São Paulo, terça-feira, 13 de janeiro de 2009

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JOSÉ ROBERTO TORERO

O pecado da ludopedofilia


Aprecio a juventude, e ela me faz rejuvenescer, mas, após boa surpresa na Copa SP, empresários me dão calafrios

NOVEL LEITOR , noveleira leitora, eu vos pergunto: qual a melhor maneira de manter alguma jovialidade?
Cremes? Ginástica? Botox? Miolo de abacaxi batido no liquidificador? Barbatanas de tubarão temperadas com pó de presa de elefante? Não, nada disso, o melhor modo de se manter jovem é ficar perto de gente jovem. Vendo suas peles lisas e macias, esquecemos nossas rugas; vendo sua disposição, deixamos de lado nossas dores na coluna; vendo seus cabelos esquisitos, nem temos vontade de tirar nossos fios brancos.
Há uma beleza intrínseca à juventude. E não só na dos humanos, mas até nos animais. É só pensar num gatinho novo brincando com uma bola de papel, num cachorrinho enfiando o nariz num sapato, em pintinhos amarelos andando em fila. Mas fiquemos nos seres humanos.
Aquelas pernas finas, a energia que transborda, a risada sem motivo, o abdômen esguio e até as espinhas, tudo faz com que a juventude seja bela e atraente. Assim, neste fim de semana, cometi o pecado da ludopedofilia. No bom sentido, é claro. Explico melhor: como o futebol adulto está em recesso e como não morro de amores pelos torneios europeus, só o que me restou foram os jogos da Copa São Paulo. Confesso que não esperava grande coisa dessas partidas. A falta de maturidade física e técnica às vezes se traduz em jogos sem graça, sem lances brilhantes e surpreendentes. Mas tive uma surpresa. Vi algumas partidas e notei uma certa leveza que não temos no futebol adulto. As jogadas me parecem menos violentas e há maior liberdade para os lances criativos, para a firula, para o enfeite. Talvez isso aconteça porque muitos atletas, sabendo que há empresários nas arquibancadas, tentam bordar as jogadas para eles. Mas também pode ser porque o futebol para os meninos ainda é um pouco brincadeira.
Outra graça de ver os jogos da Copinha, principalmente em relação ao seu time, é imaginar os garotos no futuro. Neste estágio, os jogadores são como crianças no berçário. Eles podem ser tudo. Podem ser a nossa maior glória, podem nos dar conquistas impensadas, podem trazer risos e lágrimas de alegria.
Vendo o jogo do Santos, por exemplo, pensei que Alan Patrick e Neymar farão tabelas inesquecíveis, que André marcará muitos gols, que o lateral-esquerdo Anderson Planta será o dono da camisa 3 por muitos anos, que Dudu será o xerife do time. Torcedores de outros times também devem estar sonhando. Os cruzeirenses já imaginam os gols de falta de Bernardo, os flamenguistas já veem Camacho correndo pelo Maracanã, os são-paulinos festejam os futuros gols de Henrique e Oscar, o trio tricolor Dori, Bruno Veiga e Wellington já dá água na boca dos fãs do Fluminense, e os corintianos esperam ansiosamente pelo novo Marcelinho, que também usa a 7.
Nós, torcedores, sonhamos com esse futuro de dribles e gols. Mas, de vez em quando, nas noites sem lua, eis que temos um pesadelo terrível: chegam empresários de terno e gravata, e, tal qual o homem que leva Pinóquio e seus amigos para a Terra dos Brinquedos, os engravatados põem nossos garotos em carroças e os levam para bem longe. Esses, sim, são os verdadeiros ludopedófilos. No mau sentido.

torero@uol.com.br



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