São Paulo, sexta-feira, 15 de julho de 2011

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XICO SÁ

Dungar é...


No amor, todos os homens são discípulos do dunguismo. Jogam recuados e com medo

AMIGO TORCEDOR, amigo secador, pisa na bola quem pensa que Dunga foi apenas uma era, a Era Dunga. O dunguismo é mais que isso. É uma filosofia de jogo. E o pior: uma filosofia de vida. Talvez, meu caro cético de plantão, nem o próprio Dunga tenha a ver com isso.
O dunguismo é grego, não é brasileiro. Dungar é existir de fato e de direito, no princípio era o verbo. O dunguismo é a nossa defesa atávica com medo do mundo. É a nossa reação diante do desamparo logo que saltamos do útero e vemos o azulzão sem fim da existência.
Dunga não é apenas um anão da Branca de Neve. Dunga é Muricy pedindo calma ao Santos campeão da América e Mano Menezes, o verdadeiro Dunga, recorrendo a alguma segurança com a base do, adivinha, Dunga. Tite também é toda uma dungabilidade no líder Corinthians. Está para nascer o homem que não seja, pelo menos em um dos sete dias da semana, um pragmático Dunga.
Na ressaca, por exemplo, somos todos dunguistas, culpados, retrancados, existencialistas.
No amor, nem se fala, todos os homens são discípulos do dunguismo. Jogam recuados e com medo diante do pênalti e do infortúnio, como diria meu amigo Peter Handke.
Haja sombra. Qualquer coisa que ocorre com a seleção, recorre-se ao pântano dunguista, um anti-Telê de plantão nas nossas mentes quase nunca brilhantes.
Amigo, esqueça o Dunga, em nome do futuro, em nome dos ganhos e das perdas. Dungar nem sempre é ser covarde. Dungar é existir, taí, pronto.
Esqueça o Dunga, amigo, eu mesmo não esquecerei nunca, por favor me ajuda. Eis uma discussão de uma vida. Amar ou botar mais um beque contra o desejo reprimido?
O homem não fala de futebol. O homem, o da esquina ou o do nó tático da prancheta, só fala da vida e da sua covardia ou da sua aventura em terra, mar e ar. Nunca, amigo, falamos do jogo de 22 homens e um segredo. É só uma desculpa para fugir do trabalho e dos dias. O futebol é apenas um jeitinho pra gente aguentar o domingo ao lado de quem amamos ou não mais amamos mesmo.
O futebol é o airbag contra o mal-estar da civilização. E nele Dunga é apenas mais um acessório para quem tem mais medo do que os outros. Quem tem Dunga no imaginário tem medo.
Para dungar, basta estar vivo. O futebol não existe, só existe o homem falando dele. E pronto. É só uma fuga do real jogo da vida. Afoguemos o ganso simbólico e o resto é nada.

xico.folha@uol.com.br

@xicosa



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