São Paulo, quinta-feira, 14 de setembro de 2006

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JOSÉ ROBERTO TORERO

A vitória dos chatos

CACETE leitor, caceteada leitora, o futebol ficou chato. Chato, maçante e enfadonho. É raro que se veja uma partida do Brasileiro com gosto. Às vezes há jogos com muita luta, como o último São Paulo x Corinthians, mas raras vezes você vê dois times jogando bem, raras vezes você sente aquele prazer estético de ver um jogo bem jogado.
Acho que isso acontece por vários motivos. O primeiro, e mais óbvio, é porque nossos melhores jogadores estão fora do país. Se Robinho, Elano e Diego ainda estivessem no Santos, o time estaria divino. Se Alex e Fred ainda jogassem no Cruzeiro, a equipe seria celestial.
Por conta da exportação de nossos melhores jogadores, os técnicos brasileiros trabalham, como já disse Leão (com certo exagero), "com ponta de estoque". Mas isso não me parece ser suficiente para explicar a sem graceza do futebol atual. Na verdade, acho que boa parte da culpa vem dos próprios técnicos. Eles conseguiram, numa criação permanente e conjunta, elaborar um esquema que prioriza a defesa e quase anula o ataque. Um esquema muito eficiente. Infelizmente.
E esse esquema é conhecido por todos. Tanto que as equipes andam muito semelhantes. Se os atletas jogassem com máscaras e trocassem suas camisas, confundiríamos quase todos os times.
Os técnicos, sempre com a cabeça a prêmio, estão ousando pouco. Mesmo Luxemburgo, um dos melhores do país, está usando um esquema chato (que lhe deu o Paulista, é bem verdade, mas graças a vários 1 a 0 chatos).
Eis aí um triste fato: o futebol chato traz conquistas. Sim, a chatice compensa. A Itália, por exemplo, ganhou a Copa do Mundo jogando um futebol chato. O Vasco, equipe de grande tradição ofensiva, vem obtendo sucesso jogando atrás, esperando os inimigos (tanto que em São Januário, onde tem que sair para o jogo, não vem obtendo bons resultados). O Grêmio tem em seus volantes seu principal destaque. O Santos armou um ótimo esquema de marcação, mas no ataque... O Paraná é dos mais eficientes na arte da chateação. O Figueirense é chato, o Juventude é chato.


Além do êxodo de atletas, o país se impregna de futebol pouco criativo, que parece nos deixar em beco sem saída

É claro que um bom time tem que ser chato. Um time que não seja chato na marcação vai tomar gols e perder jogos. E o ataque só começa quando se recupera a bola.
Mas pode-se ser chato com criatividade, pode-se ser chato, marcador, pegador e, ao mesmo tempo, mostrar inventividade, fome de gols e vontade de dar espetáculo. Porém não é isso que se vê. Nos últimos meses, só São Paulo e Internacional conseguiram ser chatos e criativos ao mesmo tempo.
Os outros times, só muito de vez em quando, só num ou noutro momento de uma ou outra partida. Isso me dá a impressão de que chegamos ao fim da história do futebol, a um beco sem saída. Mas é claro que não se pode acreditar nisso, como também não se pode acreditar que chegamos ao fim da história econômica com o neoliberalismo.
São apenas dois maus momentos. As pessoas devem ter sentido a mesma coisa na Idade Média e no começo dos anos 90. Que venha o Renascimento!

Alívio
Nelson Rodrigues confessou que, quando ele soube da morte de Guimarães Rosa, foi até a janela e respirou aliviado, pois agora já não havia mais no mundo aquele escritor tão gigantesco, tão insuperável.
Deve ter acontecido a mesma coisa com os pilotos de F-1 quando ouviram Schumacher dizer que se aposentaria. Eles devem ter suspirado ao saber que o maior de todos está parando, ao saber que o sujeito que quebrou todos os recordes finalmente vai se aposentar. Eu, confesso, respirei aliviado.

torero@uol.com.br


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