São Paulo, domingo, 13 de agosto de 2006

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SUPERAMADOR/CICLISMO

Audax testa limites sobre duas rodas

Prova mais antiga que a Volta da França põe resistência à prova nas estradas, vira desafio pessoal e atrai atletas do Brasil

Ciclistas chegam a percorrer 1.200 km na bicicleta em 90 horas, sob chuva e sol; modalidade é mais popular nos Estados do Sul do país


Divulgação
Ciclistas chegam a percorrer 1.200 km na bicicleta em 90 horas, sob chuva e sol; modalidade é mais popular nos Estados do Sul do país


MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Que tal cumprir 200 km de bicicleta, sem dormir, sob chuva ou sol? Depois, pedalar 300 km, depois 400 km, 600 km... E como recompensa, ganhar o direito de repetir a epopéia por intermináveis 1.200 km?
Loucura? Pois a cada dia existe mais gente que acha uma boa idéia e se dedica à aventura.
A modalidade tem nome pomposo, Audax (em latim, audacioso), e remete a um tempo em que a Volta da França, principal prova do ciclismo, nem havia nascido. Especialistas, aliás, dizem que foi graças aos audaciosos aventureiros que pedalavam pela França no século 19 que surgiu o tour.
Não à toa, a "Olimpíada" de Audax é realizada a cada quatro anos nos 1.200 km da Paris-Brest-Paris, competição criada em 1891 e que teve com um de seus primeiros campeões, em 1901, Maurice Garin. O mesmo que logo depois também venceu a disputa inaugural da Volta da França, em 1903.
Naquela época era muito mais difícil encarar o percurso. "Mas ainda é bem complicado descer uma estrada a 50 km/h à noite só com aquele faixo de luz do farol da bicicleta. Você tem de saber bem o que está fazendo", diz Bill Presada, um dos pioneiros de Audax no Brasil.
E, no final, não imagine pódio com troféu e champanhe. O praticante de Audax tem como objetivo cumprir a prova no prazo estabelecido -os 200 km, por exemplo, são feitos em, no máximo, 13h30; os 600 km, em 40h. É um desafio pessoal.
Quando o atleta termina a prova de 200 km, recebe brevê (parecido com o dos pilotos de avião) para disputar a distância seguinte. Se participar de todas até a de 600 km em um mesmo ano, ganha autorização para se aventurar nos 1.200 km.
"A Paris-Brest é uma prova de superação. E um espetáculo muito legal. Tinha gente de tudo quanto é país, bicicleta de todo tipo. E o povo se envolve", conta Manuel Terra, único brasileiro a completar os 1.200 km.
As longas distâncias não são percorridas no Brasil. A modalidade, aqui, ainda engatinha. Começou em 2003 quando um grupo de fanáticos que fazia viagens de bicicleta, como eles mesmos se definem, fuçaram na internet e encontraram o clube de Audax da França.
Logo no primeiro ano, 2003, fizeram provas das quatro distâncias para que Terra tirasse o brevê que permitiria a viagem.
"Na primeira de 600 km, só eu e o Manuel terminamos. Ele fez os últimos quilômetros com uma marcha só. Sofremos muito, tinha subida, vento...", lembra Presada, que ajuda a organizar as provas de São Paulo. Existem ainda núcleos no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
O Sul concentra as maiores provas. Neste ano, foram sete no primeiro semestre, com média de 84 ciclistas em cada uma.
Os aventureiros não são profissionais -aliás, exigência da modalidade. Os eventos reúnem trabalhadores das mais diversas áreas, de donos de bicicletaria a cirurgiões cardíacos.
"Tem pai e filho, mulher e marido. Nas provas mais longas, a média de idade beira os 40 anos", afirma Luiz Faccin, que organiza Audax no Sul.
Esse grupo, aliás, quando decide percorrer a distância mais curta, leva para a modalidade até a irreverência só vista em eventos como a São Silvestre.
"Um homem uma vez foi de barra-forte e, quando choveu, abriu um guarda-chuva. Já prometeram que vão competir com aquelas bicicletas antigas que têm uma roda bem grande na frente e outra pequena atrás. Para quem faz 400 km, 600 km, as provas de 200 km viram diversão", conta Faccin.
Para esses "fanáticos" do Sul, aliás, as distâncias não são o maior problema. Provas de 300 km -feitas em 20h-, têm largada à meia-noite.
"Neste ano, a saída foi feita sob muito frio e chuva. Resultado, 156 se inscreveram, 125 largaram e apenas 75 completaram a prova", relembra Faccin.
E, mesmo assim, não desanimam. Pedalam forte para, em 2007, levar uma equipe a Paris. Para se divertir por 1.200 km.


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