São Paulo, segunda-feira, 16 de fevereiro de 2004

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FUTEBOL

Mais abastado, público das cadeiras festeja kit árabe vendido no estádio, tido como muito caro nas arquibancadas

"Esfirra chique" racha torcida no Morumbi

MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL

José da Silva Viana chegou ao Morumbi às 10h. Durante duas horas e meia juntou esfirras, quibes e pastéis de Belém em pequenas caixas de papelão que venderia durante o clássico da tarde.
Os R$ 20 que entram em seu bolso após cada jogo ajudam a engrossar o orçamento de casa.
Mas, após quase quatro horas de vaivéns pelas arquibancadas, havia conseguido convencer pouca gente de que valia a pena comprar seus lanches.
"Para quem tem dinheiro para ficar na numerada, é fácil pagar R$ 5 para comer. Para mim, é caro. Preferia poder comprar só uma esfirra", resmungou Luiz Augusto Tavares, 23, sentado na arquibancada corintiana. Ele foi um dos que viram Viana passar e não esboçaram reação.
O vendedor carregava os kits do Habib's, rede de comida árabe patrocinadora do São Paulo. Os três itens custam R$ 3,50 e não são vendidos separadamente. O refrigerante sai por R$ 1,50, e a água é vendida a R$ 1.
Sinônimo de refeição barata, a esfirra é bem mais barata fora do estádio. Se decidir ir a uma das 211 lojas da rede, o consumidor irá desembolsar, em média, R$ 2,36 para comer os mesmos produtos. No Morumbi, paga 48% a mais.
"O movimento está muito devagar. Na cativa e na numerada é melhor. Pai de família compra mais. Mas é mais fácil vender água mineral", disse Viana após mais uma incursão frustrada entre os torcedores do Corinthians.
A opinião do vendedor é semelhante à de outros 10 ouvidos ontem pela Folha no jogo de maior público do Campeonato Paulista até agora. No total, o Habib's mantém 104 funcionários rodando pelos corredores do estádio.
Além dos ambulantes, a rede tem exclusividade na venda de alimentos em pontos fixos no Morumbi. São cinco, apenas dois deles nas arquibancadas.
O kit começou a ser vendido somente no setor premium", área nobre das cadeiras azuis. Atrás das divisórias que separam os torcedores vip do resto das numeradas ainda há duas lanchonetes.
Para quem não tem a mordomia do setor "premium", nem quer deixar seu lugar com a bola em jogo, a saída é encarar o pequeno tumulto que se forma nas lanchonetes durante o intervalo.
Com a concentração de compradores em um mesmo horário, o atendimento fica confuso.
"Se você compra antes do jogo, fica bem mais fácil. Antes eu só comia salgadinho, agora tem outra opção", comemorou Rafaela Ramos Santos, de 16 anos.
A são-paulina comprou ontem um dos 2.300 kits vendidos no Morumbi. O Habib's ainda comercializou 8.000 copos d'água e 3.000 de refrigerantes.
A chegada da rede, apesar de seduzir apenas a camada mais abastada dos torcedores, fez cair o lucro de outros ambulantes. Para quem atravessa o estádio com salgadinhos, amendoins e chocolates, a concorrência assusta.
"Antes, eu vendia 40, 50 produtos. Hoje, não saem nem 20", reclamou Carlos Roberto da Silva, 42, com o tabuleiro cheio. Desde 1976 ele trabalha no estádio.
"Já tirei R$ 400 por jogo. Agora, não tiro R$ 200. Está difícil fazer dinheiro. Com a concorrência e o ingresso caro, saímos perdendo", fez coro Magnaldo Pocino, 33.
Satisfeitos mesmo ficaram pais que costumam levar os filhos ao Morumbi. "A gente consegue evitar que eles comam tanta porcaria", contou o corintiano José Lopes, 44, pai de Lucas, 6, que comemorava discretamente o gol de Fabão, e do corintiano Thiago, 10.
A mulher de Lopes, Sofia, de 40 anos, foi ao estádio "só para a acompanhar", mas continuava a criticar a comida do Morumbi. "Eu vivo de dieta. Com quibe e esfirra, engordo só de olhar."



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