|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Barrichello aceitou receber ordens
WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA
Na discussão do caso gerado pela falta de ética esportiva da Ferrari, na Áustria, ao determinar
que Rubens Barrichello abrisse
caminho para a vitória de Michael Schumacher, há um elemento jurídico a considerar: o
contrato do brasileiro. Renovado
de véspera, pelos dois anos em
que a Ferrari espera superar os
cinco títulos de Juan Manuel Fangio, creditados às imbatíveis Mercedes de seu tempo. Contrato que
Barrichello deve ter firmado sob
orientação de seus advogados.
Decorre do artigo 1.176 do Código Civil Italiano que quem assume uma obrigação deve pôr, no
cumprimento dela, os mesmos
cuidados que um bom pai de família adota para tratar dos assuntos familiares. Na segunda
parte, porém, está a chave da
questão: "No cumprimento das
obrigações inerentes ao exercício
de uma atividade profissional, a
diligência deve ser avaliada segundo a natureza da atividade a
ser exercida". Se o "circo" da F-1
fosse propriamente um esporte,
Barrichello teria vencido. Não é.
O esporte vem muito depois de interesses econômicos, dos milhões
de dólares pagos aos pilotos, gastos em publicidade, transmissões
de TV, divulgação das marcas,
dos motores, dos equipamentos.
O brasileiro não recebe polpudos salários para ganhar provas.
Sua tarefa é ajudar a Ferrari (e a
Fiat, que a controla) a alcançar o
objetivo legítimo de bater o recorde de Mundiais, com o alemão.
Barrichello esclareceu em entrevista: o contrato profissional o
obriga a fazer o que a equipe
mandar. No exercício de um direito seu, aceitou esse papel secundário, embora gostássemos de
ver nele o novo Senna. Duas lembranças são oportunas: o artigo
1.092 do Código Civil Brasileiro,
se fosse aplicável, levaria à mesma solução, ao dizer que, "nos
contratos bilaterais, nenhum dos
contratantes, antes de cumprida
sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro". A realidade é antiesportiva, mas legal. Para Barrichello ir ao caixa receber,
deverá respeitar as ordens. Assim
foi e assim será, enquanto a Ferrari não realizar seu sonho. Até
isso ocorrer, devemos parar de
chamar a F-1 de circo. Afinal, é
preciso respeitar os circos.
Texto Anterior: Automobilismo: Todt assume toda a culpa por "marmelada" Próximo Texto: FIA marca reunião e pede explicações Índice
|