São Paulo, domingo, 14 de março de 2010

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TOSTÃO

Multiplicidade de olhares


Cada um enxerga o futebol baseado em seus sentimentos, conhecimentos e referências. Não há observador neutro


A ESPN TEVE uma boa ideia, a de mostrar, na íntegra, alguns dos grandes jogos de Copas do Mundo, com comentários e narrações atuais.
Como vários Mundiais foram realizados em épocas em que havia poucas informações, muitas coisas não foram pesquisadas e/ou se perderam. Com a tecnologia atual, fatos podem ser resgatados e compreendidos, com a visão moderna. Fatos também podem ser desmentidos e/ ou contestados. Assim é a história. Verdades se tornam mentiras, e mentiras se tornam verdades.
Quando alguém narra uma história, mesmo sendo fiel e honesto, o faz de acordo com seus conhecimentos e sentimentos. Não existe observador totalmente neutro. Além disso, nem tudo o que está na memória é lembrado.
É, mais ou menos, o que acontece no sonho. Ao acordar, nós nos lembramos das coisas que são filtradas pela consciência. O sonho é anárquico, sem regras.
Não se pode ver o futebol com um olhar saudosista e romântico, de que tudo era melhor e mais bonito, nem com um olhar tecnológico, pragmático e preconceituoso, de que tudo de outras épocas está ultrapassado.
Não se pode tirar conclusões de uma época por um ou poucos jogos e/ou por um campeonato. As seleções, como a brasileira, da Copa de 70, e a da Holanda, de 74, foram inovadoras e revolucionárias.
A final entre Brasil e Itália, na Copa de 70, mostrada pela TV na semana passada, foi um jogo tático, o que era raro.
Combinamos que, quando Jairzinho fosse para o meio, perseguido pelo marcador (a Itália fazia marcação individual), Carlos Alberto avançaria pela direita. Assim, saiu o quarto gol da seleção.
Combinamos ainda que eu jogaria junto ao líbero, que atuava atrás de uma linha de quatro defensores. Isso impedia o líbero de sair na cobertura, como poderia ter feito nos gols de Carlos Alberto e Gérson.
A seleção de 70 recuava para fechar os espaços e contra-atacar. É o que veremos em quase todas as seleções na Copa deste ano. Zagallo estava à frente do tempo.
A Holanda de 74, que eliminou o Brasil, jogo mostrado há alguns dias, foi a primeira a marcar por pressão. Onde estava a bola, havia muitos holandeses. Era a pelada organizada.
Depois disso, muitos times tentaram fazer o mesmo e não conseguiram. Hoje, isso é pouco frequente, a não ser em alguns momentos das partidas. Há muito desgaste físico, e os técnicos morrem de medo de deixar espaço na defesa.
Todos os grandes times do passado jogavam para vencer, dentro do estilo da época. O espetáculo era consequência. É o que faz hoje o Santos. Brinca, com seriedade.
Infelizmente, a maioria valoriza hoje mais um título com pouca importância, como um Estadual, do que um jogo prazeroso e lúdico, como o do Santos, caso o time não seja campeão com a atual formação. Vão dizer que o que vale é o título.
Muitos jovens que assistem, pela primeira vez, na íntegra, e com olhar de hoje, ficam um pouco decepcionados com os grandes times, como o Brasil de 70.
Percebem que os jogadores cometiam erros e que o time era excepcional, mas não era perfeito, como falam seus pais. A perfeição só existe em nossa imaginação.


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