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São Paulo, segunda-feira, 15 de dezembro de 2003

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FUTEBOL

Campeão até o fim

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

O Cruzeiro fecha o ano com uma goleada histórica, para não deixar dúvidas quanto a qual é o melhor time do país.
Campeão com cem pontos, 102 gols, o melhor ataque e uma das defesas menos vazadas do torneio. Será que ainda vai ter gente dizendo que houve armação para o Cruzeiro ficar com o título?
Ao meter sete gols no Bahia, o clube mineiro mostrou respeito pelos torcedores, pelo próprio futebol e até mesmo pelo adversário. Se tivesse amolecido o jogo, ofenderia a todos e a si próprio.
Por isso foi bonito ver os cruzeirenses buscarem (e acharem) o gol mesmo depois que a partida já estava definida. Foi bonito também testemunhar o esforço de seu goleiro e de seus zagueiros para evitar os gols que eram tão importantes para o Bahia e que teoricamente não tinham importância nenhuma para eles próprios.
Um grande campeão não pode ficar restrito ao pragmatismo. Tem de ter a volúpia da vitória em qualquer situação. Tem de ser campeão o tempo todo, até o fim.
Zico costuma lembrar que, no grande time do Flamengo do início dos anos 80, ele e vários de seus companheiros (Júnior, Andrade, Adílio) ficavam em campo depois de terminados os treinos, aperfeiçoando jogadas. Mais que isso: davam vazão ao seu inesgotável prazer de jogar futebol.
Lembrei-me disso ontem quando Alex, após ter feito cinco gols, ainda queria mais (e quase conseguiu). Era como se quisesse tapar a boca de todos aqueles que durante anos o rotularam de dorminhoco, de ausente, de dispersivo.
A goleada na Fonte Nova foi um fecho perfeito para o Brasileirão, por sua simetria: o campeão contra o lanterna, o melhor ataque contra a defesa mais vazada.
Mas a forma como isso aconteceu foi inusitada. Não me lembro de ter visto outro jogo em que um time marcou quatro gols de pênalti só no primeiro tempo.
Essa circunstância permitiu a Alex ministrar um minicurso sobre como cobrar pênaltis.
Foi impossível não lembrar do livro de Peter Handke (e do filme de Wim Wenders) "O Medo do Goleiro diante do Pênalti", em que o protagonista, um ex-goleiro, filosofa sobre o duelo psicológico entre o batedor e sua vítima.
Alex bateu o primeiro rasteiro, no canto esquerdo. O goleiro Emerson acertou o canto, mas não alcançou a bola.
Para a cobrança do segundo, Emerson deve ter imaginado que o batedor inverteria o canto. Mas Alex bateu de novo no esquerdo, desta vez pelo alto. Antes do terceiro, Emerson deve ter pensado: "Ele bate sempre na esquerda". E caiu lá. Só que Alex chutou no direito.
No quarto, com o goleiro já devidamente atordoado, Alex bateu de novo rasteiro no canto esquerdo, como se fosse iniciar uma nova série.
O primeiro Brasileiro por pontos corridos cumpriu afinal seus desígnios: consagrou o time mais competente e o jogador mais brilhante.
Espera-se agora que outros clubes encarem o torneio a sério e sejam páreo em 2004.

Na última hora
Parabéns ao Grêmio e à Ponte Preta, que escaparam do abismo com suas próprias pernas. Parabéns também ao São Caetano e ao Coritiba, que voltaram à Taça Libertadores, e ao Figueirense, que terá na Copa Sul-Americana do ano que vem sua primeira participação em um torneio internacional.

Vitória "encardida"
O Boca Juniors, novo campeão mundial interclubes, é o que na gíria varzeana chamaríamos de time "encardido", ou seja, aquele cujos marcadores grudam como carrapatos e cujos atacantes surgem do nada para botar a bola lá dentro. Mesmo assim, o Milan quase conseguiu a vitória. Só não entendi por que o treinador milanês tirou Kaká, que era seu jogador mais móvel e perigoso.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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