luanda
e teve a chance de jogar futebol,
afinal só lá havia condições para a organização de torneios.
Tal fluxo migratório deu à seleção angolana seu maior ídolo.
O atacante Mantorras, 24, foi
descoberto na periferia de
Luanda. Era um filho de miseráveis refugiados do interior,
fugidos das minas terrestres
que transformam o país em um
verdadeiro campo minado, o
que dura até hoje.
A desintegração da antiga Iugoslávia, que gerou uma série
de guerras na década passada
entre Sérvia e outras repúblicas
que formavam o país, causa
problemas até hoje. Tanto que
o país que enfrenta a Holanda
hoje nem existe mais -os montenegrinos acabam de fazer
plebiscito em que decidiram
por sua independência.
E, assim como no caso de Angola, Sérvia e Montenegro tem
uma seleção, que hoje desafia a
Holanda, com histórias de
guerra para contar.
Ilija Petkovic tem nacionalidade sérvia. Mas nasceu na
Croácia. Assim como o zagueiro Krstajic, que nasceu na Bósnia e tem uma história de vida
bem parecida com a do angolano Mantorras. Krstajic morou
até os 18 anos na Bósnia. Sua família não tinha intenção de sair
de lá, mas chegou a guerra, e depois dos massacres sérvios contra a população muçulmana
bósnia, aquele deixou de ser um
lugar seguro para seus familiares, que acabaram transformados em refugiados de guerra.
O Irã, que abre sua participação contra o México, é o centro
nervoso desta Copa, e seus jogadores, ilustres desconhecidos da bola, têm agora segurança especial pelo clima belicoso
gerado pelas palavras e planos
militares de Mahmoud Ahmadinejad, seu presidente.
Com o passado recente de
conflitos, as três seleções, especialmente Sérvia e Irã, tiveram
suas preparações para a Copa
prejudicadas. O time do Oriente Médio teve pedidos de amistosos rejeitados ou cancelados.
Já os europeus só conseguiram
fazer dois amistosos antes da
estréia na Alemanha.
Assim como a tabela, que
mandou os três fazerem suas
estréias no mesmo dia, a Copa
da Alemanha também vai colocar novos e velhos adversários
(assim como Portugal para os
angolanos) fora dos gramados
de iranianos e sérvios.
A Croácia, maior rival dos
sérvios nos Balcãs, está na parada. Os EUA, com quem o Irã
bate boca há décadas, também
está. Que a paz esteja com eles.
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