|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FUTEBOL
Campeão até o fim
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
O Cruzeiro fecha o ano com
uma goleada histórica, para
não deixar dúvidas quanto a
qual é o melhor time do país.
Campeão com cem pontos, 102
gols, o melhor ataque e uma das
defesas menos vazadas do torneio. Será que ainda vai ter gente
dizendo que houve armação para
o Cruzeiro ficar com o título?
Ao meter sete gols no Bahia, o
clube mineiro mostrou respeito
pelos torcedores, pelo próprio futebol e até mesmo pelo adversário. Se tivesse amolecido o jogo,
ofenderia a todos e a si próprio.
Por isso foi bonito ver os cruzeirenses buscarem (e acharem) o
gol mesmo depois que a partida já
estava definida. Foi bonito também testemunhar o esforço de seu
goleiro e de seus zagueiros para
evitar os gols que eram tão importantes para o Bahia e que teoricamente não tinham importância
nenhuma para eles próprios.
Um grande campeão não pode
ficar restrito ao pragmatismo.
Tem de ter a volúpia da vitória
em qualquer situação. Tem de ser
campeão o tempo todo, até o fim.
Zico costuma lembrar que, no
grande time do Flamengo do início dos anos 80, ele e vários de
seus companheiros (Júnior, Andrade, Adílio) ficavam em campo
depois de terminados os treinos,
aperfeiçoando jogadas. Mais que
isso: davam vazão ao seu inesgotável prazer de jogar futebol.
Lembrei-me disso ontem quando Alex, após ter feito cinco gols,
ainda queria mais (e quase conseguiu). Era como se quisesse tapar
a boca de todos aqueles que durante anos o rotularam de dorminhoco, de ausente, de dispersivo.
A goleada na Fonte Nova foi
um fecho perfeito para o Brasileirão, por sua simetria: o campeão
contra o lanterna, o melhor ataque contra a defesa mais vazada.
Mas a forma como isso aconteceu foi inusitada. Não me lembro
de ter visto outro jogo em que um
time marcou quatro gols de pênalti só no primeiro tempo.
Essa circunstância permitiu a
Alex ministrar um minicurso sobre como cobrar pênaltis.
Foi impossível não lembrar do
livro de Peter Handke (e do filme
de Wim Wenders) "O Medo do
Goleiro diante do Pênalti", em
que o protagonista, um ex-goleiro, filosofa sobre o duelo psicológico entre o batedor e sua vítima.
Alex bateu o primeiro rasteiro,
no canto esquerdo. O goleiro
Emerson acertou o canto, mas
não alcançou a bola.
Para a cobrança do segundo,
Emerson deve ter imaginado que
o batedor inverteria o canto. Mas
Alex bateu de novo no esquerdo,
desta vez pelo alto. Antes do terceiro, Emerson deve ter pensado:
"Ele bate sempre na esquerda". E
caiu lá. Só que Alex chutou no direito.
No quarto, com o goleiro já devidamente atordoado, Alex bateu
de novo rasteiro no canto esquerdo, como se fosse iniciar uma nova série.
O primeiro Brasileiro por pontos corridos cumpriu afinal seus
desígnios: consagrou o time mais
competente e o jogador mais brilhante.
Espera-se agora que outros clubes encarem o torneio a sério e sejam páreo em 2004.
Na última hora
Parabéns ao Grêmio e à Ponte
Preta, que escaparam do abismo com suas próprias pernas.
Parabéns também ao São Caetano e ao Coritiba, que voltaram à Taça Libertadores, e ao
Figueirense, que terá na Copa
Sul-Americana do ano que vem
sua primeira participação em
um torneio internacional.
Vitória "encardida"
O Boca Juniors, novo campeão
mundial interclubes, é o que na
gíria varzeana chamaríamos de
time "encardido", ou seja,
aquele cujos marcadores grudam como carrapatos e cujos
atacantes surgem do nada para
botar a bola lá dentro. Mesmo
assim, o Milan quase conseguiu
a vitória. Só não entendi por
que o treinador milanês tirou
Kaká, que era seu jogador mais
móvel e perigoso.
E-mail jgcouto@uol.com.br
Texto Anterior: Perfil: Henry, surpresa, foi revelado por um brasileiro Próximo Texto: Futebol: Boca surpreende Milan até nos pênaltis Índice
|