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São Paulo, domingo, 12 de outubro de 2003

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FUTEBOL

Teoria e prática

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

Hoje, contra a fraquíssima Jamaica, Parreira vai manter a estrutura tática com quatro defensores, três no meio-campo e três mais adiantados. É o mesmo esquema do Cruzeiro, virtual campeão brasileiro.
Parreira gosta mais da formação com quatro no meio (dois volantes e um armador de cada lado) e dois atacantes, utilizada por ele na Copa de 94 e hoje pela maioria das equipes e seleções da Europa. Os armadores da direita e da esquerda fazem duplas com os laterais, no ataque e na defesa. Esse esquema começou com a seleção da Inglaterra, campeã do mundo em 1966.
Como o Brasil tem vários meias ofensivos talentosos, acostumados a jogarem livres, próximos dos dois atacantes, sem obrigação de marcar no seu próprio campo, o técnico, acertadamente, optou por três no meio e três na frente.
Mas os três do meio-campo não podem ser apenas marcadores. São eles que iniciam as jogadas ofensivas. Por isso, precisam ter um bom passe e, alternadamente, se aproximarem dos atacantes.
Essa é a dificuldade. Gilberto Silva joga mais recuado, Emerson não se destaca pela habilidade e mobilidade, e Zé Roberto é muito habilidoso, mas não tem a lucidez, a criatividade e a técnica dos grandes armadores. Joga mais com os pés do que com o cérebro. Olha muito para a bola e pouco para a frente.
Não há opções melhores. Uma possível seria tentar adaptar um dos meias de ligação que estão na reserva a uma nova função, já que o meio-campo é grande para apenas dois jogadores. Nenhum deles faz isso em seus clubes. Em 58, o ponta Zagallo já sabia disso quando ia para o meio ajudar os dois armadores na marcação.
Nas primeiras partidas em que jogou pelo Milan, Kaká atuou dessa forma, mais recuado, pela direita ou esquerda, marcando no seu campo ao lado dos dois volantes, numa função próxima à do Zé Roberto.
Como Kaká é um jogador disciplinado e de ótima condição física, ele foi bem, mas aí não é o seu lugar. Ele ficou muito longe dos dois atacantes e do gol. No último jogo, contra a Inter, Kaká atuou do meio para a frente, livre, como gosta, sabe e fazia no São Paulo. Jogou muito melhor. Desse jeito, ele jogará hoje contra a Jamaica.
Parreira tem uma filosofia e um esquema tático definidos, o que é essencial, mas deveria criar variações para determinados momentos, como marcar por pressão, escalar um segundo típico atacante (Adriano ou Luis Fabiano) ou dois volantes, dois meias e dois atacantes ou um jogador que recue, marque pelo meio e avance como um ponta (Denílson, Robinho ou o próprio Zé Roberto).
Para isso, é preciso teorizar, treinar e experimentar em alguns jogos, como no segundo tempo do amistoso contra a Jamaica. Unir a teoria com a prática.
A teoria sem a prática é estéril, ou quase, o que poderia ter sido, mas não foi. A prática sem a teoria é uma grosseira simplificação.

Magia do craque
Se Kaká jogar hoje muito melhor do que Rivaldo, poderá ser o titular na volta do Ronaldinho. Na eliminatória anterior, mesmo quando jogava mal -era mais criticado do que merecia-, Rivaldo era imprescindível porque não havia outro jogador de talento. Agora, no entanto, é diferente. Há excelentes opções, como Kaká e o cruzeirense Alex.
Kaká estreou no São Paulo em 2000 e, agora com 21 anos, está próximo de se tornar uma estrela mundial. Nesses três anos ele ficou mais forte, rápido, melhorou a técnica, foi endeusado, criticado, chamado de craque, de pipoqueiro, de menino bonito protegido pelo marketing e foi campeão do mundo.
Kaká amadureceu. Na Itália, onde se valoriza não só o jogador que acerta muito, mas também o que erra pouco, ele vai aprender a esperar o momento certo para brilhar. No São Paulo, Kaká queria, em todas as jogadas, arrancar do meio-campo até o gol. Acertava, porém perdia muitas bolas e era criticado.
Antes de se destacar individualmente, Kaká terá de jogar um futebol coletivo e solidário. A sua posição exige muito isso.
Cruyff afirmou que jogava 85 minutos para o time e, nos cinco restantes, dava o seu show. E foram esses cinco minutos que fizeram do holandês um craque inesquecível.
Não dá para ser craque os 90 minutos. Romário era assim. Ronaldo também aprendeu a fazer isso. Kaká terá de descobrir essa magia.

E-mail tostao.folha@uol.com.br


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