São Paulo, domingo, 11 de julho de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

JOHN CARLIN

Espanha x Holanda


Os espanhóis são mais holandeses e mais brasileiros que os próprios. Torço por eles, pelo bem da bola


"MESTRES DO FUTEBOL!", gabaram-se as manchetes dos jornais espanhóis, ecoando o elogio feito a seus atletas por Joachim Löw, técnico da seleção alemã que eles bateram para conseguir enfrentar a Holanda na final da Copa, hoje. Perdoe-me por dizê-lo, mas deve ser deprimente para os brasileiros ouvir isso ser dito de outra seleção.
Seria consolador imaginar que o jogo bonito da Espanha foi herdado das seleções brasileiras do passado, mas, por ironia, a Espanha aprendeu a jogar como está jogando graças aos holandeses, os "brasileiros" da Europa e rivais na final de hoje.
A Espanha era a chamada Fúria -muito sangue e garra, mas pouca sutileza. Isso mudou quando o grande ideólogo do futebol espanhol chegou a Barcelona como atleta nos anos 70, tendo mais tarde assumido o cargo de técnico. Ele foi o maior jogador de futebol holandês, Johan Cruyff. Sendo os brasileiros da Europa, os holandeses acreditavam que a bola deveria ser acariciada, e não levar pontapés.
Cruyff transmitiu sua filosofia a um dos atletas que treinou, Guardiola, hoje técnico do Barcelona, que joga o futebol mais cultuado hoje e que forma a base da Espanha -sete dos titulares contra a Alemanha são do clube. Guardiola reconhece a dívida com Cruyff, que liderou a Holanda à final de 74 jogando possivelmente o melhor futebol visto na Europa até então, mas perdeu para a Alemanha.
O técnico holandês atual, Bert van Marwijk, moldou um time com a meta de compensar aquela decepção e a que a seguiu, na final de 78 contra a Argentina. Criticado por Cruyff, Van Marwijk sacrifica a arte em prol da eficiência. Sua ideia, semelhante à de Dunga, é que o time todo deve defender. Depois, veremos se saem gols.
O engraçado é que os espanhóis são mais holandeses do que os holandeses e mais brasileiros do que os brasileiros. Não só a posse de bola é a prioridade como os espanhóis são individualmente os mais habilidosos desta Copa. A Espanha tem atletas melhores que os holandeses em quase todas as posições. Muito já se disse do meia Sneijder, mas ele é um artesão, enquanto Xavi é um artista.
Pelo bem do esporte, e para que volte a ser dado ao mundo o exemplo de que o futebol bonito é futebol vencedor, torçamos para que a Espanha vença.

O britânico JOHN CARLIN é colunista do diário espanhol "El País" e autor de "Conquistando o Inimigo", livro que inspirou o filme "Invictus"

Tradução de CLARA ALLAIN



Texto Anterior: Atacante vira trapaceiro na África e é vaiado
Próximo Texto: Um mundo que torce: De volta para o futuro
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.