São Paulo, terça-feira, 13 de outubro de 2009

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JOSÉ ROBERTO TORERO

Aristocracia e meretrizes


O dinheiro no futebol nada tem a ver com meritocracia, tamanho da torcida e força política valem muito mais


MERITOCRACIA É uma palavra estranha. Parece uma mistura de meretriz com aristocracia. Porém, segundo o "Houaiss", meritocracia é um "sistema de recompensa e/ou promoção fundamentado no mérito".
É o que acontece, por exemplo, no Campeonato Brasileiro em relação aos pontos. Os times que conquistam mais pontos vão à Libertadores.
Os que conseguem menos são rebaixados para a Série B. Mas não é o que acontece em relação às cotas de TV, ou seja, em relação à principal fonte de renda dos clubes. Aos números: neste ano, as emissoras abertas pagarão R$ 300 milhões aos clubes; e o "pay-per-view", R$ 110 milhões.
Estes R$ 110 milhões são divididos de acordo com uma pesquisa de audiência feita pela TV por assinatura, sendo que o mínimo que um time recebe é 1,5%. Desta forma, o Fluminense, hoje um dos possíveis rebaixados, e que tem, segundo a pesquisa, 5,55% dos espectadores, receberá R$ 6,105 milhões em 2009. Já o Vitória, várias posições à frente do Fluminense, fica na cota mínima de 1,5%, o que representa R$ 1,65 milhão, menos de um terço do carioca.
Quanto aos R$ 300 milhões da TV aberta, os clubes foram divididos em sete grupos. Cada clube do primeiro grupo na Série A (a saber: Flamengo, Corinthians, São Paulo e Palmeiras) recebe R$ 21 milhões por ano. Os números vão caindo até o sétimo grupo, onde estão Avaí, Náutico, Santo André e Barueri, que ganham por volta de um terço do que recebem os quatro grandes.
Em resumo, os critérios para a divisão do dinheiro televisivo são dois: a colocação do time dentro do Clube dos 13 (que vem do tamanho de sua torcida e de sua força política) e a pesquisa de audiência. Não há nenhum mérito esportivo. Tanto que Goiás e Flamengo, que possuem quase o mesmo número de pontos atualmente, receberão cotas bem diferentes. O Flamengo, somando-se o dinheiro das emissoras abertas com o "pay-per-view", terá R$ 36,2 milhões. O Goiás, R$ 12,6 milhões, pouco mais de um terço.
Os socialistas utópicos provavelmente diriam que o dinheiro deveria ser igualmente dividido pelos 20 clubes da Série A, afinal é o campeonato que é vendido, e não os clubes.
Já os justiceiros esportistas seriam a favor de que os clubes recebessem exclusivamente de acordo com sua pontuação.
Nenhuma das duas propostas me parece ter chance de ser aceita. Porém não creio ser impossível desenvolver um sistema misto, mais ou menos como acontece na Inglaterra.
Lá, 56% da verba da TV são divididos igualmente entre os participantes, 22% de acordo com mérito esportivo e 22% de acordo com índices de audiência.
Deixo claro que a busca da meritocracia não é um dever das TVs, sejam abertas ou fechadas. Afinal, o mérito, para elas, é apenas e tão somente a audiência. A busca da inclusão do mérito esportivo como elemento na divisão das cotas de televisionamento deve ser um trabalho do representante dos times, ou seja, do Clube dos 13. Mas duvido que uma entidade criada pelos grandes clubes vá ajudar equipes em ascensão.
O dinheiro no futebol não tem nada a ver com meritocracia. Aliás, na maior parte das vezes tem mais a ver com aristocracia e meretrizes.

torero@uol.com.br


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