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EXCLUSIVO
CPI só saiu para esconder escândalos, diz Teixeira
Em entrevista à Folha, presidente reeleito da CBF atribui investigações do Congresso a "desvio de foco" do governo FHC e admite que só se manteve no poder graças à seleção
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FERNANDO MELLO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
A réplica da Taça Fifa, que adorna o gabinete da presidência da
CBF, num luxuoso condomínio
no Rio, não é apenas o símbolo da
supremacia do futebol brasileiro.
Para Ricardo Teixeira, o homem
que comanda desde 1989 o esporte mais popular do país, foi ela
que viabilizou sua permanência
no poder por mais quatro anos.
Em entrevista de mais de duas
horas concedida à Folha um dia
depois de ter sido eleito para seu
quinto mandato à frente da CBF,
o empresário de 56 anos que entrou no futebol pelas mãos do ex-sogro João Havelange admite que,
se o Brasil não tivesse sido pentacampeão mundial, teria sido defenestrado do cargo após as investigações do Congresso Nacional.
Pela primeira vez, acusa o governo Fernando Henrique Cardoso de ter patrocinado as duas CPIs
no futebol para esconder os escândalos da administração federal; conta que a proposta de inchaço da Copa foi "o bode na sala" para que a América do Sul recuperasse a meia vaga que perdera para a Oceania; surpreende ao
dizer que é melhor para a seleção
disputar as eliminatórias a ter a
vaga automática na Copa-2006 e
desdenha dos opositores, que alegam que o pleito de quarta, que o
elegeu, é nulo.
E, fato inédito, minimiza a importância de uma de suas maiores
metas: a conquista da medalha de
ouro olímpica, único título que
falta ao futebol nacional.
"A melhor coisa
do mundo são as
eliminatórias.
Indica qual
jogador não
serve. Você sofre,
joga na altura,
no frio, no calor,
vai apanhando"
"[Se o Brasil
perdesse a Copa],
não estaria aqui.
Era o que todos
queriam. Teve
gente que
apareceu com
cara de velório
após o penta"
Folha - O sr. foi reeleito com um
placar dilatado, 46 votos a 1. Mas
alguma liminar pode anular os
efeitos da eleição. Teme ter que
realizar outro pleito?
Ricardo Teixeira - Não vai ter outra eleição. Essa foi legal, dentro
do estatuto da CBF. Havia três liminares daqui [Rio] mandando
realizar a assembléia. Não tenho
nenhum receio de outra liminar.
Houve um candidato de oposição
[Carlos Alberto de Oliveira] que
ficou o tempo todo em cima da
urna, vendo os votos entrarem.
Eu nem saí da minha cadeira. Outra coisa: como o sr. Itamar Vasconcellos Dias pode entrar com
ação em Belo Horizonte se ele foi
candidato a vice na chapa de oposição e legitimou a nossa eleição?
Ele foi candidato e foi votado.
Folha - Esperava a vantagem?
Teixeira - Não se ganha no dia
da eleição. Ninguém em três Copas ganhou duas e foi vice em outra. Implantamos o Brasileiro
com pontos corridos. Essa maioria esmagadora foi construída.
Folha - Decepcionou-se por não
ter sido aclamado, como antes?
Teixeira - Não. 46 a 1 é tão acachapante que não faz diferença.
Folha - Não acharia saudável a alternância no poder? Pensa em limitar o número de mandatos?
Teixeira - Eu inverto. Acho que o
presidente deveria ser obrigado
pelo estatuto a tentar uma reeleição. Porque durante os dois primeiros anos você é um neófito.
Folha - E como vê a falta de renovação na oposição?
Teixeira - Se não tivesse acontecido alguma coisa de positivo,
certamente não seria reeleito. O
Brasil é muito respeitado lá fora.
No Comitê Executivo da Fifa, eu
não sou pretensioso, mas sou um
dos que têm mais força.
Folha - Mesmo assim o Brasil perdeu a vaga automática na Copa-2006, apesar de ser o atual campeão. Isso não foi uma derrota?
Teixeira - Vou dizer uma coisa
que nunca disse. A melhor coisa
do mundo é fazer eliminatória.
