São Paulo, sábado, 11 de setembro de 2004

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MOTOR

Olhos vermelhos

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Antonio Pizzonia chegou perto do pódio em Spa. Era o terceiro, mas, a 12 voltas do fim, ficou pela pista, sem câmbio. Saiu do Williams, apoiou-se no muro, levou as mãos à cabeça. Voltou aos boxes com os olhos vermelhos, contam. Ele nega o choro. Diz só que ficou "desapontado".
Pizzonia sabe que o "chegar perto" não existe. Ou chega-se ou não se chega. Ou vira-se ou não se vira. Ele teve a chance, na pista que revelou Schumacher em 91, de fazer algo parecido. De, na sua terceira chance real na F-1, ir ao pódio, virar. Vítima de uma pane, não foi, não virou.
Mas há um problema mais grave, e daí a "decepção" na Bélgica: chances são artigo de luxo na F-1. Em Monza, ele terá a última. Recuperado da batida que sofreu em Indianápolis, o dono da vaga, Ralf Schumacher, volta na China.
Se o amazonense repetir na Itália o que fez nos testes da semana passada, aqui mesmo, vai largar e chegar no pelotão da frente. Imagine então que ele vá ao pódio. Na segunda-feira, estará na mesa com David Richards negociando uma vaga na ascendente BAR para 2005. Também poderá abrir as portas na hoje hermética Sauber.
(As duas são as únicas alternativas viáveis para o ano que vem. Para a Jaguar, ele não volta. Jordan e Minardi cobram pelo cockpit e seriam um baita retrocesso.)
Uma vez na BAR, Pizzonia poderia lutar por mais pódios e talvez beliscar uma vitória em um eventual espasmo da Ferrari. Contratado pela equipe que mais faz relações públicas na F-1, viajaria o mundo, entre um GP e outro, para divulgar seu nome, o da equipe, o da marca de cigarro.
Viraria. Como Button virou, uma alternativa para quem não agüenta mais os pilotos de discurso pronto da trinca Ferrari, McLaren e Williams. Teria pela frente, enfim, uma carreira.
Não é um cenário impossível.
Mas imagine que ele fracasse no treino de hoje. Ou que seja tocado na primeira curva. Ou que simplesmente faça uma corrida insossa. Terá desperdiçado a última chance. Muito provavelmente, ficará na Williams. Mas se tornará uma espécie de Luca Badoer, o eterno piloto de testes da Ferrari.
Não é um cenário impossível.
O objetivo de uma vida, uma carreira, estará em jogo no Parco di Monza. O esforço de um moleque que voava às quintas-feiras de Manaus a São Paulo para correr de kart e que, mesmo sem treinar, porque não havia pista em sua cidade, tornou-se campeão brasileiro. Na Europa, só não ganhou a F-3000: levou a Vauxhall Jr., a F-Renault, a F-3.
Histórias e currículo que pouco importam para a F-1. O que vale são resultados certos na hora certa, e há por aí dezenas de exemplos para comprovar isso.
Cena corriqueira, os paddocks da categoria são pontos de encontro de carreiras fracassadas, de anônimos atuais que foram celebridades fugazes no passado. Que, em algum momento, voltaram aos boxes de olhos vermelhos, por terem desperdiçado a última chance de suas carreiras.
Não, não acabei de perder nenhuma chance. Recebi, sim, de um grande amigo, uma das maiores da minha vida.

Chance 1
Nelsinho Piquet pode fechar hoje o Inglês de F-3. Na única corrida fora do Reino Unido, em Spa, precisa marcar três pontos a mais do que James Rossiter para conseguir o título que o pai ganhou em 1978. Caso não consiga, terá nova oportunidade amanhã.

Chance 2
Tony Kanaan corre em Chicago para se tornar o primeiro brasileiro campeão da IRL. Precisa vencer e esperar que nem Dan Wheldon nem Buddy Rice cheguem entre os top 5.

Chance 3
F-1 chata? Crise? Não em Monza. Ontem, os tifosi tiveram a primeira chance de comprar o boné do hepta. O preço: 30. Havia fila.

E-mail fseixas@folhasp.com.br


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