São Paulo, terça-feira, 15 de agosto de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SONINHA

Continua incomodando

O Campeonato Brasileiro está muito interessante, mas o fiasco da seleção de Parreira na Copa-2006 ainda perturba

SE ATÉ hoje se discute se Barbosa e Bigode foram os grandes vilões, se a culpa foi do "excesso de favoritismo" e do oba-oba da véspera ou -menos freqüentemente- se o Uruguai era um bom time e o jogo seria equilibrado de qualquer jeito; se ainda discutimos 1982 (fatalidade ou incompetência; beleza x eficácia) e 1998 (complô, bobeira geral ou apenas uma ocorrência do futebol), imagine por quanto tempo ainda vamos falar sobre o fiasco brasileiro na Copa de 2006.
O tema continua em pauta, não só porque o Brasil joga nesta semana pela primeira vez desde a derrota para a França. Se Ronaldinho e Robinho fazem belas jogadas e gols em amistosos de seus clubes, a reação da maioria deve ser como a de Tadeu Schmidt, no "Bom Dia Brasil": "Não sei se fico feliz ou com raiva". Em todo lugar -um velório, um restaurante ou um saguão de teatro-, aparece alguém para perguntar: "Para vocês que estavam lá, o que foi que aconteceu? Salto alto, desinteresse, desunião?". Em entrevista ao "Globo" de domingo, Parreira comenta o lance emblemático do gol de Henry. Estavam contidos ou representados ali vários elementos que explicam nosso fracasso -a bendita meia caída do Roberto Carlos foi um símbolo e tanto do trabalho malfeito. Dias antes, nosso titular absoluto assistia ao jogo contra o Japão refestelado à beira do campo, como se não fosse uma partida oficial de Copa do Mundo, como se dissesse: "Isso aí não vale nada, e só por isso estou fora. Deixa que se divirtam um pouco". Um desdém e falta de respeito que deveriam ter sido tolhidos pela comissão técnica, que decidiu homenagear Rogério Ceni em substituição do tipo "só pra dizer que jogou", indicando que aquilo era café-com-leite mesmo. Na cobrança de falta de Zidane, o lateral ficou desatento. "Não era eu quem devia marcar o Henry." Caramba, isso o eximia da responsabilidade de ao menos ver o jogo como espectador privilegiado, que poderia interferir se quisesse? Ele preferiu dizer "não era problema meu", como se evitar o gol não fosse problema do time todo. Imagine se um atacante não tira a bola em cima da linha do seu gol: "Não sou zagueiro...". Comentários posteriores revelam o quanto esse lance foi a culminância de uma preparação muito malfeita; o quanto o tempo de treinamento simplesmente não serviu para preparar o time para situações de jogo. Os jogadores deram versões diferentes sobre quem devia estar na área -o fato é que só havia três brasileiros para cinco franceses, um erro primário. Parreira diz que "Cafu ou Kaká" deveria marcar Henry. Como diz o PVC (comentarista da ESPN), esse "ou" é mau sinal... Tinha de ter alguém claramente designado para marcar o Henry! E, se nenhum dos dois estava ali, se Roberto Carlos pensou que não precisava se preocupar, se ninguém mais atentou para o fato de que o principal atacante da França estava sozinho num lance de bola parada, em que dá tempo de todo mundo se ajeitar!, não se pode falar só em "erro individual" mas em colapso coletivo, pelo qual o técnico tem de responder.
Também Parreira atribui ao favoritismo parte da culpa pela derrota. Então, ele falhou no que dizia ser sua principal tarefa: administrar talentos. Após a estréia complicada, qualquer excesso de confiança deveria ter sido varrido, mas o técnico insistia que estava tudo bem, que era só questão de tempo. Talvez fosse ele o confiante em excesso, a ponto de insistir até o fim em jogadores e esquemas que não funcionavam... Ou de apostar em formação inédita em jogo de vida ou morte, como o último. A decepção de 2006 continuará palpitando por muito tempo... Embora costumemos dizer que ninguém liga para a seleção, só para seu próprio time.

soninha.folha@uol.com.br


Texto Anterior: Vôlei 2: GP testa fôlego e novidades de 12 seleções femininas
Próximo Texto: Final põe foco sobre duplas decisivas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.