Folha - Foi melhor perder a vaga?
Teixeira - Acho que sim. Tecnicamente sim. O presidente da Federação Alemã me disse uma vez:
"Você vai sentir a mesma dificuldade que a Alemanha sentiu de 90
para 94. Fomos campeões, só participamos de amistosos. Chegamos totalmente enganados em 94
e rodamos rápido". A mesma coisa aconteceu com a França, em
2002. A eliminatória forma um time. Vale para indicar qual jogador não serve para a seleção. Você
sofre, joga na altura, no frio, no
calor, diante de torcida adversária, vai apanhando. Só se recebe
ensinamento no sofrimento.
Folha - A CBF foi criticada por não
ter desistido da Copa das Confederações. A decisão foi correta?
Teixeira - Acha que seria bom
dizer não ao Joseph Blatter e a toda a estrutura da Fifa?
Folha - Isso politicamente. E do
ponto de vista técnico?
Teixeira - Mas o técnico às vezes
só dá certo com o político.
Folha - Por exemplo?
Teixeira - É importante ser forte
nos bastidores em certas ocasiões.
Folha - Você diz que a CBF e a Sul-Americana são fortes na Fifa. Por
que, então, não emplacaram o inchaço da Copa-06 para 36 times?
Teixeira - A Copa com 36 era o
bode na sala. O que queríamos era
a devolução da meia vaga, que nos
foi tirada e dada para a Oceania. A
maneira encontrada foi propor o
inchaço. É impossível fazer um
campeonato com 36. Só tem uma
solução para 32: 64. É mais fácil
com 64 que com 36.
Folha - Vez ou outra amigos seus
dizem que sua meta maior é ser
presidente da Fifa. Confirma isso?
Teixeira - Não.
Folha - Acha possível o Brasil receber a Copa de 2014 com o Ricardo
Teixeira na presidência da Fifa?
Teixeira - Isso não passa pela
minha cabeça.
Folha - Mas pessoas próximas a
você dizem que é um sonho seu estar na Fifa, seguir Havelange...
Teixeira - Confesso que não, não
estou fazendo proselitismo. Para
fazer uma carreira internacional
como o dr. Havelange, você abre
mão de muita coisa. Ele quase não
viu os netos dele crescerem.
Folha - Você também falava que
esse seria seu último mandato na
CBF e voltou atrás. Quando e por
que mudou de idéia?
Teixeira - Eu não sei te dizer o
momento exato. O que eu sei te
dizer é o seguinte: eu não queria.
Não queria, não queria mesmo,
mas houve manifestação muito
grande de eleitores. O que me fez
ficar foi a consolidação da vinda
da Copa do Mundo para o Brasil.
Folha - De 2014?
Teixeira - De 2014, que será decidida em 2008. Se eu não estivesse
como presidente da CBF em 2006,
dificilmente seria reeleito no Comitê Executivo da Fifa para 2010.
E não teria voto. O Brasil não teria
o voto do Brasil para a Copa.
Folha - O penta não teve influência em sua decisão?
Teixeira - Não dá para ignorar
que a Copa de 2002 foi um fator
preponderante nisso.
Folha - Acha que estaria sentado
nesta cadeira se o Brasil não tivesse sido pentacampeão?
Teixeira - Eu teria tido problemas. Certamente não estaria aqui.
Era exatamente o que todos queriam. Teve gente que apareceu
com cara de velório após o penta.
Folha - Todos esperavam que você iria explodir com a conquista do
penta. Mas preferiu comemorar sozinho. Por quê?
Teixeira - Aquele título não era
uma resposta a ninguém. Tomei
uma cerveja com meu filho, estava com minha filha, minha mulher, alguns amigos da Nike, Depois, fui dormir com a taça do
meu lado. Acha que precisava de
mais alguma coisa?
Folha - Eleito pela cartolagem, o
sr. foi "reprovado" por duas CPIs.
Qual sua defesa para as acusações?
Teixeira - A CPI não considerou
nenhuma das respostas que enviamos. A explicação dos US$ 400
mil que disseram que sumiram na
Copa Ouro não foi levada em conta. Mandamos o dinheiro para pagar bicho, hotel etc. O Américo
Faria gastou US$ 60 mil e devolveu US$ 340 mil. Aí, dizem que
sumiu porque no balanço não
tem a entrada dos US$ 400 mil.
