São Paulo, sexta-feira, 12 de outubro de 2007

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FÁBIO SEIXAS

O pulso ainda pulsa

Escorregada de Hamilton reabriu o Mundial e trouxe beleza a uma disputa que estava fadada ao descrédito

COMO ERA lindo ver Marion correr, vencer, vibrar, sorrir.
Na tribuna de imprensa do estádio Olímpico de Sydney, jornalistas admirávamos suas façanhas.
"Como havia feito depois da vitória nos 100 m, sentou no chão. Repetindo o gesto de sábado, levantou, caminhou até as arquibancadas, cumprimentou a família e, com as bandeiras dos EUA e de Belize -país da mãe-, deu uma volta na pista de atletismo. Os alto-falantes tocavam "Respect", sucesso de Aretha Franklin", escrevi, após a final dos 200 m.
Foi o segundo ouro de Marion em Sydney. Viriam mais um ouro e dois bronzes. Sempre acompanhados de um sorriso escancarado, sua marca registrada, cativante, um charme.
Mas tudo foi para o ralo há uma semana. As medalhas. A história. A vibração. Os cumprimentos. Os gestos. O respeito. O sorriso. Marion. O motivo, doping. O cerco se fechou de tal maneira sobre a superatleta que ela não teve outra saída a não ser admitir a trapaça, o engodo.
Um conto de fadas a menos no mundo, enfim.

Desce o pano, sobe o pano
Como é lindo ver correr o "crème de la crème" desta nova geração.
Alonso, Hamilton e Raikkonen meio que se completam. Tire um deles do jogo, e o campeonato não teria sido indecifrável como foi.
Três estilos diferentes de pilotagem. Três caminhos para chegar lá. Três personalidades ainda mais distintas, emblemáticas nas maneiras de falar e de comemorar. O "toma, toma!" de Alonso. O sorriso do tamanho do mundo de Hamilton. A megafrieza nórdica de Raikkonen, só quebrada pelas goladas também nórdicas de champanhe.
Mas tudo foi para o ralo. O arrojo.
A novidade. A frieza. O Mundial.
Primeiro, com a trapaça que levou a Woking detalhes miúdos dos carros e das estratégias de sua maior rival. O quanto de ilícito há por trás do crescimento da McLaren neste ano? Nunca saberemos.
Depois, caso detonado, com os dois absurdos veredictos da FIA.
Que acabaram por punir a escuderia, mas não os pilotos, como se os pontos não fossem os mesmos.
Pior do que a revelação de um doping no esporte, só um doping revelado e não punido. A decepção não acontece anos depois, mas ao longo da competição. É o fim.
Mas... É, houve um segundo "mas". E inimaginável. Hamilton percorreu 4.716 km em GPs sem escorregar. Faltavam 142 km para conquistar o título. Mas ele escorregou. Foi parar na brita, atolou.
E, de repente, foi como se o campeonato se regenerasse. Sim, a mancha estará lá, é indelével. O momento, porém, não tem nada a ver com o desdouro do Mundial.
Por vias tortas, os três melhores do campeonato correrão em Interlagos com chances de título.
Nesta F-1, neste 2007, o esporte venceu o doping. É por essas e por outras que amamos esse negócio.


fseixas@folhasp.com.br

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