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JOSÉ ROBERTO TORERO
A mão, o olho e o marca-passo
Juízes não querem usar a tecnologia, em grande parte, por vaidade; eles querem ser o poder supremo em campo
RECENTEMENTE perguntei a
um juiz o que ele achava de
usar câmeras para ajudá-lo
nas decisões de lances polêmicos.
"Aí teria outro juiz na cabine?", ele
perguntou.
"Sim", respondi, "E ele se comunicaria com o senhor".
"Se é assim, sou totalmente contra. Isso pararia o jogo."
"Mas diminuiria o seu número de
falhas."
"A falha faz parte da vida. E do futebol."
"Então, mesmo tendo recursos
tecnológicos modernos e mais eficientes, não deveríamos usá-los?"
"Não. Os erros alimentam a polêmica. É uma questão de tradição."
"Mas e se..."
"Não, nada de modernidades!"
Depois deste ultimato, me calei.
Voltando para casa, enquanto esperava que um semáforo abrisse, fiquei imaginando no que aconteceria
se um dia este juiz se sentisse mal.
Ele diria a sua mulher: "Querida,
acho que estou sentindo umas pontadas no lado esquerdo do peito".
"Quer que eu telefone e chame
uma ambulância?"
"Telefone? Não, nada de modernidades. Passe um telex."
"Um telex?"
"Sim, tenho um lá no meu escritório."
"Bem, se você prefere."
Um bom tempo depois, chega a
ambulância tocando sirene e fazendo alarde.
"Um automóvel? Vivi, meu amor,
você sabe que eu detesto essas coisas
tecnológicas. Chame uma ambulância-carroça."
"Mas assim você vai demorar mais
para chegar ao hospital."
"Tudo bem, é uma questão de tradição."
"Você manda, querido."
Durante algumas horas, o juiz e
sua esposa chacoalham na parte de
trás de uma carroça. Quando finalmente chegam ao hospital, o médico
examina o paciente e chega à conclusão de que ele só sobreviverá com
um marca-passo.
"Isso é eletrônico?"
"Sim. Temos um modelo novo,
com pilha nuclear que dura 15 anos.
O senhor ficará como novo."
"Não, nada de modernidades!"
"Mas, sem o marca-passo, um dia
o seu coração vai falhar e o senhor
vai morrer."
"Tudo bem, a falha faz parte da..."
O pobre juiz nem completou a frase. Então o semáforo abriu e segui
caminho.
Lembrei-me disse por conta do
polêmico lance da mão de Adriano.
Provavelmente o Paulo César Oliveira (que não acho um juiz fantástico) estava com a visão encoberta no
lance. Provavelmente, a bandeirinha também. Mas, nós, milhões de
espectadores, não.
Acho que os próprios juízes é que
teriam a obrigação de pressionar a
Fifa a liberar o uso de câmeras para
ajudá-los nesta tarefa tão importante. Eu, sentado em casa e comendo
pipoca, não posso ter mais recursos
do que quem comanda o espetáculo.
Mas nunca ouvi falar de um juiz
que reivindicasse a liberação do uso
de câmeras em público. E acho que
eles não querem usar a tecnologia,
em grande parte, por vaidade. Eles
querem ter o poder supremo.
E, ainda por cima, o não-uso das
câmeras possibilita a corrupção. Ao
contrário do que dizia Nelson Rodrigues, o videoteipe é genial.
torero@uol.com.br
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