Houve um gasto. Isso a CPI não
viu... Outra coisa foi a questão dos
juros [de empréstimos tomados
no Delta Bank, alvo de uma das
ações no Ministério Público]. Em
1998 houve a crise da Rússia.
Também diziam que não gastamos nada com o futebol, só com a
diretoria. É que, pela nossa contabilidade, o salário de Felipão,
Américo Faria, Antônio Lopes,
Murtosa, Rodrigo Paiva, entravam como gasto do RH. Isso não é
despesa do futebol? Dá mais de R$
1 milhão. Quem acompanhou as
CPIs viu claramente os interesses
por trás. Foram coisas armadas,
movidas com a nítida intenção de
me tirar da CBF. Um ministro
[Carlos Melles] chegou a dizer
que eu tinha carta de renúncia,
mas não mostrou. É absurdo dizer uma mentira deste nível.
Folha - A CBF cogitou ignorar Brasília no vôo do penta alegando que
o governo FHC patrocinou as CPIs
que devassaram o futebol...
Teixeira - O governo patrocinou
para esconder outras coisas, outros escândalos. Estou afirmando
isso categoricamente. Procure
ver. Sempre que existe uma grande crise governamental, eles direcionam para outro lado. O futebol
é muito popular e servia para isso.
Folha - O sr. está se referindo ao
caso Eduardo Jorge, ex-secretário
da Presidência?
Teixeira - Isso é você quem está
dizendo. Tire suas conclusões.
Folha - O sr. sempre traçou como
meta a inédita medalha de ouro
olímpica. E agora?
Teixeira - Não é "a" meta. Acho
que isso atrapalhou muito o time
em campo. Temos que dar a gradação que é merecida. A gente
exacerbou, principalmente em
Atlanta-96. O ouro é meta, mas é
uma coisa tranquila, não é o
maior título da vida da CBF. É
meta para a seleção sub-23. Prova
é que não coloquei o técnico da
seleção principal na Olimpíada.
Folha - O sr. é acusado de dirigir
uma entidade rica com um futebol
pobre. Dá para pensar em distribuir mais a renda que ela recebe?
Teixeira - Não. Abrimos mão de
taxas, dos direitos da TV, do dinheiro da venda de atletas. Olham
a parte negativa da convocação.
Conhece algum jogador que foi
vendido para o exterior sem jogar
pela seleção? Então, a CBF já ajuda os clubes. Estamos bancando
parte da Série B.
Folha - Não está entre as obrigações da CBF bancar a Série B?
Teixeira - Não. Cada clube tem
que ser competente para conseguir se viabilizar. Não cobrando, a
CBF já transfere o dinheiro.
Folha - A maior novidade da tua
chapa foi o Fernando Sarney [filho
do ex-presidente José Sarney] como
um dos vices. Brasília tem sido muito importante na discussão do futebol . Que influência ele terá?
Teixeira - O Fernando faz esse
trabalho há tempos, como diretor
da área governamental da CBF.
Folha - O que acha do Estatuto do
Torcedor?
Teixeira - Não sei se haverá recursos para modernizar os estádios. Também tenho medo do
sorteio de juízes.
Folha - E em relação ao motivo da
malfadada greve do futebol, de
que o cartola pode ser responsabilizado independente de culpa?
Teixeira - Isso está esclarecido.
Não podem culpar o presidente
da CBF por algo que ocorra no
Amapá. É como se saísse uma lei
que diga que é responsabilidade
do presidente da República qualquer assalto que ocorra no Brasil.
Folha - E a Lei da Moralização? O
Eurico Miranda (Vasco) disse em
reunião na sua frente, e repetiu lá
fora, que ele via a cara dele e a sua
como alvos dessa lei. Concorda?
Teixeira - Não acredito nisso.
Folha - Para finalizar: qual sua
avaliação do novo Brasileiro?
Teixeira - Até agora muito bom.
Está me surpreendendo. O medo
que eu tinha, de um time disparar,
não deve acontecer.
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